Temas polêmicos entrarão em julgamento no STF

A discussão sobre descriminalização do porte de drogras para uso pessoal e o marco temporal deve movimentar os debates no Judiciário

Fabrício Queiroz
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O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma as atividades no segundo semestre a partir da próxima terça-feira (1º) com uma pauta com uma série de julgamentos importantes, como o debate sobre o marco temporal e a descriminalização da posse de drogras. Além disso, ocorrerá a posse do novo ministro da Corte, Cristiano Zanin, que já passou por sabatina no Senado Federal e já foi nomeado em ato do Diário Oficial da União (DOU). A posse de Zanin está marcada para quinta-feira (3).

Serão três ações apreciadas logo no primeiro dia de trabalhos após o recesso do Judiciário. Uma delas é a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 779, que trata da inconstitucionalidade da tese de legítima defesa da honra em casos de feminicídio. Até então, o relator da ação, o ministro Dias Toffoli, e outros cinco ministros votaram pelo entendimento de que a tese contraria os princípios da dignidade da pessoa humana, da proteção à vida e da igualdade de gênero.

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Na mesma sessão deve ser apreciada ainda o Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1225185 que pôs em discussão se um tribunal de segunda instância pode determinar a realização de novo júri em casos de absolvição do réu em suposta contrariedade à prova dos autos; e a Ação Penal (AP) 969, que julgará os supostos crimes de peculato e desvio de recursos públicos que teriam sido cometidos pelo ex-deputado federal André Luiz Dantas Ferreira.

Já no dia 2 de agosto, o STF retomará o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 635659. O processo questiona a validade do artigo 28 da Lei Antidrogas, que, caso seja declarado inconstitucional, permitiria o porte de drogas para uso pessoal. O relator é o ministro Gilmar Mendes, que deu voto favorável ao entendimento de que a lei viola o princípio do direito à intimidade e à vida privada do indivíduo.

Na avaliação de Luanna Tomaz, doutora em Direito, Justiça e Cidadania no Séc. XXI e coordenadora do Grupo de Estudos em Direito Penal e Democracia da UFPA, o parecer da Corte sobre o tema ajudaria o sistema de justiça a dar atenção diferenciada aos crimes, sobretudo quando se considera que grande parte dos detidos estaria em posse de pequenas quantidades de narcóticos.

“Tem estudos que mostram que 70% das pessoas presas por tráfico de drogas são presas com até 100 gramas, o que em muitos países nem é considerado tráfico. Alguns países adotam quantidades como 50 gramas ou 100 gramas. No Brasil, há uma grande arbitrariedade sobre o que é porte e o que é tráfico, o que faz com que muitas vezes a distinção ocorra por critérios de cor de pele. Se for negro, é traficante; se for branco, é usuário”, afirma a docente, que considera que a mudança na jurisprudencia teria impacto positivo também para as áreas da segurança e da saúde públicas.

“Já tivemos três ministros votando favoravelmente a algum tipo de descriminalização, o que a meu ver é muito positivo e mostra o Brasil seguindo uma tendência internacional pela descriminalização do porte. Países como os Estados Unidos, Portugal e Uruguai e inúmeros outros já adotaram medidas de descriminalização, reconhecendo que a lógica proibicionista combinada com a chamada guerra às drogas tem sido um grave problema para os países democráticos”, complementa Luanna Tomaz.

Validade do marco temporal para demarcação de terras indígenas

Além dessas ações, outras oito ações estão na pauta do Supremo nas primeiras duas semanas de agosto. Já nos próximos meses também é esperado que a Corte retome o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1017365, que envolve a discussão sobre a validade do marco temporal para demarcação de terras indígenas. A matéria está parada em virtude do pedido de vistas do ministro André Mendonça, que tem até 90 dias para analisar o tema. Porém, a expectativa é que o recurso entre em pauta antes, visto que o ministro afirmou que devolveria o processo em tempo hábil para que Rosa Weber emitisse seu voto antes da aposentadoria, prevista para 2 de outubro.

O julgamento está com placar de 2 a 1 contra a tese que define a data de promulgação da Constituição Federal de 1988 como marco para definição da ocupação de terra tradicional pelos povos originários. Para Girolamo Treccani, professor de Direito Agrário da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Pará, é impossível prever qual entendimento deve prevalecer, contudo espera-se que sejam aplicados os dispositivos legais que reforçam as garantias dos indígenas.

“Eu entendo que não há justificativa nenhuma para o marco temporal. Se formos seguir essa perspectiva teríamos que retomar também as exigências da Constituição de 1934 ou ainda mais atrás. A própria Constituição no seu artigo 231 fala dos direitos originários desses povos. Não é algo datado”, explica o pesquisador.

Trecanni pontua ainda que as mudanças no Código Civil realizadas em 2010 também são favoráveis aos indígenas e contrariam a tese de que essas comunidades deveriam provar as circunstâncias em que teriam sido expulsos de seus territórios.

“O voto do ministro Edson Fachin foi bem embasado nesse sentido e acredito que outros ministros vão seguir essa perspectiva, como fez o Alexandre de Moraes. Evidente que outros, como Gilmar Mendes, podem votar a favor do marco temporal em razão do posicionamento dele em outros julgamentos”, analisa o professor que classifica que um eventual avanço do marco temporal prejudicial aos povos tradicionais.

Seria um retrocesso extraordinário no país. Iríamos defender algo que não está na Constituição, sobretudo porque se trata de povos originários. Prevaleceria uma visão pela usurpação e que criaria um problema com outras populações tradicionais, assim como mundo afora”, projeta Girolamo Treccani.

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