Em proposta de delação, viúva de Adriano aponta quem mandou matar Marielle
Relato da viúva aponta que integrantes da milícia que atua na comunidade Gardênia Azul procuraram o ex-capitão para discutir o plano para assassinar Marielle
A viúva do ex-capitão da PM Adriano Magalhães da Nóbrega, morto em fevereiro de 2020, está negociando um acordo de delação premiada em que revela quem foi o mandante do assassinato da vereadora Marielle Franco, que morreu junto com o motorista Anderson Gomes, em março de 2018. Em conversas com promotores do Rio, Júlia Mello Lotufo disse quem foi o mandante da execução de Marielle e Anderson, detalhou a participação de Adriano em uma dezena de homicídios encomendados pela contravenção e listou agentes públicos que receberam propina para acobertar crimes. O MP ainda não respondeu se aceita a delação. As informações são da revista Veja.
O Ministério Público (MP) do Rio de Janeiro não chegou até agora aos mandantes dos assassinatos de Marielle e de Anderson. Já o MP da Bahia tenta desvendar se Adriano foi morto numa troca de tiros com a polícia, conforme a versão oficial, ou torturado e executado, como alega a família dele. Esses personagens quase acabaram associados quando autoridades lançaram a suspeita de que o ex-capitão participou da morte da vereadora, hipótese que depois foi descartada pelos investigadores.
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Porém, a viúva do ex-capitão, que está em regime de prisão domiciliar e é obrigada a usar tornozeleira eletrônica, propôs a colaboração com o objetivo de conseguir a revogação das medidas restritivas determinadas pela Justiça e, assim, recuperar a própria liberdade. De acordo com a Veja, alguns promotores demonstraram preocupação com o que consideram inconsistências e ausência de provas em alguns dos relatos recebidos.
Os anexos de Julia estão sob sigilo, mas a revista conseguiu reconstituir o que ela já disse sobre a ligação do ex-marido com o caso Marielle. Em suas primeiras informações prestadas, durante conversa com outras seis pessoas, em Brasília, em fevereiro de 2020, poucos dias depois da morte do marido, Júlia contou que Adriano não teve participação alguma no assassinato da vereadora e chegou a cobrar satisfações de seus comparsas em Rio das Pedras, na Zona Oeste do Rio, para saber se algum deles tinha envolvimento com o caso. Ele estava preocupado com a possibilidade de as investigações sobre o crime atrapalharem os negócios que ele tocava na região, que iam da grilagem de terras à exploração de máquinas caça-níquel.
Ela declarou ainda que a morte de Marielle e de Anderson foi um divisor de águas na vida de Adriano, principalmente depois que o nome dele apareceu entre os suspeitos de participar da execução da vereadora e do motorista.
De acordo com o relato de Julia, integrantes da milícia que atua na comunidade Gardênia Azul procuraram o ex-capitão para discutir a possibilidade de ele preparar um plano para assassinar Marielle. Ao fazer a sondagem, alegaram que a atuação da vereadora estaria colocando em risco os negócios da milícia não só em Gardênia Azul, mas em Rio das Pedras. Segundo a viúva contou às promotoras às promotoras Simone Sibílio e Letícia Emile, que já conduziram investigações que resultaram na prisão de comparsas de Adriano e que na época do encontro integravam a força-tarefa do caso Marielle, Adriano teria considerado a ideia absurda e arriscada demais, especialmente por envolver uma parlamentar.
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Tempos depois, ele foi surpreendido com a notícia do crime. Ao cobrar satisfações de comparsas de Rio das Pedras, teria ouvido que a ordem partiu do alto-comando da Gardênia Azul. Nenhuma das fontes consultadas pela reportagem da Veja quis informar o nome da pessoa que, conforme o relato de Julia, ordenou a execução de Marielle e Anderson. Um dos chefes da milícia de Gardênia Azul é o ex-vereador Cristiano Girão.
No início do mês, em 8 de julho, já com os anexos de sua proposta de colaboração redigidos, Julia esteve com o promotor Luís Augusto Soares de Andrade, ocasião em que repetiu tudo o que dissera sobre o caso Marielle — de como Adriano soube do plano para matar a vereadora até o nome do mandante.
Dois dias depois, em 10 de julho, o Ministério Público do Rio informou, sem explicação oficial sobre o motivo, que as promotoras Simone Sibílio e Letícia Emile deixaram a força-tarefa do caso Marielle. Fontes do MP relataram que as promotoras reclamaram do risco de interferências externas comprometerem as investigações da execução de Marielle e da transferência da negociação da delação de Julia das mãos delas para a de outro promotor, teoricamente menos familiarizado com os temas constantes dos anexos.
Simone e Letícia também teriam mostrado insatisfação com as fragilidades das provas nos relatos da viúva. A assessoria do MP informou que cabe a elas explicar o motivo da saída da força-tarefa do caso Marielle.
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