Alta de energia acumulada chega a 839% e Equatorial (Celpa) tem lucro bilionário
Percentual está bem acima da inflação calculada em 355% para o mesmo período, segundo o Dieese
Desde a privatização da Celpa, hoje Equatorial Pará, o reajuste acumulado entre 1999 e 2022 nas contas de luz do consumidor paraense alcança alta de 839%, bem acima da inflação de cerca de 355% calculada para o mesmo período. Os dados, divulgados esta semana pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese/PA), mostram como os custos com energia elétrica têm pressionado o orçamento das famílias que vivem no estado, apesar dos resultados financeiros da concessionária que atende o território paraense.
Somente no primeiro trimestre deste ano, por exemplo, a Equatorial Energia registrou lucro atribuído aos controladores de R$ 580 milhões, uma alta 64,2% em relação ao mesmo período de 2021, conforme matéria divulgada pelo Valor Econômico. A receita líquida avançou 41% no comparativo trimestral, para R$ 5,8 bilhões.
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Em 2021, segundo o portal Canal Energia, apesar da redução de 14,4% no lucro líquido em comparação a 2020, o saldo positivo alcançou R$ 1,9 bilhão. A companhia também reportou aumento dos volumes de energia vendida em todas as suas distribuidoras, sendo o maior índice verificado no Amapá, com alta de 11,3% em 2021. No Pará, o índice foi de 6,8%.
Em 2020, primeiro ano da pandemia da covid-19, que afetou a economia em todo o mundo, a empresa obteve um lucro líquido ajustado de R$ 2,2 bilhões, aumento de 52,1% na comparação com 2019, quando ficou com saldo de R$ 1,48 bilhão.
Ainda assim, os paraenses chegaram perto de ter que arcar com um reajuste tarifário de cerca de 30% neste ano. Após considerar alguns componentes financeiros e aporte da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), por parte da Eletrobrás, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou, na última terça-feira (2), o reajuste tarifário de 15,12% para os consumidores da Equatorial Pará, que entra em vigor a partir deste domingo (7) – o impacto na conta seria de 14,88% para os consumidores de baixa tensão, composto por residências, lojas, edifícios comerciais e imóveis rurais, e de 16,05% para os consumidores de alta tensão, que são as indústrias e os estabelecimentos comerciais de médio e grande porte. Por uma articulação do governador Helder Barbalho, que chegou a se reunir em Brasília com a diretora-geral substituta da Aneel, Camila Bonfim, para discutir sobre os custos da energia no Estado, e a medidas como a redução do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS), um tributo estadual, de 25% para 17%, o resultado será de queda na conta de energia.
“A redução de 5,34% é o efeito conjugado da revisão aprovada ontem e das medidas de redução da alíquota e da base de incidência do ICMS no preço final da energia. O efeito da revisão é 15,2%, mas caso essas medidas citadas sejam implementadas pela Secretaria de Fazenda Estadual, o consumidor vai perceber no preço final da energia na conta de luz a redução de -5,34”, informou a Aneel. Outra medida importante nesse processo tarifário informado pela Aneel, conforme observado pelo Dieese Pará, foi o disposto na Lei nº 14.385/2022, que trata da devolução dos créditos tributários referentes à retirada do ICMS da base de cálculo do PIS/Pasep e da Cofins.
Alta passa de 800%
Em todo o Pará, há em torno de 2,8 milhões de unidades consumidoras de energia elétrica em 144 municípios. O estudo do Dieese Pará aponta que esta foi a vigésima quarta revisão tarifária dos paraenses autorizada pela Aneel à Equatorial Energia desde a sua privatização. “Os impactos no bolso dos consumidores paraenses com os sucessivos aumentos nas contas de energia elétrica desde a privatização da Celpa são bem maiores do que somente os percentuais autorizados no aniversário das privatizadas ou das revisões tarifarias ocorridas durante este período”, diz a análise do Dieese.
