Entidades reivindicam proteção aos conteúdos jornalísticos e culturais no PL das Fake News
Proposta prevê uma série de regras para combater e punir a disseminação de informações falsas na internet
Prestes a ser votado na Câmara Federal, o Projeto de Lei 2.630, popularmente conhecido como PL das Fake News, prevê uma série de regras para combater e punir a disseminação de informações falsas na internet. Nesse contexto, uma carta assinada por 17 entidades foi entregue ao presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), pedindo a manutenção de alguns trechos do PL, reforçando a necessidade de proteção tanto dos materiais jornalísticos como dos culturais e criativos no ambiente digital.
O artigo defendido protege o jornalismo profissional, obrigando as big techs que controlam buscadores da internet e mídias sociais a identificar corretamente e pagar pela informação confiável gerada pelos meios tradicionais. No artigo 32 do capítulo VI do PL diz: “Os conteúdos jornalísticos utilizados pelos provedores produzidos em quaisquer formatos, que inclua texto, vídeo, áudio ou imagem, ensejarão remuneração às empresas jornalísticas, na forma de regulamentação, que disporá sobre os critérios, forma para aferição dos valores, negociação, resolução de conflitos, transparência e a valorização do jornalismo profissional nacional, regional, local e independente”.
Por sugestão do Ministério da Cultura, a comitiva de artistas composta por Marisa Monte e Glória Pires reivindicou na última terça-feira (25) que as mesmas empresas sejam obrigadas a remunerar todos os conteúdos criativos usados nas redes, incluindo músicas e produtos audiovisuais.
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O que dizem os parlamentares
Da bancada paraense, a maioria dos deputados tem se manifestado a favor da aprovação do PL das Fake News. À Redação Integrada de O Liberal, Renilce Nicodemos (MDB) conta que além de defender a matéria, deve, inclusive, apoiar a discussão das propostas feitas pelas entidades na Câmara.
“Acredito que a nova legislação permitirá a plena liberdade de expressão e estou acompanhando as discussões para que sejam realizadas as mudanças necessárias para adequar o texto final do PL. Precisamos parar com as fake news, pois isso é um retrocesso para o nosso País. Também vamos continuar lutando pela liberdade de expressão e não pela censura”, declara Nicodemos.
Airton Faleiro (PT), destaca que o Projeto de Lei não é contra a liberdade de expressão, mas sim, “vai proteger essa liberdade”. “O PL 2730 visa apenas o combate da desinformação e o ódio nos ambientes digitais, garantindo mais segurança e transparência para quem usa redes sociais, obrigando as plataformas a prestarem contas de como moderam os conteúdos dos usuários e não poderão mais excluir posts ou perfis sem apresentar o motivo da exclusão para quem foi penalizado”, justifica o deputado.
“O foco são as grandes plataformas. Portanto, as regras valerão, exclusivamente, para plataformas com mais de 10 milhões de usuários, as consideradas big techs. Empresas pequenas e startups de tecnologia não serão afetadas, para que se garanta o direito à concorrência”, completa Faleiro.
Também defensora do PL, Dilvanda Faro (PT) argumenta que a proposta será um importante instrumento para acabar com o discurso de ódio e disseminação de notícias falsas.
“A internet não é terra sem lei e quem comete crimes no ambiente virtual deve ser punido no rigor da lei. Recentemente, vimos casos de extrema violência que atingem diretamente as nossas crianças e adolescentes, por conta de postagens que estimulam ataques às escolas e suicídio. Esse conteúdo nunca deveria ser tolerado e, através da lei, as plataformas serão responsabilizadas caso conteúdos deste tipo continuem circulando. Com a aprovação, sem dúvida, quem ganha é o cidadão brasileiro”, considera a parlamentar.
Entenda o PL das Fake News
O Projeto de Lei 2630/20 institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, criando medidas de combate à disseminação de conteúdo falso nas redes sociais, como Facebook e Twitter, e nos serviços de mensagens privadas, como WhatsApp e Telegram, excluindo-se serviços de uso corporativo e e-mail.
As medidas, se aprovadas, valerão para as plataformas com mais de 2 milhões de usuários, inclusive estrangeiras que oferecem serviços ao público brasileiro. A proposta é de autoria do senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e após ser aprovada no Senado, chegou à Câmara dos Deputados em meio a polêmicas.
Enquanto alguns parlamentares e setores da sociedade acreditam serem necessárias medidas para combater o financiamento de notícias falsas, especialmente em contexto eleitoral, outros acreditam que as medidas podem levar à censura.
Entre diversos pontos previstos pelo PL, os provedores de redes sociais e de serviços de mensagens deverão proibir contas falsas criadas ou usadas “com o propósito de assumir ou simular identidade de terceiros para enganar o público”, exceto em caso de conteúdo humorístico ou paródia. Neste caso, serão permitidas as contas com nome social ou pseudônimo.
