Mensagens indicam irritação da equipe de Moraes com Interpol, afirma jornal
Escritório da Interpol na França não teria atendido a pedido de inclusão do nome de Allan dos Santos na Difusão Vermelha por entender “que a questão poderia ter viés político”
Troca de mensagens entre dois juízes instrutores do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes demonstraram o descontentamento com a atitude da Interpol (sigla em inglês para Organização Internacional de Polícia Criminal) e do governo dos Estados Unidos no caso envolvendo o blogueiro Allan dos Santos. As informações foram divulgadas pelo jornal Folha de S.Paulo, que teve acesso às mensagens.
Em um trecho da conversa, de novembro de 2022, Airton Vieira, juiz instrutor no gabinete do ministro no STF, fala sobre a inclusão do nome de Allan dos Santos na Difusão Vermelha da Interpol e afirma que o pedido já foi feito há mais de ano, e estava em análise em Lyon [França], sede da organização. "E o pessoal de lá até agora não atendeu, simplesmente se recusou a pôr e de nada adiantaram os pedidos reiterados feitos pela Interpol aqui do Brasil”, declarou.
Na conversa com o juiz Marco Antônio Vargas, que trabalhava no gabinete de Moraes no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Vieira diz ainda que o escritório da Interpol na França deu a entender “que a questão poderia ter viés político”, por isso, segundo ele, Allan dos Santos ainda não tinha sido preso.
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“O escritório central da Interpol, em Lyon, não coloca o nome dele no alerta vermelho. Os EUA não respondem ao pedido de extradição, que já foi feito, com base até na prisão preventiva dele decretada. A situação é essa”, diz Airton Vieira.
Marco Antônio Vargas respondeu que nem iria “responder ao ministro” sobre a questão envolvendo a Interpol, pois Moraes “deve saber bem essa história”.
Vieira confirma que Moraes "conhece essa história em detalhes" e que o ministro "Não se conforma, com toda a razão".
"Mas nada podemos fazer quanto a essa questão da Interpol, assim como com a questão da extradição. Tudo o que podíamos fazer foi feito, seguimos todo o trâmite. Mas a Interpol em Lyon engavetou o pedido de alerta vermelho e os EUA não resolvem a questão da extradição. Difícil”, acrescenta.
Em outra mensagem, Marco Antônio Vargas diz que as atitudes dos EUA e da Interpol são “sacanagem”. Vieira responde: "Com certeza. Por isso esse idiota do Allan dos Santos se sente livre para fazer o que faz”.
“Se eles [norte-americanos] quiserem te mandar embora porque não gostaram dos seus olhos, eles inventam um pretexto qualquer e colocam você no 1º avião de volta e deportam, extraditam, dão pé no traseiro, o nome que você quiser, mas eles fazem o que eles bem entenderem com quem eles quiserem. Do contrário, não há governo no mundo que determine o que eles têm que fazer”, reclamou o magistrado, em um áudio.
“Eles têm o tempo deles, os interesses deles, esse é o problema todo, essa é a questão”, acrescentou. E completou: “Se, para nós, o Allan dos Santos tem alguma importância, para eles a importância é zero. Então, eles não vão comprar uma dor de cabeça com o governo do Brasil, em que pese o governo do Brasil ser de outra orientação. Talvez a partir de 1º de janeiro [de 2023, com a posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT)] a coisa mude, não sei”.
Caso contra Allan dos Santos
Em 21 de outubro de 2021, Moraes decretou a prisão preventiva do blogueiro Allan dos Santos por atuação em organização criminosa, crimes contra honra e incitação a crimes, preconceito e lavagem de dinheiro. Os crimes estão incluídos no Tratado de Extradição firmado entre EUA e Brasil e dependem de análise do governo norte-americano.
Em novembro de 2022, o blogueiro se juntou a manifestantes e foi filmado em manifestação contra ministros do STF que participavam de um evento em Nova York (EUA). “Peça para o Airton falar com a PF [Polícia Federal] sobre o alerta vermelho”, escreveu Vargas, referindo-se ao alerta para que autoridades policiais do mundo todo localizem e prendam provisoriamente uma pessoa enquanto aguarda extradição, rendição ou ação legal semelhante.
Vieira responde que já teria acionado o representante da Interpol no Brasil, procurado a Interpol em Washington (EUA) e o adido brasileiro na organização para que tomassem providências sobre o blogueiro.
Procurado pela Folha, o gabinete de Alexandre de Moraes disse que “todos os procedimentos foram oficiais, regulares e estão devidamente documentados nos inquéritos e investigações em curso no STF, com integral participação da Procuradoria Geral da República”.
Na última quarta-feira (14.08), Alexandre de Moraes emitiu nova ordem de prisão de Allan dos Santos.
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