Grilagem ronda mais de 10 mil propriedades com títulos cancelados no Pará

São Félix do Xingu e Altamira respondem por de 50% da áreas de terras com títulos cancelados

Fabrício Queiroz
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O Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), a Universidade Federal do Pará (UFPA) e o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará (IFPA) apresentaram dados críticos sobre a realidade fundiária do Estado do Pará. O estudo das três instituições mostra que há 10.728 imóveis rurais com matrículas canceladas no Pará, que somados representam uma área de 91,12 milhões de hectares, correspondente a 73% de toda a extensão territorial do estado.

Essas áreas estão bem distribuídas, porém a problemática em torno delas é mais evidente nos municípios de São Félix do Xingu e Altamira. Neles, estão 45,6 milhões de hectares de terra com títulos cancelados por determinação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

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Em 2010, o órgão ordenou que os cartórios locais invalidassem as matriculas das propriedades com áreas superiores as permitidas. De 1934 a novembro de 1964 era permitido titular terras de até 10 mil hectares sem autorização do Congresso. Entre novembro de 1964 e outubro de 1988 o limite passou a ser de 3 mil hectares e, desde 05 de outubro 1988, passou a valer o limite de 2,5 mil hectares. Com a decisão do CNJ, os registros que desrespeitavam a lei foram cancelados e seus supostos proprietários foram obrigados a comprovar a legalidade para regularizar seus títulos.

Contudo, segundo a pesquisa, foi possível comprovar com uso de mapas e dados georreferenciados que somente 332 realmente existem. “Há várias possibilidades para explicar isso. Uma delas é que é essas áreas nunca existiram. A segunda é que quando foi feito o registro dessas propriedades não existia a exigência de georreferenciamento. Outra suspeita é que, por erro ou propositalmente, essas matrículas foram inflacionadas”, analisa a pesquisadora do Imazon, Brenda Brito.

Além disso, o projeto detectou que apenas uma propriedade teria sido retomada pelo Governo do Estado ao longo de 12 anos. A área em questão é a gleba “Arraiolos”, que possui 386 mil hectares e está localizada no município de Almeirim. A propriedade de origem seria a Fazenda Saracura, que teria sido registrada ilegalmente pela empresa Jari S/A.

“É possível haver erros, mas a gente sabe que há um histórico de inúmeras práticas de adulteração, inclusive já comprovadas por CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) e outras pesquisas, que isso ocorre dentro de um contexto de fraude”, alerta Brenda Brito, chamando atenção para o fato de que os dados reforçam as evidências de grilagem no Pará. “Os dados do levantamento mostram que muitos títulos são falsos porque seria impossível ter toda essa área privada, sendo que mais da metade do estado é de áreas protegidas”, acrescenta.

No mesmo sentido, Girolamo Treccani, que é professor da UFPA e membro da Clínica de Direitos Humanos da Amazônia (CIDHA), lembra que a pesquisa aponta para a importância da transparência nos encaminhamentos dados pelo Governo do Estado e o Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) para medidas de regularização, por exemplo.

“Percebemos que muita coisa foi feita, mas ainda temos muitos passos para dar. O problema não é legal nem técnico, mas sim burocrático. Os documentos precisam vir a público porque ajudam a sociedade a se apropriar das informações e o estado a saber quais os caminhos tomar para que a grilagem nunca mais prospere”, afirma o pesquisador, que complementa: “Se não resolvermos o gargalos dessas matriculas sobrepostas, não poderemos dar uma resposta à altura no desafio de combater as mudanças climáticas”.

“É importante a transparência sobre os imóveis que conseguiram desbloquear esse cancelamento e que comprovaram sua legalidade. Isso vai aumentar a segurança jurídica para investimentos no estado”, frisa Brenda Brito.

O Governo do Estado, por meio do Instituto de Terras do Pará (Iterpa), informou que 75% do seu território está sob gestão federal e, portanto, “as medidas de arrecadação, matrículas e retomadas de terras públicas competem exclusivamente aos órgãos públicos federais”.

“Aquilo que compete à gestão fundiária estadual, o correspondente à aproximadamente 25% do seu território, nos últimos 4 anos, incluindo o grave período pandêmico, o Governo do Pará foi o que mais arrecadou e matriculou terras públicas estaduais no Brasil. Foram cerca de 4,1 milhões de hectares”, destaca o Iterpa em nota.

Em relação ao provimento de 2010 do CNJ, o órgão diz ainda que as áreas indicadas nas matrículas não poderiam ser localizadas por não terem informações geoespaciais, o que prejudicou qualquer tentativa visando a arrecadação ou retomada dessas propriedades. “O Iterpa reitera que já se colocou à disposição do Governo Federal para colaborar na construção do Cadastro Único”, conclui. O Grupo Liberal também entrou em contato a assessorias do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, mas ainda não obteve resposta até o fechamento desta edição.

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