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Pará tem 210 mães custodiadas em prisão domiciliar com monitoramento

O tema ganhou destaque, recentemente, após o ministro Gilmar Mendes, STF, determinar que o Conselho Nacional de Justiça realize mutirões para reavaliar a situação de mães de crianças menores de 12 anos que ainda estão em prisão preventiva

O Liberal
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O estado do Pará conta, atualmente, com 210 mães custodiadas cumprindo prisão domiciliar com monitoramento eletrônico. Segundo a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap), essa medida integra o Plano Estadual de Atenção às Mulheres Privadas de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional, que busca assegurar condições para que mães possam exercer a maternidade fora do ambiente carcerário, quando autorizado pelo Poder Judiciário. Além disso, o estado abriga cinco grávidas e três lactantes em unidades prisionais: em Ananindeua, há duas grávidas e duas lactantes; em Marabá, uma grávida e uma lactante; em Santarém, uma grávida; e em Vitória do Xingu, uma grávida.

O tema da prisão domiciliar ganhou destaque, recentemente, após o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinar que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) realize mutirões nos presídios brasileiros. O objetivo da ação é revisar casos de mulheres encarceradas que são mães de crianças menores de 12 anos, permitindo a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar quando possível, conforme garantido pela legislação.

A Secretaria de Estado de Administração Penitenciária assegura que, no Pará, para além do monitoramento eletrônico, o plano estadual também garante direitos como o afastamento do ambiente prisional para mães e filhos(as) sempre que possível. Nos casos em que a convivência extramuros não pode ser viabilizada, é assegurado o direito à visita de filhos menores.

Além disso, a Secretaria mantém a Unidade Materno Infantil (UMI), que oferece convivência integral para internas que são mães de crianças com até dois anos de idade, conforme estabelece a Portaria nº 498/2021.

Decisão sobre prisão domiciliar é do Judiciário, explica diretora da Seap

Embora o Pará já conte com 210 mães custodiadas em prisão domiciliar com monitoramento, a definição de quem é beneficiada com essa medida não cabe à Seap. Segundo Michelle Holanda, diretora de Assistência Biopsicossocial (DAB) da secretaria, todo o processo de concessão é conduzido pelo Judiciário, com base em informações fornecidas pela secretaria e outros órgãos.

“Essas definições de quem vai ser beneficiada com a prisão domiciliar não é pela secretaria. É feito um pedido, via Defensoria Pública ou advogados, para o Judiciário, que vê a manifestação do Ministério Público, para a gente executar”, esclareceu Michelle Holanda.

image Michelle Holanda, diretora de Assistência Biopsicossocial (DAB) da Seap, explica que a decisão sobre a prisão domiciliar é do Judiciário. A Seap apenas cumpre. (Foto: Wagner Santana/ O Liberal)

Ela explicou que, para cada caso, o juizado solicita à Seap informações detalhadas sobre as condições das mulheres custodiadas. “O juizado nos pergunta quais são as condições das mães que estão aqui. Se tem crianças de até 12 anos, se elas são responsáveis por pessoas com deficiência. Nós municiamos o Judiciário, o Ministério Público, a Defensoria Pública do perfil das mulheres que entram nas nossas unidades e eles fazem a definição, a decisão de quem será beneficiada ou não”, afirmou.

De acordo com Michelle, o atendimento às custodiadas envolve uma rede de assistência integrada. “A gente tem os atendimentos da Defensoria Pública. Eles vêm até o nosso espaço e fazem a orientação para as mulheres que estão presas. Nós temos também uma diretoria de execução criminal, que faz o acompanhamento de como está a questão judicial, para que a gente não fique sem o conhecimento de que aquela mãe pode ser beneficiada”, detalhou.

A diretora também destacou o papel das equipes técnicas no levantamento do perfil das custodiadas. “A questão de como acontece, de como está o vínculo familiar, se realmente elas estão dentro desse perfil, é feita pelos técnicos das nossas unidades. Nós temos assistentes sociais e psicólogos que fazem esse acompanhamento. A gente emite um relatório e comunica à Defensoria Pública”, disse Michelle Holanda.

