Cúpula Judicial: 'É preciso ser mais do que ter', diz Marina Silva ao desafiar mercantilismo atual
Ministra do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas afirmou que o sistema atual, baseado no consumo exacerbado, está destruindo o planeta
“Não há planeta que consiga abastecer oito bilhões de pessoas desejando coisas, isso leva à destruição”. Foi assim, ligando o sistema que estimula o consumo frenético à destruição da Amazônia, que a ministra do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas do Brasil, Marina Silva, abriu sua fala na 1ª Cúpula Judicial da Amazônia, evento criado para debater temas relacionados à atuação judicial ambiental na Amazônia, cujo primeiro dia aconteceu esta sexta-feira (04), na sede do Tribunal de Justiça do Pará (TJPA), em simultâneo ao "Diálogos da Amazônia", que acontecia no Hangar Centro de Convenções, em Belém.
VEJA MAIS
Diante de um público repleto de magistrados e importantes autoridades do governo brasileiro, como os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, Carmen Lúcia e Luís Barroso, além do governador do Pará, Helder Barbalho, do ministro da Justiça, Flávio Dino e da presidente da Fundação Nacional do Índio, Joenia Wapichana, a ministra afirmou que a humanidade precisa encontrar uma saída para o que classificou como “crise civilizatória”. Para Marina, a preservação da natureza só pode acontecer se houver uma mudança no padrão civilizatório baseado no consumo exacerbado. É preciso “ser” mais do que “ter”. E a Amazônia tem papel de protagonista no debate.
“Estamos vivendo uma crise civiliatória, repensando nossos valores. Temos que pensar na mudança deste padrão civilizatório baseado no ‘ter’. Isso é predatório e estamos vivenciando algo muito preocupante. Esse mercantilismo funciona em torno das pessoas desejando e consumindo sem parar, e isso tem uma fatura que o meio ambiente paga. Esse mercantilismo nos coloca uma realidade que só poderemos ser, se tivermos, mas não há planeta que consiga abastecer oito bilhões de pessoas desejando coisas. A sustentabilidade é uma forma de ser, não de fazer. É um ideal de mundo”, disse.
O governador do Pará corroborou com o discurso de Marina Silva. Para Helder Barbalho, a civilização está voltando os olhos para a importância da região amazônica para a sobrevivência do planeta, mas é necessário encontrar formas de rentabilizar a floresta em pé como um importante ativo brasileiro. “É importante que as instituições brasileiras incentivem a busca por iniciativas econômicas que façam a floresta em pé valer mais do que ela destruída. Não podemos mais continuar esse desmatamento e estamos vendo uma mudança desse padrão, alcançando esse ano uma redução do desmatamento. Isso é significa que o momento já chegou”, disse o governador.
Presidindo a cúpula, a ministra Rosa Weber também reforçou a existência das mudanças climáticas que atingem diretamente a Amazônia, pedindo aos estados que não meçam esforços para conter o desmatamento ilegal. “A mudança climática é um fenomeno que está sendo comprovado ano a ano, infelizmente. O desmatamento reduziu um pouco, mas não está sendo contido com toda força pelos estados. Há um domínio de organizações criminosas que se apoiam em fraude, corrupção, lavagem de dinheiro, tráfico de pessoas, de animais, de drogas, atividades que se conectam frequentemente com mercados lícitos, estabelecendo um ciclo perverso de retroalimentação”, denunciou.
Para a presidente da Fundação Nacional do Índio, Joenia Wapichana, que abriu seu discurso falando em sua língua nativa, o momento é de falar menos e fazer mais. É preciso que “todos os compromissos sejam realizados” e não fiquem apenas dentro das cúpulas e outros eventos que acontecem na região. “O momento é importante para que todos lutem por justiça climática, pois até quem antes defendia um sistema predatório, hoje já percebeu a situação dramática que estamos vivendo. Se continuarmos assim, não só a Amazônia será comprometida, como o próprio sistema entrará em colapso. Então esse encontro judicial serve para que este setor também crie as pontes necessárias para o desenvolvimento sustentável de nossa região”, disse.
Bem humorado durante seu discruso, o ministro da Justiça, Flávio Dino, elogiou as ministras presentes, dizendo que elas carregam o tesouro das folhas exuberantes, que valem mais do que o ouro e a madeira ilegal roubados pelo crime e criticando as fake news. “Vivemos um tempo de angústias, em que as pessoas são levadas a informações falsas em velocidade alucinante. Muita gente não acredita nas mudanças climáticas. Isso dificulta o exercício da atividade fundamental, que é garantir um caminho para a sociedade. Quando o CNJ decide realizar esse evento, é porque deseja afrontar isso, mostrar a importância de políticas capazes de desafiar as utopias destrutivas do nosso tempo. Está lá na Constituição de 1988, para todos verem, a ideia de equidade transgeracional, ideia de justiça ambiental, de desenvolvimento sustentável, está tudo lá, não é algo relacionado a uma ideologia política, mas sim humana”, disse Dino.
Por fim, durante sua fala de encerramento, Rosa Weber exaltou o poder da Amazônia no funcionamento global, incentivando a todos os magistrados presente a servirem a floresta em pé. “É inquestionável a importância da Amazônia para manutenção do equilíbrio climático. A Amazônia detém mais de 60% das florestas tropicais, 20% da água doce, 10% da biodiversidade mundiais. É um dos principais ativos do Brasil e ocupa posição estratégica na discussão pelas mudanças globais. Não é exagero afirmar que os danos causados na Amazônia repercutem em todo planeta”, disse a ministra do STF ao finalizar o primeiro dia de cúpula.
A programação da 1ª Cúpula Judicial da Amazônia segue neste sábado (05), presidida por Manoel Murrieta, presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (CONAMP), e com as presenças de nomes como André Aranha Corrêa do Lago, secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério de Relações Exteriores do Brasil, Maria Angélica Ikeda, diretora do Departamento de Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, e a ministra Maria Thereza de Assis Moura, presidente do Superior Tribunal de Justiça.
Palavras-chave
COMPARTILHE ESSA NOTÍCIA