Com PEC de Bolsonaro travada na Câmara, PT deve apresentar nova proposta de reforma administrativa
Proposta do Governo Federal está na Câmara desde setembro de 2020 e deve perder forças após posse do presidente eleito Lula
Um dos principais projetos econômicos do governo Bolsonaro (PL), a reforma administrativa apresentada na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32/20 está longe de ser uma realidade. A matéria foi apresentada em setembro de 2020 na Câmara dos Deputados, mas até hoje não foi ao Plenário para ser votada. Dessa forma, o atual presidente deve passar a faixa presidencial ao eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sem colocar em prática a ideia de enxugar a máquina pública, o que deve ficar como tarefa para o próximo governo, já que o petista avisou: é a favor.
O ex-ministro Aloizio Mercadante, que coordena grupos técnicos do governo de transição e foi indicado para presidir o BNDES, reforçou que a nova gestão concorda com a realização de uma reforma administrativa, mas sem apoiar a proposta que já tramita no Congresso. “O presidente Lula já disse que a reforma administrativa é necessária, não significa que seja a PEC 32. Temos outra visão do serviço público”, afirmou Mercadante, em entrevista a jornalistas no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), em Brasília.
Paulo Guedes via a reforma como um mecanismo para solucionar parte do problema orçamentário
Para o ministro da Economia de Bolsonaro, Paulo Guedes, a reforma era vista como necessária para solucionar a falta de espaço no orçamento público, buscando reformular partes do sistema dos servidores públicos, buscando uma redução das despesas atuais do governo. Nesse sentido, a PEC 32/20 criaria um novo regime de vínculos empregatícios, mudaria a organização da administração pública e encerraria alguns benefícios que o setor possui.
O deputado federal pelo Pará Airton Faleiro (PT) explica que uma nova proposta de reforma administrativa deve ser formulada e apresentada pelo governo Lula, pois é certo que a PEC 32 não vai ganhar força na próxima gestão.
“Nós já ouvimos do próprio [Fernando] Haddad, que foi anunciado como futuro ministro da Fazenda, que a reforma que for realizada não será a PEC 32. O Mercadante, quando falou como coordenador da Equipe de Transição, foi bem claro. Ele disse que temos que construir um Estado mais eficiente, transparente e que promova a carreira dos servidores”, explica o parlamentar.
Faleiro disse que a equipe de Lula reconhece os benefícios de uma reforma administrativa. “Reformas, sempre que necessárias, devem ser conduzidas de forma equilibrada visando o bem estar da população com valorização do servidor e otimização dos recursos públicos com as novas tecnologias. Em síntese, o equilíbrio fiscal combinado com o equilíbrio social”, reitera o petista.
“A última reforma administrativa foi feita no governo de Fernando Henrique Cardoso. Há muitas outras tecnologias agora, é preciso se adequar a essas tecnologias, porém com valorização do servidor e valorização da estrutura administrativa que é do povo brasileiro e cumpre um papel central na prestação de serviços públicos”, finaliza o deputado federal.
A PEC 32/20
Por ser uma PEC, o processo de aprovação envolve a obtenção de 3/5 dos votos dos deputados, na Câmara, e 60% dos senadores, no Senado, com votações em dois turnos. Uma vez aprovada, a PEC não precisa passar por sanção presidencial, devendo ser promulgada pelo próprio Congresso. Entretanto, a PEC 32/20 resistência entre as entidades que representam os servidores públicos, e com a chegada das Eleições 2022, a votação ficou ainda mais inviável.
O texto do governo Bolsonaro já sofreu alterações pelas comissões da Câmara e ainda pode ter mais quando for à plenária. Entretanto, todas as mudanças propostas valerão apenas para futuras contratações, preservando os direitos dos servidores já concursados, pois a reforma prevê a manutenção da estabilidade de categorias consideradas “típicas de Estado”.
Entre elas, estão “atividades finalísticas da segurança pública, manutenção da ordem tributária e financeira, regulação, fiscalização, gestão governamental, elaboração orçamentária, controle, inteligência de Estado, serviço exterior brasileiro, advocacia pública, defensoria pública e atuação institucional do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, incluídas as exercidas pelos oficiais de justiça, e do Ministério Público”.
A PEC 32/20 também possibilita a realização de contratos temporários por meio de processo simplificado, com prazo determinado e limite de 10 anos. Em casos de urgência, essa contratação poderia ser feita sem esse processo.
Com a reforma de Guedes, o servidor também poderá ser desligado caso receba duas avaliações insatisfatórias no chamado período de estágio probatório, que envolve ciclos semestrais.
Outra proposta envolve a redução da jornada de trabalho e a remuneração dos servidores públicos. Na Câmara, essa redução foi limitada a 25% e somente em períodos de crise fiscal. O texto também possibilita a cooperação do setor privado nas contratações de servidores públicos.
Sindicalistas esperam que a sociedade seja ouvida
O presidente da Força Sindical no Estado, Ivo Borges, disse que a reforma administrativa em si não é uma proposta ruim, porém, desde que seja feita ouvindo a sociedade e classe mais atingida por ela. “Nossa posição é de que esse assunto precisa ser melhor debatido. Não pode ser feito de forma que apenas o alto escalão tome as decisões. Por exemplo, não é unânime que a máquina precise ser enxugada. Há muitos setores em que se vê necessidade do contrário, mais contratações”, opina o sindicalista.
“Nos órgãos de fiscalização como Receita e Ministério Público Federal há muitas pendências, servidores que se aposentaram e não foram substituídos. Além disso, também somos contrários a ideia de abrir possibilidade para contratações temporárias, sem concursos. Isso acaba com a segurança e estabilidade do trabalhador. Essa linha de reforma nós somos contra. O Brasil deve encontrar outra forma de combater o desperdício de dinheiro público sem prejudicar os trabalhadores”, defende Ivo Borges.
O presidente do Sindicato dos Funcionários do Judiciário do Estado do Pará (Sindju),Thiago Lacerda, também se mostra contrário à PEC 32/20 e a favor de uma reforma. “Concordo que o serviço público seja aperfeiçoado, pois ele é o vetor de garantia dos direitos para a população. É por meio dos servidores que o Estado atende à população e sempre há espaços para melhorias”, afirma.
“Um dos pontos da PEC que somos contrários é a possibilidade de contratação sem concursos públicos. É necessário que os servidores tenham estabilidade para trabalhar independente do governo em vigor, isso garante que eles trabalhem para o povo e não para gestão. É necessário manter essas garantias”, justifica Thiago Lacerda.
O titular da entidade completa que espera que o governo Lula dialogue com a classe. “Desde que essa proposta começou a tramitar, nunca fomos ouvidos. Não somos contra as reformas, mas é necessário ter mais discussões do serviço público e que os próprios servidores também façam parte da construção da nova proposta. Nada que venha de forma impositiva, sem diálogo, será bem aceito”, finaliza o sindicalista.
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