No momento da chegada de uma nova custodiada, já são tomadas providências para avaliar possíveis necessidades envolvendo filhos menores. “Quando elas passam pela delegacia e chegam aqui, logo na entrada, a gente já tem essa conversa com elas. Se tem filhos pequenos, quando tem filho que está amamentando e nós vemos que não tem familiar para cuidar, nós buscamos a criança e informamos o Juizado da Infância e da Juventude. Informamos também o juizado da qual a pessoa está com referência. A criança vem para cá ou então elas vêm grávidas”, explicou.

Prisão domiciliar é pensada na proteção das crianças, defende advogada criminalista

A advogada criminalista Luana Leal, mestra em Direitos Fundamentais, avalia que o interesse primordial da prisão domiciliar é proteger crianças que dependem do cuidado materno. Ela pontua também que a determinação não é nova. “No ano de 2018, o Supremo Tribunal Federal julgou um Habeas Corpus coletivo para que fosse reanalisada a privação da liberdade de mulheres que tivessem filhos menores de 12 anos, que estivessem sob seus cuidados”, relembrou.

image Luana Leal, advogada criminalista, avalia que a prisão domiciliar serve para proteger as crianças. (Foto: Wagner Santana/ O Liberal)

“Imagine uma mãe com três filhos que venha a ser presa. Se ela não tiver uma rede de apoio, os filhos podem ser espalhados em casas de parentes, entregues a abrigos, e muitas outras consequências. Tudo isso impacta no desenvolvimento dessas crianças, que detêm uma proteção estatal e social muito importantes”, declarou Luana.

A advogada criminalista avalia ainda que a prisão domiciliar “não é uma forma de impunidade” e que a privação de liberdade continua, mas com o objetivo de resguardar os cuidados às crianças ou outros dependentes.

E, para garantir o cumprimento da prisão domiciliar, são aplicadas medidas cautelares diversas, de acordo com o entendimento judicial. “Essas medidas podem ser o uso de monitoramento eletrônico, a proibição de sair da sua residência à noite, o comparecimento perante os fóruns para justificar as suas atividades de trabalho ou de estudo, proibição de contato com determinadas pessoas e de praticar determinadas condutas”, explicou a advogada.

Luana apontou que a determinação do ministro Gilmar Mendes para a realização de mutirões nos presídios é uma resposta à resistência de alguns tribunais em adotar a conversão de prisão preventiva em prisão domiciliar. “Estão querendo verificar quais são as mulheres que estão nessa situação para que seja reanalisado caso a caso, e a possibilidade de substituir a prisão preventiva pela prisão domiciliar”, afirmou.

A advogada destacou ainda a necessidade de avaliar as causas do encarceramento feminino, como a superpopulação prisional e as barreiras no acesso a benefícios legais, além de fazer análises estatísticas mais detalhadas. “A determinação da lei e de tratados internacionais, como as Regras de Bangkok, que o Brasil se comprometeu a respeitar, muitas vezes não são feitas. Precisamos identificar em quais pontos o estado brasileiro precisa implementar mais políticas públicas”, comentou.

Apesar dos benefícios sociais, Luana Leal acredita que a medida não pode ser considerada uma forma de ressocialização. “Essa medida busca, principalmente, proteger aquela criança que precisa dos cuidados daquela mulher. Por si só, isso não traz a questão da ressocialização, porque muitas vezes nós estamos diante de um problema social, como dificuldade de ingresso no mercado de trabalho e baixa escolaridade", defendeu.

Luana Leal destaca que a prisão domiciliar, além de proteger crianças e adolescentes, também serve como parâmetro para avaliar a conduta das beneficiadas. “Caso haja reiteração delitiva ou agravamento da situação, ela pode não ter mais direito a esse benefício”, concluiu a advogada criminalista.

Custodiada sonha com prisão domiciliar para recomeçar a vida

Aos 31 anos, Andreza de Azevedo vive há um ano no Centro de Reeducação Feminino (CRF), em Ananindeua, compartilhando sua rotina na unidade com o filho de 1 ano e 2 meses. Atualmente, no regime semiaberto, sonha com a possibilidade de prisão domiciliar, apesar de já ter enfrentado uma negativa.

