Dallagnol afirma que é vítima de 'inelegibilidade imaginária'; veja a entrevista na íntegra

Ele é o primeiro parlamentar a perder o mandato na atual legislatura

O Liberal
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À unanimidade, o Tribunal Superior Eleitoral cassou o mandato do deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR), naterça-feira (16). O ex-procurador que coordenou a força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba, foi o primeiro parlamentar a perder o mandato na atual legislatura.

Confira abaixo, na íntegra, a entrevista que ele deu nesta quarta-feira (17):

O que aconteceu ontem no Tribunal Superior Eleitoral é muito simples. Inventaram uma inelegibilidade imaginária para me cassar. Hoje, o sistema de corrupção, os corruptos e os seus amigos estão em festa. Gilmar Mendes está em festa. Ecio Neves está em festa. Eduardo Cunha está em festa. Beto Richa está em festa. A verdade é uma só. Eu perdi o meu mandato porque eu combati a corrupção. E hoje é um dia de festa para os corruptos e é um dia de festa para a Lula.

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A Lava Jato, em algum momento, despertou uma nova esperança em todos nós. A esperança de que tudo podia ser diferente. E a esperança de que todos os parlamentares que vocês estão vendo unidos por uma causa, a causa da justiça e a causa da liberdade. Agora, o que nós vimos com o passar do tempo foi um sistema se recolocando, se reconstruindo e se vingando. Se vingando primeiro com a anulação das condenações, com a formação da nova figura dos descondenados como Lula.

Em seguida, nós vimos um sistema retaliando contra quem cumpriu a lei, contra os agentes da lei, contra quem ousou combater a corrupção no Brasil. Eu fui cassado por vingança. Eu fui cassado porque eu ousei o que é mais difícil no Brasil: enfrentar um sistema de corrupção, os corruptos mais poderosos do país, porque eu ousei me unir a tantos brasileiros que quiseram se erguer contra um sistema de corrupção em relação ao qual todos estão cansados e quiseram virar a página.

O Presidente da República e o seu Partido dos Trabalhadores pediram a minha cassação. E eles conseguiram que 7 ministros superassem todos os pareceres e decisões unânimes anteriores e me cassaram, liderados por um ministro que já disse ao ministro Alexandre de Moraes na cerimônia de diplomação do Lula "missão dada é missão cumprida". Liderados por um ministro que certa vez disse "está tudo em casa".

Eles me cassaram por uma inelegibilidade imaginária. A Constituição e a Lei da Ficha Limpa é clara. Ficam inelegíveis membros do Ministério Público que saem na pendência de processo administrativo disciplinar. É clara, é objetiva. Existia algum processo administrativo disciplinar? Não! Nenhum! Zero! Mas eles construíram suposições. Uma primeira suposição de que reclamações poderiam se converter em algum procedimento disciplinar. Uma segunda suposição de que algum poderia gerar condenação. Uma terceira suposição de que alguma condenação poderia ser a demissão. E uma quarta suposição de que eu sabia tudo isso, como num "Minority Report" em que você sabe o futuro. Agora de modo muito contraditório, porque se eu soubesse o futuro eu poderia antecipar esse dia e essa decisão esdrúxula contra o direito em que eles aplicam o direito da força e não a força do direito.

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Me punir nesse caso é como punir alguém por um crime futuro, ou pior, é punir alguém por uma acusação que não existe. É punir alguém por uma condenação que ainda não existe. Em relação a mim, eles inverteram a presunção de inocência, que beneficia tantos corruptos com recursos infinitos, mas para quem combate a corrupção o que vale é a presunção de culpa. Eles inverteram a presunção de inocência e transformaram em presunção de culpa, ao arrepio da lei.

O Tribunal Superior Eleitoral disse que eu fraudei a lei, mas foi o Tribunal Superior Eleitoral que fraudou a lei e fraudou a Constituição ao criar uma nova inelegibilidade contra a lei e contra o que diz a Constituição, que em decisões unânimes, o próprio TSE que na doutrina unânime, toneladas de textos escritos dizendo que restrições a direitos fundamentais, que restrições a direitos políticos jamais podem ser elastecidos, jamais podem ser interpretados de modo extensivo, de modo ampliativo, com analogia, e foi exatamente o que eles fizeram, fraudando a lei, fraudando a Constituição para me punir. Eu perdi o mandato para evitar um suposto processo disciplinar que nunca existiu.

Hoje, o sistema de corrupção implementa a sua vingança e tem muitos poderosos unidos nesse esforço. Grandes políticos, inclusive parlamentares. Um presidente da República condenado por corrupção e descondenado numa decisão política do Supremo Tribunal Federal.

Nós vemos ainda unidos certos ministros do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral que sempre se opuseram a Lava Jato, especialmente quando ela atingiu os seus políticos corruptos de estimação.

E como diz a Bíblia: "até quando os maus continuarão alegres? Até quando se mostrarão orgulhosos e se gabarão dos seus crimes? Até quando os maus continuarão alegres? Até quando se mostrarão orgulhosos e se gabando dos seus crimes no nosso país?". Hoje, Aécio Neves tem mandato. Hoje, Beto Richa tem mandato. Hoje, Lula tem mandato. Agora quem combateu a sua corrupção perde o mandato.

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Nós vivemos no país da inversão dos valores, em que o policial é punido por punir corretamente o ladrão, em que o policial é perseguido pelo ladrão. Nós hoje lutamos por liberdade. A liberdade de ousar buscar uma transformação no nosso país. E é isso que as eleições proporcionam. Cassar um mandato, cassar milhares de votos é mexer com o que existe de mais sagrado no sistema democrático, no sistema eleitoral, que é o poder do voto, que é a soberania popular. E hoje, eles anularam a soberania popular. Eles anularam o poder do voto, com base, mais uma vez, em uma inelegibilidade imaginária, fraudando a Constituição e fraudando a lei.

