Cenário eleitoral ainda está indefinido, afirma jurista
Ives Gandra Martins considera que Lula ainda será confrontado com casos como o Petrolão
Chegamos a 2022 e com ele as movimentações no campo político, que se intensificam por todo o País por conta da aproximação das eleições gerais. Para analisar um pouco das perspectivas do processo eleitoral e dos temas relacionados a ele, o grupo Liberal entrevistou, de forma exclusiva, Ives Gandra Martins, jurista de 86 anos e grande referência no mundo jurídico. Ives tem participado de debates atuais da conjuntura da política brasileira.
Sobre a corrida ao Planalto, Ives Gandra analisou de forma apurada o cenário político pré-eleitoral. O jurista considera o cenário ainda muito indefinido. Apesar de bem avaliado atualmente nas pesquisas, o ex-presidente Lula (PT) deve se desgastar com o debate quando vierem à tona temas como Lava Jato, Mensalão e Petrolão. "Indiscutivelmente o Petrolão e o Mensalão serão objetos da campanha de seus adversários. E ele (Lula) está em seu melhor momento, mas no momento em que o debate se der, vai ser muito difícil explicar Petrolão, Mensalão”, afirma. “Mas é um candidato extremamente forte e fortalecido pela figura de Geraldo Alckmin”, garante.
A decisão de Geraldo Alckmin (PSDB) se lançar a vice na candidatura de Lula foi questionada. "É uma figura que sempre defendeu valores de família, de ética na política, aliás foi um grande governador de São Paulo. Não se pode falar nada de um homem que durante três governos, em que exerceu o poder, não teve qualquer ato de corrupção, de concussão, enfim, é um homem que saiu com a sua imagem preservada, o que não aconteceu com o ex-presidente Lula”, analisa. “Gostaria ainda de compreender o porquê de Geraldo Alckmin concorrer como vice de Lula, quando ele teria a governança de São Paulo absolutamente garantida”.
Bolsonaro
“Ele vive seu pior momento, mas durante a campanha ele pode melhorar. Porque o governo não foi mal, ele que não teve a liturgia do cargo, ele criou inimizades inúteis, gratuitas”, afirmou sobre o presidente Jair Bolsonaro (PL), que, segundo o jurista, poderia ter evitado desgastes, caso se preservasse mais, falasse menos. "Mas não considero que seja um candidato fora. Acho que são os dois candidatos com mais possibilidades de ir para o segundo turno”, acrescenta.
Acredita que João Doria (PSDB) possa crescer, apesar de estar "lá embaixo", um candidato que não pode ser desconsiderado. Gandra acredita que o juiz Sérgio Moro (Podemos) possa ser a "terceira via". "Pode ser que num determinado momento, Moro se transforme na terceira via. Todos aqueles que não querem o PT, devem se atrelar à bandeira anticorrupção a ser lançada pelo coordenador da Operação Lava Jato", afirma. "Acredito que esteja tudo em aberto: Lula bem nas pesquisas, Bolsonaro no seu pior momento, Moro e Doria ainda podem crescer”. Sobre Ciro Gomes, Ives diz ter a sensação de que tem um eleitorado elástico, e dos que estão aí é o que tem menos chance de subir para um segundo turno". “Mas política é como nuvens, pode ser que ela mude de formato”, frisou.
“Ativismo judicial”
Quanto à atuação do Supremo Tribunal Federal (STF), o jurista Ives Gandra foi enfático em afirmar a existência de mobilização política nas decisões. "Gosto de todos os ministros, são competentes juristas, mas não tenho estado de acordo com o ativismo judicial claríssimo da Suprema Corte em todo o ano passado. Interferia no Executivo, no Legislativo e evidentemente é uma tendência”, analisou o jurista. Há uma nítida preferência pelo presidente Lula, segundo ele, pois, foram sete os ministros indicados pelo governo do PT.
“Como eu acredito muito na honestidade dos ministros, assim como nas suas competências, eu espero que eles interfiram pouco, mas a impressão que eu tenho é de que se houver alguma inferência, ela será no sentido de restringir críticas ao (ex-presidente) Lula, principalmente críticas em relação à corrupção, a grande bandeira do Sérgio Moro”, disse. “No Tribunal Superior Eleitoral, mesmo com a possibilidade do ativismo judicial e da preferência à candidatura de Lula dos sete ministros indicados pelo PT, a interferência não será muito grande”, aposta Ives Gandra, chamando a atenção para a possiblidade de exacerbação do debate político eleitoral.
Liberdade
“Uma democracia vive em função da liberdade de expressão”, afirma o jurista Ives Gandra Martins, com a experiência de ter comentado constitucionalmente sobre liberdade de expressão. O jurista apoia seu argumento no artigo 220 da Constituição Brasileira: “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição”.
“A minha grande crítica aos meus amigos, aos grandes mestres da Suprema Corte é de que eles estão cerceando, estão mostrando como crime, ao ponto do Supremo, soltando narcotraficante que fogem em seguida e prendendo deputados que são invioláveis na sua manifestação, por mais transloucada que seja”, defende. Ele cita ainda o artigo 53, que versa sobre o direito à manifestação e de opinião de parlamentares. “Os deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”.
No contexto do tema debatido, Ives Gandra lembrou do processo democrático. Ele critica a linha de percepção do Supremo. "Para eles, a democracia é definida por eles, não é pela Constituição, não pelo povo e pelos 140 milhões de eleitores, é o que eles pensam de democracia. E a liberdade de expressão é o que mais caracteriza a existência de um regime democrático. Quando você pode dizer isso, não pode dizer aquilo, a democracia corre risco”, asseverou. Por fim, Ives lembrou do resultado de uma pesquisa aplicada pelo jornal 'Folha de S. Paulo" há uns dois meses, onde foi perguntado se o Poder Judiciário estava colocando em risco a democracia.
Segundo o jurista, “63% do povo brasileiro dizia que o Supremo Tribunal Federal (o Poder Judiciário) punha em risco a democracia, 2/3 da população. A liberdade de expressão é o que temos de mais sagrado para garantir a democracia”. “Neste ponto, com todo o respeito e admiração que tenho com pelos ministros da Suprema Corte, mas a minha divergência é total, é absoluta. Eles têm interferido com viés. Por exemplo: há fake news maior que o presidente Lula dizer que há uma democracia na Venezuela? Na Nicarágua em Cuba? Todos nós sabemos que não é democracia. Isso não se ataca. Agora se fizer um ataque ao pensamento do Supremo, isso é um ataque.”
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