“Eu fiquei foragida numa licença e acabei voltando para pagar o resto da medida. Eu fiquei cinco anos e nove meses no regime fechado, quando eu recebi a condenação. Quando eu peguei o meu regime semiaberto, eu saí na primeira licença e não voltei mais. Eu fiquei evadida por quase quatro anos. Eu voltei e o juiz concedeu o castigo de seis meses para mim e estou aguardando. Já foi negado um pedido de prisão domiciliar e eu regredi para o semiaberto. Mas ainda não tive autorização do juiz para ter as licenças”, contou Andreza.

Sobre a experiência de viver com o filho na unidade prisional, Andreza descreve os desafios enfrentados no dia a dia. “É um pouco difícil, mesmo a gente tendo alguns recursos e atendimentos. Já é difícil para nós adultos estarmos em um ambiente aprisionado, imagine com um filho, com uma criança, que tudo tem um limite. Não pode sair. A criança vai crescendo e não é como se a gente estivesse na rua. Que a gente leva no momento em que a gente quer numa consulta. A gente tem que esperar. A gente tem o atendimento, mas temos que esperar”, detalhou.

Apesar das dificuldades, Andreza reconhece a importância do convívio com o filho, mesmo atrás das grades. “Eu acho muito importante essa oportunidade para as mães, porque antes a gente não tinha um ambiente assim para a gente ficar durante a gravidez e estar com a criança, principalmente eu que não tenho quem fique com ele lá fora. Os meus outros três filhos estão com meu irmão. É muito importante essa oportunidade que nós temos de estar com nosso bebê na barriga e, depois, poder ficar até dois anos. Por uma parte é difícil, por tudo o que já expliquei, mas é uma grande oportunidade ter esse afeto e esse convívio. É importante para nós estarmos juntos”, avaliou.

Com esperança em um futuro diferente, ela reflete sobre o que significaria recomeçar fora do sistema prisional. “Seria difícil por uma parte, porque um recomeço é difícil para todo mundo, principalmente para a gente que vem daquela vida bem bagunçada. Mas eu creio que não só para mim, mas para qualquer uma, seria uma maravilha a gente poder recomeçar, mesmo que fosse com pouco, mas recomeçar com honestidade, para que eu não venha mais voltar para esse lugar e fazer o meu filho passar por isso e fazer os outros passarem pelo o que eles estão passando [lá fora]”, reconheceu.

Andreza também compartilha a dor de explicar sua situação aos filhos. “Como eu estava evadida, eu sempre falava para os meus outros filhos: ‘Olha, meus filhos, uma hora a mamãe vai ter que voltar para aquele lugar [a prisão]’. Lá na frente, quando esse que está aqui comigo estiver grande, eu pretendo falar a verdade para ele e não esconder. Isso vai ser bom para que ele venha trilhar caminhos bons. Eu vou ter uma conversa aberta com ele e dizer que eu errei várias vezes, que eu tive os irmãos dele e continuei errando. Vou falar que nós passamos por um lugar que muitas vezes foi difícil, mas foi um aprendizado. Anteriormente, eu já tinha passado por esse lugar, mas não foi uma experiência tão dolorosa como agora, de ver o meu filho atrás das grades comigo. Às vezes, a gente sai para fazer vacinação, ele vê outras coisas, fica curioso. Isso dói”, revelou Andreza.

Por fim, ela revela o impacto que a evasão teve em sua relação com os outros filhos e sua identidade como mãe. “Isso eu almejo não é porque entrei aqui, é desde quando estava evadida. Nas escolas, não podia falar o meu nome. Tinha outra pessoa que ia. Eu sempre ficava me escondendo. As crianças não têm Bolsa-Escola, porque eu nunca pude resolver. Eu nunca pude ir na escola dos meus filhos, me apresentar como mãe, porque eu tinha medo", comentou.

Perfil de mulheres no Sistema Prisional do Pará

1. Mães em prisão domiciliar
• 210 mães custodiadas cumprem prisão domiciliar com monitoramento eletrônico.

2. Gestantes e lactantes em unidades prisionais
Atualmente, há 5 grávidas e 3 lactantes vivendo em unidades prisionais no estado do Pará. A distribuição por município é a seguinte:
• Ananindeua: 2 grávidas e 2 lactantes
• Marabá: 1 grávida e 1 lactante
• Santarém: 1 grávida
• Vitória do Xingu: 1 grávida

Fonte: Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap)

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