O sistema permite que o povo, o sistema permite que vocês esqueçam muitas vezes a verdade básica: todo poder emana do povo. E existem os donos do poder que muitas vezes querem se sobrepor à lei, se sobrepor ao povo, se sobrepor à Constituição, se fazendo soberanos, se colocando no lugar do povo. E nós jamais podemos admitir isso, porque esse é o germem que aí, sim, sim corrói a democracia no nosso país.

Há quem tenha sido cassado por ter questionado as urnas e hoje o Tribunal Superior Eleitoral anula todas as urnas do Estado do Paraná. Isso frauda e mina a nossa democracia. Se eles podem anular a voz de tantos, o que é que vai impedir eles? Qual é a dificuldade que haverá de anular a sua voz? De anular a voz dos brasileiros? De anular a voz dos parlamentares que são aqui? Porque eu tive privilégio de lutar ao longo desses meses de mandato com honra, com orgulho, para fiscalizar um poder executivo e os seus desmandos.

As eleições são a porta da transformação numa democracia. Se se fecharem essas portas, não existe democracia. E é assim que as ditaduras começam, como começaram na Venezuela, como começaram na Nicarágua, quando tribunais de justiça cassaram o mandato de opositores políticos e é esse o risco que nós vivemos hoje no Brasil.

Iinstituições precisam ser respeitadas. Agora, instituições são compostas de pessoas. É o nosso problema no Brasil é que as instituições são boas, mas existem muitas pessoas ruins. E se cercear de criticar as pessoas para não manchar as instituições é contraditório. É uma incoerência. Porque deixar de criticar as pessoas que elas mesmas corroem as instituições é enfraquecê las, porque são elas que corroem as instituições. Nós precisamos ter a coragem. Nós precisamos ter a liberdade de criticar os desmandos e as arbitrariedades dos poderosos. E se hoje eles cometem arbitrariedades comigo, com um mandato eletivo, quanto mais podem fazer com toda a sociedade brasileira, quanto mais no dia seguinte vão fazer com cada um dos adversários políticos do governo de ocasião.

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Desde que eu entrei no Congresso, muitas pessoas me perguntaram se eu estava gostando de estar aqui. E a minha resposta sempre foi a mesma. Eu não me pergunto se eu estou gostando. Eu me pergunto se eu estou mais próximo do meu propósito. Um soldado no campo de batalha, ele não pergunta se o seu travesseiro está macio. Eu não estou aqui por um cargo. Eu estou aqui por um propósito. Estou aqui por uma transformação.

Todo tombo dói, mas eu não vou desistir, como muitos cristãos ao longo da história. Quando parecia que eles tinham tomado um tombo e que era o fim, na verdade, aquilo era um novo começo e hoje é um novo começo para a minha voz. Com esse tombo, eu convido que todos que lutam contra a quebra da liberdade, contra a quebra da democracia, contra os abusos dos poderosos que se reergueram desse tombo comigo, unindo a sua voz, unindo a voz de uma oposição que hoje.

Hoje eu vi que eu atingi o meu objetivo quando um assessor do meu gabinete chegou perto de mim e disse “Deltan, eu posso perder o cargo de assessor. Eu posso perder a remuneração, mas eu não vou deixar de trabalhar com você, ainda que seja de graça. Porque o que eu vi aqui ao longo desse tempo todo é que você luta por um propósito, porque você luta genuinamente por uma transformação”. E é por isso que eu convido todos a lutarem por uma transformação que vai além de nós, por um propósito que nos transcende.

Eu jamais vou me arrepender de ter combatido a corrupção no Brasil. Jamais. Aqui no Congresso eu combati o bom combate com orgulho, com honra. Ao lado desses parlamentares que vocês veem aqui na frente. E nós vamos seguir lutando. O cargo é apenas um instrumento para lutar por transformação. Agora, o principal é a voz dos brasileiros que estão conosco. Nós precisamos que os brasileiros ergam a sua voz, que eles reconheça o seu poder que está nas suas mãos, que é o poder, que é a chave para transformação. E nós não vamos permitir que as portas dos votos, que as portas das eleições sejam fechadas. Nós não vamos permitir que minem que atacam a nossa democracia. Nós não vamos permitir que mini ataque às nossas liberdades. Nós não vamos permitir que esse governo siga praticando desmandos e praticando corrupção.

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O poder que os tribunais têm de me atingir, o poder que os tribunais têm de me derrubar, é o mesmo poder que tinham os irmãos de José quando venderam o escravo para o Egito. É o mesmo poder que tinha o rei da Babilônia quando colocou Daniel na cova dos leões. O poder que eles têm ao me cassar é o mesmo poder que Pilatos tinha ao mandar Jesus pra morte. Essa história não acabou. Esse capítulo não é o capítulo final. Com o tombo vem o reerguimento e o reerguimento com vocês, com a sociedade e com esse conjunto de parlamentares que luta unido. Senadores que honram com seu cargo, deputados que lutam unidos por justiça e que lutam unidos por liberdade.

Martin Luther King disse que o que mais o preocupava não era o grito dos maus, não era a crueldade dos cruéis, mas era o silêncio dos bons. E hoje eu vejo aqui parlamentares que não vão ficar silentes. Hoje eu não vejo silêncio aqui. Nós vamos lutar por justiça e por liberdade.

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