Quebras de sigilo revelam indícios de envolvimento de Bolsonaro em 'rachadinhas'
Após o STJ ter anulado a utilização dos dados, o Ministério Público recorreu ao Supremo
A quebra de sigilos bancário e fiscal do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) mostra indícios de que o presidente da República Jair Bolsonaro e o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos) também faziam esquema de “rachadinha” em seus gabinetes. “Rachadinhas” são a prática do agente público que recolhe parte ou até a totalidade do salário pago a assessores e funcionários contratados. As informações foram publicadas nesta segunda-feira pelo site Uol, que teve acesso às quebras de sigilo em setembro de 2020. A reportagem afirma ter analisado 607.552 operações bancárias de 100 suspeitos de participação nos crimes.
O STJ (Superior Tribunal de Justiça) anulou o uso dos dados das quebras de sigilos no processo contra Flávio. O MPF (Ministério Público Federal), no entanto, recorreu junto ao STF (Supremo Tribunal Federal) para rever a decisão.
Quatro funcionários que trabalharam para Jair Bolsonaro em seu antigo gabinete na Câmara dos Deputados retiraram 72% de seus salários em dinheiro vivo. Eles receberam R$ 764 mil líquidos, entre salários e benefícios, e sacaram o total de R$ 551 mil.
Um exemplo é o assessor Fernando Nascimento, que trabalhou no gabinete de Jair Bolsonaro de maio de 2009 a maio de 2014. No período, recebeu R$ 164 mil da Câmara dos Deputados. Sacou pelo menos R$ 126 mil, o equivalente a 77% do salário. Em alguns meses, sacou 100% do que recebeu.
Quando saiu da Câmara dos Deputados, Nascimento foi nomeado por Flávio Bolsonaro na Alerj. Por isso, acabou tendo o sigilo bancário quebrado no caso das “rachadinhas”. Em 2019, quando Flávio assumiu cadeira de senador, Nascimento e sua mulher foram nomeados para cargos no Senado.
O secretário parlamentar Nelson Rabello, militar reformado que serviu no Exército ao lado do atual presidente, começou a trabalhar com a família Bolsonaro em 2005, no gabinete de Carlos, na Câmara Municipal do Rio. Ficou 1 mês e depois virou assessor de Jair Bolsonaro em Brasília, até 2011. Depois, atuou no gabinete de Flávio e de Carlos. Em 2017, voltou a atuar com Jair.
Em 6 anos na Câmara dos Deputados, ele sacou 70% do que recebeu (R$ 134 mil dos R$ 192 mil). Apesar do rendimento, em 2012, Rabello chegou a entrar na Justiça para negociar uma dívida de R$ 3.200. Em 2018, quando Bolsonaro foi eleito presidente, o percentual de saques de Rabello foi maior, 88%.
O secretário parlamentar Daniel Medeiros, que trabalhou para Bolsonaro de 2014 a 2017, sacou 72% do salário.
Um 4º funcionário de Jair Bolsonaro aparece na quebra de sigilo. Jaci dos Santos, sargento reformado do Exército, trabalhou no gabinete do então deputado federal por 8 meses, de dezembro de 2011 a julho de 2012. Ele sacou 45% de tudo o que recebeu da Câmara dos Deputados.
EX-CHEFE DE GABINETE DE FLÁVIO PAGAVA APARTAMENTO DE LÉO ÍNDIO
Mariana Mota, ex-chefe de gabinete de Flávio Bolsonaro, fez pagamentos do aluguel de uma quitinete no centro do Rio onde morava Leonardo Rodrigues de Jesus, o Léo Índio, primo do atual senador.
O dinheiro saía da conta de Mariana no período em que Flávio foi deputado estadual e que Léo constava como seu assessor na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), ao longo de 2007.
Foram 5 pagamentos em benefício de Léo Índio. Em fevereiro de 2007, Mariana fez uma transferência identificada como “al.leo” para Norival Dantas, que alugava imóvel para Leo Índio. O valor foi de R$ 503.
No mês seguinte, repetiu a operação para Dantas, no valor de R$ 460 –dessa vez, anotou “condomin”. Em maio, outra transferência, identificada como “leo” e valor de R$ 503. Em julho do mesmo ano, outra operação chamada de “aluguel”, no total de R$ 500. Em agosto, mais R$ 500 com anotação “leo”.
ASSESSORES DE CARLOS SACARAM R$ 470 MIL EM DINHEIRO VIVO
Entre os funcionários de Carlos Bolsonaro que tiveram o sigilo bancário quebrado estão Márcio Gerbatim e seu sobrinho Claudionor Gerbatim.
Marcio, ex-marido de Márcia Aguiar, atual mulher de Fabrício Queiroz, tornou-se funcionário do gabinete de Carlos Bolsonaro em abril de 2008. Ficou no cargo por 2 anos. Nesse período, recebeu R$ 89 mil e sacou pelo menos R$ 86 mil, 97% do que recebeu.
Claudionor, na Câmara Municipal do Rio, sacou R$ 54,8 mil de seus pagamentos de R$ 58 mil, o que equivale a 94% do valor total.
Nelson Rabello, militar reformado que serviu no Exército ao lado do atual presidente, que também fez saques da maior parte do salário quando trabalhou com Jair Bolsonaro, atuou com Carlos Bolsonaro na Câmara Municipal do Rio. No período, sacou 70% do salário em dinheiro vivo.
Andrea Siqueira Valle, irmã de Ana Cristina Valle, 2ª mulher de Jair Bolsonaro, foi vinculada ao gabinete de Carlos na Câmara Municipal do Rio de 2006 a 2008. Nesse período, não morou na capital fluminense, mas em Resende, a mais de 150 quilômetros do Rio. Vivia de faxinas e outros trabalhos temporários. Ela recebeu R$ 76 mil e sacou pelo menos R$ 79 mil.
OUTRO LADO
Procurados pela reportagem do Uol, nem Flávio, nem Carlos e nem Jair Bolsonaro responderam às indagações sobre os dados colhidos na quebra de sigilo do filho mais velho do presidente.
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