Segundo o levantamento, fatores como a elevação das alíquotas de ICMS sobre a energia elétrica em janeiro de 2001, aliado aos reajustes para cobrir os prejuízos da Rede Celpa com o apagão em janeiro 2002, ajustes anuais do seguro apagão (até 2005) e Regime de Bandeiras Tarifarias, fizeram com que o valor da tarifa de energia elétrica cobrada pela Equatorial no Pará tivesse um crescimento expressivo e acima da inflação, alcançando alta acumulada de 839% desde 1998. “Desde julho de 1998 até agora, a Inflação medida pelo INPC/IBGE está girando em torno de 355%. Vale salientar que é justamente a inflação medida por estes índices que são tomadas como parâmetro para reajustes dos salários (quando são reajustados)”, diz a entidade. “O pior desta situação é que mesmo pagando caro, os serviços oferecidos pela empresa ainda são alvo de muitas reclamações por parte expressiva dos consumidores paraenses”, completa o Dieese.
“Todo mês é uma surpresa na conta”, reclama consumidor
Além dos altos custos da energia, o consumidor paraense também enfrenta problemas com a qualidade do serviço prestado. Miqueias Farias, de 38 anos, tem uma sorveteria em Redenção, no Pará, há quatro anos. Ele relata que, quando abriu o estabelecimento, a conta de energia variava entre R$ 800 e R$ 1 mil. Hoje, gira entre 2,2 mil a 2,8 mil. “Sentimos o aumento tanto em nossa residência, quanto no nosso comércio, em percentuais bem acima da nossa realidade. Nunca sabemos de fato quanto a energia vai vir em média, todo mês é uma surpresa. Quando estamos programando o valor para o pagamento e chega o talão de cobrança, sempre nos surpreende, não dá para calcular ou programar de fato”, afirma.
No estabelecimento comercial de Miqueias são necessário quatro aparelhos, entre expositor de água e freezer, para o atendimento e armazenamento do sorvete. “Fazemos revezamentos dos aparelhos, mantemos um desligado e o outro ligado, e com aumento da energia, passamos a desligar mais de um, porém, não conseguimos sentir tanta diferença nos valores quando chega a cobrança”, diz o comerciante. “Tivemos que nos reorganizar, fazer uma nova planilha de contas, tanto com boletos, alimentação, escola. Reformulamos tudo, tivemos que nós privar de algumas coisas, até mesmo para priorizar manter as despesas mais necessárias e contas fixas. Ou seja, um verdadeiro ‘rebolado’”, completou.
Quedas de energia é fator complicador
Outra situação preocupante, segundo Miqueias, é que a cidade em que vive enfrenta muitas vezes problemas de quedas de energia. “Quando você precisa de uma religação, é bem demorada. No escritório da concessionária, muitas das vezes os atendentes são mal educados, atendimento péssimo e demorado, buscamos de todas as formas não ter que precisar de ir até lá!”, completou.
Dados do Sistema Estadual de Defesa do Consumidor (Procon) no Pará mostram que a Equatorial lidera o ranking de reclamações de consumidores, com 1.191 registros contra a concessionária de energia, no período de 1 de janeiro a 12 de agosto do ano passado. O número representava 23,15% do total de demandas recebidas pelo órgão. Para se ter uma dimensão, a segunda empresa com mais reclamações, na ocasião, era a Oi Móvel, com 210 queixas.
A redação integrada do Grupo Liberal pediu os dados atualizados do ranking de reclamações de consumidores ao Procon deste ano, mas não obteve resposta.
Demonstrativo da trajetória dos reajustes nas tarifas de energia elétrica residenciais desde a privatização da Celpa em 1998
(incluindo as autorizações da Aneel e reajuste do ICMS)
2022: 14,38%
2021: 8,02%
2020: 2,97%
2019: 1,74%
2018: 11,78%
2017: 5,86%
2016 7,61%
2015 (Ago): 6,30%
2015 (Mar): Reaj.Extraord 3,60%
2014: 34,34%
2013: 11,52%
2012: 7,49%
2011: -
2010: 11,89%
2009: 3,52%
2008: 19,23%
2007: 13,06%
2006: 1,74%
2005: 4,83%
2004: 4,34%
2003: 26,38%
2002: 14,23%
2001: 27,48%
2000: 16,11%
1999: 10,60%
TOTAL ACUMULADO: 839,00%
FONTE: DIEESE PARÁ
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