Chuvas impõem desafios para a preservação de mais de 2 mil edificações históricas de Belém
Prefeitura trabalha para recuperar prédios históricos e especialistas alertam sobre riscos da degradação
Os prédios históricos de Belém, que contam parte da história da cidade e do país, enfrentam um cenário de deterioração causado pelo tempo, o que acaba se intensificando no período das chuvas intensas. Neste cenário, resistem 26 itens tombados e 2.800 edificações protegidas, conforme informações do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Diante disso, a Prefeitura de Belém tem trabalhado em um projeto de revitalização do centro histórico, buscando restaurar esses imóveis e dar uma nova utilidade a eles. Especialistas, no entanto, alertam que a falta de conservação pode comprometer ainda mais essas construções e colocar em risco tanto o patrimônio quanto a segurança da população.
Ainda de acordo com o Iphan, entre os itens tombados que existem na capital paraense, estão conjuntos arquitetônicos, edificações, coleções, acervos, jardim histórico, bem móvel e ruína. E maior parte das edificações protegidas pertencem aos bairros da Cidade Velha e da Campina, onde grande maioria dos bens tombados também se concentram.
O órgão detalha que os primeiros tombamentos realizados pelo Iphan, em Belém, datam de 1940, com a Coleção Arqueológica e Etnográfica do Museu Paraense Emílio Goeldi. Em 1941, foram tombadas as igrejas da Sé, de Santo Alexandre, e de São João Batista, além do o Colégio Jesuítico. Em 1977, foi tombado o conjunto arquitetônico e paisagístico Ver-o-Peso e áreas adjacentes: Praça Pedro I e Boulevard Castilhos França, inclusive o Mercado de Carne e o Mercado Bolonha de Peixe.
Impacto das chuvas e riscos para os imóveis tombados
A professora Rachel Sfair, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Pará (UFPA), alerta para os impactos que a falta de manutenção pode causar. “Esses imóveis históricos possuem características arquitetônicas específicas, como telhados de ferro, paredes revestidas com azulejos e sistemas de calhas que, sem conservação adequada, se tornam pontos de infiltração”, explica. “A água da chuva entra nessas edificações, aumenta a umidade, prolifera fungos e compromete a estrutura das paredes.”
Outro problema destacado pela especialista é a substituição de áreas verdes por pavimentação, tanto nas ruas quanto nos quintais dessas casas históricas. “Com menos solo absorvendo a água, a água da chuva se acumula e se infiltra nos alicerces dos prédios, acelerando o desgaste. Isso compromete a estrutura e pode levar até ao desabamento”, aponta Rachel.
A docente também menciona que muitas dessas construções foram erguidas lado a lado, compartilhando paredes germinadas. “Se uma dessas edificações vizinhas desaba, a estrutura da outra pode ficar comprometida, pois perdem um suporte essencial. Esse é um problema comum no centro histórico de Belém, onde vemos prédios caindo e deixando cicatrizes urbanas”, destaca.
Soluções para a preservação do patrimônio
Para evitar a degradação acelerada desses imóveis, Rachel defende a adoção de estratégias de conservação preventiva e educação patrimonial. “A conservação preventiva envolve ações contínuas de manutenção antes que o dano ocorra. Isso inclui reparos regulares nos telhados, calhas e fachadas, garantindo que o prédio não se deteriore ao ponto de precisar de uma restauração completa”, explica.
Já a educação patrimonial, segundo ela, deve começar desde a infância. “As pessoas precisam entender o valor desses imóveis históricos. Se a população não conhece a importância do patrimônio, dificilmente haverá um compromisso com sua preservação. É essencial que esse conhecimento seja passado nas escolas e na comunidade”, ressalta.
Além disso, Rachel aponta a necessidade de um planejamento urbano que leve em conta o impacto ambiental na conservação dos prédios. “O aumento da impermeabilização do solo e a redução das áreas verdes contribuem para o alagamento das ruas e a deterioração das estruturas. Medidas de drenagem e planejamento paisagístico podem minimizar esses efeitos”, sugere.
Prefeitura planeja ações
O diretor de desenvolvimento urbano da Companhia de Desenvolvimento e Administração da Área Metropolitana de Belém (Codem), Marcus Atayde, explica que a atual gestão herdou um centro histórico em estado crítico. “A nova gestão recebeu um centro histórico totalmente abandonado, com muitos prédios históricos deteriorados, alguns em condições precárias e sem acessibilidade. Isso acaba desestimulando a ocupação e o uso da área, tanto comercialmente quanto para moradia”, afirma.
Para reverter esse cenário, Marcus destaca que a prefeitura está apostando na requalificação da área, com foco na criação de polos de gastronomia, cultura e economia criativa. “A intenção é justamente ocupar o centro e trazer as pessoas de volta para essa região. Mas, para isso, precisamos identificar imóveis abandonados e criar soluções que estimulem novas moradias e atividades econômicas”, explica.
Segundo ele, uma das estratégias para garantir a sustentabilidade dessas ações é envolver o setor privado. “O que tem acontecido até hoje é que o poder público restaura os imóveis, mas não dá uma destinação correta e não cria um modelo sustentável para sua manutenção. Assim, um prédio restaurado em um ano pode estar abandonado no outro. Por isso, estamos investindo na construção de Parcerias Público-Privadas (PPPs) para garantir a preservação contínua desses espaços”, ressalta Marcus.
Expectativas para o futuro
A revitalização do centro histórico de Belém é um desafio que exige esforços conjuntos. Enquanto a prefeitura aposta em soluções para restaurar e reutilizar esses imóveis, especialistas reforçam a importância da conservação preventiva e da conscientização sobre o valor histórico da cidade. A recuperação desses espaços não apenas preserva a memória arquitetônica de Belém, mas também pode trazer benefícios econômicos e sociais, tornando o centro da cidade mais atrativo para moradores, comerciantes e turistas.
Sobre isso, o Iphan também complementa dizendo que "segue comprometido com a preservação do patrimônio cultural e continuará a atuar, dentro de suas competências, para garantir a segurança dos espaços históricos e de seus frequentadores", diz o órgão, em nota.
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