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MPT pede R$ 5 mi em indenização para líderes de seita acusada de violar direitos humanos no Pará

As investigações apontam tortura, trabalho análogo ao escravo entre as violações cometidas dentro da Comunidade São Lucas, nos municípios de Baião e Tucuruí

O Liberal
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Investigada desde 2020 pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), a seita religiosa conhecida pelo nome Comunidade de São Lucas é alvo de mais uma ação. O MPT entrou com pedido de indenização, no valor de R$ 5 milhões, contra nove líderes do grupo por danos morais coletivos. A organização atua nos municípios de Baião e Tucuruí, no Pará, e é acusada de diversas violações de direitos humanos, incluindo trabalho análogo ao escravo e tortura.

Em entrevista ao O Liberal, a procuradora do MPT, Tathiane Menezes, explica que o órgão entrou com duas ações: o pedido de indenização e o de regularização de conduta da liderança, que mantém membros da comunidade em situação de trabalho análoga à escravidão. Tathiane comenta que a situação da Comunidade São Lucas é peculiar, em comparação a outros casos de trabalho análogo ao escravo:

"Em 2022, houve um trabalho conjunto do MPT do MPF e, hoje, cinco líderes dessa seita estão presos, mas, no âmbito trabalhista, a dificuldade foi maior porque, em outros casos de trabalho escravo, o normal é fazer o resgate das vítimas, mas, nesse caso, as vítimas sofreram lavagem cerebral e isso foi um entrave, muitas delas nasceram e cresceram ali", detalha a procuradora.

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O trabalho em conjunto ao qual se refere a procuradora foi no ano de 2022, quando cerca de 50 vítimas foram resgatadas, no mês de julho. À época, o Ministério Público Federal (MPF), à frente da esfera criminal do caso, informou que o órgão denunciou cinco pessoas ligadas à Comunidade São Lucas pelos crimes de submissão a trabalho escravo e tortura, tendo como agravante o fato de terem sido cometidos contra crianças ou adolescentes e a formação de associação criminosa para o cometimento da prática.

Em nota enviada à redação, o MPF diz que, atualmente, há inquérito da Polícia Federal que tramita sob sigilo, "portanto, não podemos fornecer informações sobre a investigação em andamento. Há também uma ação penal não sigilosa que o MPF ajuizou contra cinco pessoas da comunidade e que resultou em condenação pela Justiça Federal no Pará, em março do ano passado. Os condenados recorreram contra a sentença e agora o recurso está sendo analisado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília/DF".

Tathiane Menezes informa que, atualmente, o MPT tenta localizar novos líderes da comunidade, depois que os cinco foram presos. "Em 2022, a gente identificou que cerca de 100 pessoas integravam a comunidade, entre adultos e crianças. Acredito que esse número se mantenha", diz Tathiane.

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O que é e como funciona a Comunidade São Lucas

A Comunidade São Lucas surgiu como uma comunidade religiosa, fundada pelo líder identificado como 'pastor Ailton', em 1997. Relatos de vítimas que conseguiram fugir e foram resgatadas, que já prestaram depoimento ao MPT, dão conta de que a proposta inicial da comunidade era criar uma sociedade em que todos vivessem de bens comuns.

"Mas, com o passar do tempo, o pastor viu a possibilidade de lucrar com uma religião que ele criou e começou a cadastrar os membros da seita em programas sociais, retendo os cartões e ficando com dinheiro para ele. Muitas vezes, as pessoas nem sabiam e as que sabiam achavam que era normal. Depois, ele passou a utilizar essas pessoas como mão-de-obra tanto em movelaria quanto em uma malharia que criaram em Tucuruí. O lucro do que ele vendia era todo para ele", relata a procuradora Tathiane Menezes.

Segundo a procuradora do MPT, a investigação teve início após uma denúncia envolvendo um bar chamado “Mesa de Bar”, em Baião, controlado pelos líderes da comunidade, no qual os funcionários trabalhavam em regime análogo à escravidão. Depois, a investigação conseguiu desdobrar uma séria de violações a direitos humanos, como relata Tathiane:

"No final de 2021, o pastor Ailton morreu e cinco integrantes da comunidade passaram a ter a liderança do local e eles mantiveram a mesma dinâmica. Os líderes tinham propriedades com bens que só eles usufruíam. Havia tortura - tanto de adultos como de crianças, trabalho infantil (crianças de 5 anos que tinha que carregar toras de madeira, por exemplo). Qualquer tipo de desobediência havia punição com porretes. Eles obrigavam até crianças a baterem em crianças. Os pais não podiam fazer nada. Eles raspavam os cabelos, principalmente das mulheres, mas também de homens. E constatamos abuso sexual infantil: meninas no início da adolescência eram iniciadas na vida sexual, engravidavam, tinham filho e eram inscritas em benefícios sociais, cujo lucro ia para os líderes. Os homens podiam ter mais de uma mulher a depender da obediência deles aos líderes, e se fossem desobedientes, eles tinham essas mulheres e os filhos retirados dele - tornados filhos de outro homem mais obediente".

Em funcionamento há 27 anos, muitas pessoas já nasceram dentro da comunidade. Os membros vivem de forma totalmente isolada de outros grupos sociais e, conforme relata a procuradora, uma das vítimas que conseguiu fugir, de 22 anos de idade, nunca tinha visto dinheiro antes de sair da Comunidade.

"Entre 2017 e 2022, de alguma forma eles conseguiram uma espécie de autorização para criação de uma escola lá dentro, mas a gente descobriu que não existe escola nenhuma, a não ser o ensino da seita que faz a lavagem cerebral. A gente pegou vários livros escolares enviados pelo Ministério da Educação. Todos estavam lacrados", acrescenta a procuradora.

Apesar dos processos na Justiça, a Comunidade São Lucas ainda continua funcionando. "Não tem nem como convencê-las a saírem de lá", diz a procuradora do MPT. Quanto à escrevera criminal, o MPF apenas informou que o inquérito segue em sigilo na Polícia Federal.

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