Além disso, os usuários deverão ser notificados em caso de denúncia ou de aplicação de medida por conta da lei. Entretanto, eles não precisarão ser notificados em casos de dano imediato de difícil reparação; para segurança da informação ou do usuário; de violação a direitos de crianças e de adolescentes; de crimes previstos na Lei do Racismo; ou de grave comprometimento da usabilidade, integralidade ou estabilidade da aplicação.
O texto prevê que o usuário poderá recorrer da decisão de remoção do conteúdo e de contas. Será também assegurado ao ofendido o direito de resposta na mesma medida e alcance do conteúdo considerado inadequado.
No Pará, o Sindicato dos Jornalistas (Sinjor-PA) enviou outra carta aos deputados federais defendendo o PL das Fake News, solicitando a adição de mais um artigo, garantindo que jornalistas também sejam beneficiados pela remuneração prevista pelos conteúdos compartilhados nas redes.
“Somos favoráveis ao PL, porém, ao nosso entender, assim como foi proposta uma emenda adicionando os artistas como beneficiados pela remuneração das big techs, seria ideal que os jornalistas, além das empresas tradicionais, também sejam remunerados pelos conteúdos compartilhados. Acreditamos que se os parlamentares foram sensíveis à causa dos artistas, eles também podem se sensibilizar com este pedido, a fim de garantir incentivo àqueles que vão atrás da notícia, apuram, escrevem e publicam as reportagens", explica o presidente do Sinjor do Pará, Vito Gemaque.
Defesa do jornalismo
Mestre em Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia para Inovação, o advogado Paulo de Tarso explica que o texto do PL visa trazer diversos benefícios para a sociedade e para a manutenção da qualidade da informação disponível nas plataformas digitais:
“A identificação correta e o pagamento pelos conteúdos jornalísticos confiáveis gerados pelos meios tradicionais podem incentivar a produção de mais conteúdo de qualidade, aumentando a diversidade e a riqueza das informações disponíveis para os usuários das plataformas digitais. O dispositivo legal surge com a ideia de poder ajudar a combater a disseminação de notícias falsas e de desinformação, já que os usuários terão acesso a informações profissionais e de fontes reconhecidas. Por outro lado, o pagamento pelas informações geradas pelos meios tradicionais pode ajudar a manter a sustentabilidade desses meios, que têm enfrentado dificuldades financeiras em um cenário de migração crescente para as plataformas digitais".
O advogado reitera que há também a previsão de que esta remuneração não deve onerar o usuário final. “No caso, ainda em análise, farão jus à remuneração pessoa jurídica, mesmo individual, constituída há pelo menos 24 meses, que produza conteúdo jornalístico original de forma regular, organizada, profissionalmente e que mantenha endereço físico e editor responsável no Brasil, sendo livre a pactuação entre provedor de aplicação e empresa jornalística, garantida a negociação coletiva pelas pessoas jurídicas, inclusive as que integrarem um mesmo grupo econômico, junto aos provedores quanto aos valores a serem praticados, o modelo e prazo da remuneração, observada a regulamentação”, completa Paulo de Tarso.
Direitos autorais
Para o advogado, aprovação do PL é necessária porque para proteger as criações intelectuais jornalísticas e culturais e combater as notícias falsas, é importante construir mecanismos que garantam aos criadores e aos titulares de direitos autorais o direito exclusivo de utilizar, explorar, comercializar e autorizar o uso de suas obras, bem como de receber remuneração pela utilização dessas criações, incentivando assim a produção cultural e artística, inclusive nas redes sociais.
“Dito isso, quando há disseminação de notícia falsa, materializa-se um claro desvirtuamento do intuito original daquele conteúdo criado, uma vez que o autor além de não autorizar sua divulgação, não permite aquela alteração que muda o seu sentido. Geralmente, uma notícia falsa utiliza sutilezas que misturam fatos verdadeiros com os irreais. Por exemplo, uma matéria com determinado conteúdo pode vir ilustrada com uma imagem que não tem conexão com o texto. De pronto, a imagem não autorizada também representa uma violação de direito autoral, pois foge da percepção original de seu autor. As fakes news causam prejuízos econômicos aos titulares dos direitos autorais quando se apropriam de conteúdos protegidos que geram receitas para seus criadores, como no caso de jornalistas que são constantemente vítimas”, finaliza o advogado.
Sobre isso, o cantor e compositor paraense Pedrinho Cavalléro torce para que a aprovação do PL seja com os trechos que garantam o beneficiamento pela autoria de obras dos artistas. “É de fundamental importância salvaguardar os direitos autorais de artistas e jornalistas. Nós que vivemos da arte somos muito desvalorizados, então espero que tenhamos uma legislação rígida em relação à proteção dos conteúdos, valorizando quem os cria e produz”, opina.
Também de acordo com a proposta, Renato Torres, músico e poeta de Belém, comemora o avanço das discussões na Câmara. “O setor musical é extremamente afetado pela falta de transparência das plataformas. Ainda há muito o que avançar na legislação de direito autoral, no que concerne à remuneração das plataformas digitais que remuneram de maneira muito pífia os compositores, não temos acesso às fichas técnicas, por exemplo. Porém, esse Projeto de Lei já dá bons passos para melhorar essa transparência”, comenta o artista.
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