Maniçoba: iguaria anuncia a chegada do Círio em Belém

Preparo desse prato é um convite a se conhecer a culinária e a cultura do Pará nos dias da festa maior dos paraenses

Eduardo Rocha

Setembro traduz bastante a expectativa dos paraenses com a chegada de uma nova edição do Círio de Nossa Senhora de Nazaré, que este acontecerá em 8 de outubro. Afinal, falta menos de mês para a festa maior de quem vive no Pará, no coração da Amazônia. Essa motivação pode ser constatada de várias formas na capital paraense, mas, desde já, o preparo da maniçoba revela a alegria de quem está em festa. Até porque, neste período do ano, a culinária paraense ganha maior realce em todos os sentidos e, inclusive, pode ser conferida, desde já, pelos visitantes de Belém. Por isso, não falta motivação e movimentação na casa da dona Luzia Santos, 67 anos, no Conjunto Satélite, no bairro do Coqueiro.

Mãe de um casal de filhos, ela prepara maniçoba para o almoço do Círio há mais de 30 anos e nunca perde a disposição. Ao contrário, preparar a iguaria acaba revigorando o seu entusiasmo pela festa maior dos paraenses. "Quem visita Belém no período do Círio, pode conferir o que a culinária paraense tem de bom, sem dúvida, e a maniçoba é uma das atrações, pelo sabor que tem, pelo que representa para o paraense. Aqui em casa, ela está sempre no almoço do Círio", destaca.

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Preparar maniçoba é uma atividade constante na vida de Luiza. Ela acabou de preparar um prato para a festa de 80 anos de idade de uma pessoa. Mas, quando chega bem pertinho do Círio, o prato ganha todo um sabor especial. "Eu e outras pessoas da família preparamos o almoço do Círio. No domingo do Círio, vamos assistir à passagem da procissão na avenida Presidente Vargas e voltaremos, depois, para casa, para almoçar. Fazer a maniçoba para o Círio me emociona, faço com amor, com devoção à Nossa Senhora", conta. 

image Luzia Santos: amor e devoção no preparo da maniçoba do Círio (Fotos: Igor Mota / O Liberal)

E para esse almoço de família já está agendada a maniçoba, risoto de peru, pato com jambu e tucupi, peru assado, farofa e outros quitutes. Até porque, na casa de dona Luzia, o almoço do Círio reúne mais de 30 pessoas. São 10Kg de maniçoba para a reunião no segundo domingo de outubro.

Para garantir a maniçoba do Círio, dona Luzia trabalha com atenção por cinco dias, prazo de preparo da iguaria. "É um trabalho que requer atenção e, então, como nós gostamos do que fazemos, se torna um prazer, motivo de contentamento", destaca Luzia Santos. O gosto de preparar a maniçoba faz parte da árvore genealógica dessa senhora que aprendeu tudo com a mãe e outros familiares. "Fica cheirando a casa toda", conta a cozinheira sobre o preparo do prato típico.

image Maniçoba sendo preparada em Belém traduz a expectativa dos paraenses pela chegada do Círio 2023 (Foto: Igor Mota / O Liberal)

Cara do Círio

Esse contentamento também é conferido e compartilhado por quem conhece a fundo a culinária paraense, como a chef Daniela Martins, filha do saudoso chef Paulo Martins, um pioneiro na pesquisa sobre as potencialidades dos ingredientes da cozinha do Pará. "É a cara do Círio", afirma Daniela, referindo-se a essa iguaria. Ela pontua que a maniçoba deve ser, sim, considerada como uma das principais iguarias da cozinha paraense. "Por ser uma prato de preparo demorado com sabor único e marcante e que se faz algumas vezes no ano, ela se torna mais atrativa", diz. "O turista normalmente tem receio de provar por causa da sua aparência, porém  quando prova, se surpreender com o sabor e logo compara a uma feijoada", acrescenta.

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Daniela ressalta que não existe uma certeza histórica sobre a origem da maniçoba, "pois temos muito poucos registros de nossa história culinária, uns dizem que é de origem indígena, outros falam da africana". "Eu acredito que a receita que comemos hoje seja uma miscigenação de culturas, como vários de nossos pratos. A maniva, que são as folhas da mandioca moída, de origem amazônica e logo indígena, e as carnes embutidas de origem portuguesa, mas considerando que na África tem pratos bem parecidos com ela, também pode ter sofrido influencia africana", assinala a chef. 

Uma característica da maniçoba, que expressa um traço marcante da culinária  amazônida, é o caldo. Daniela prepara o prato diversas vezes ao ano, tendo sempre maniçoba congelada para venda. "Porém, no Círio, a procura é muito maior", diz. Na cidade de Belém, desde já se intensifica o preparo e a comercialização desse produto nas feiras livres, supermercados, restaurantes e em casas.

image Preparativos para o Círio mexem com os paraenses, o que inclui as feiras livres, como o Complexo do Ver-o-Peso (Foto: Igor Mota / Arquivo O Liberal)

Como relembra Daniela, o pai dela, o chef Paulo Martins, costumava comentar que a maniçoba "ainda tinha que ser descoberta como tanto outros ingredientes e pratos da nossa culinária". "Ainda temos o hábito de pouco inovar com a maniçoba, porém nós dias de hoje já existem criações muito boas usando esse prato", acrescenta a chef Daniela Martins. Como decisivo para o sabor da iguaria, ela destaca uma boa maniva, tempo de cozimento e gordura, não em excesso, mas na medida certa.

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Veja como fazer maniçoba:

- No primeiro dia - Colocar dez quilos de maniva pré-cozida para cozinhar por cinco dias, sendo duas horas/dia. Colocar duas cabeças de alho socadas e cebola, folhas de louro e dois quilos de banha de porco na maniva.

- No quarto dia - Coloca de molho em uma panela com água por 24 horas: três quilos de charque; três quilos de costela de porco salgada; dois quilos de chouriço Paraná; um quilo e meio de pé de porco; um quilo e meio de orelha de porco e um quilo e meio de rabo de porco.

- No quinto dia - Escorrer a água com os ingredientes que são colocados em uma panela. À parte, preparar dois quilos de bucho que se lava com limão e escalda, cortado em cubinhos. Em seguida, refogar com cebola e alho os ingredientes e o bucho. Quando refogado tudo, colocar todos os ingredientes na maniva para ferver por quatro horas. Então, está pronta a maniçoba.

Fonte: cozinheira Luzia Santos

 

 

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