Lixo Zero: práticas mais sustentáveis podem minimizar impactos ambientais, avalia especialista
A poluição gerada por resíduos mal descartados está contribuindo para eventos naturais extremos e prejudicando o equilíbrio ecológico global
O descarte irregular de lixo tem causado impactos ambientais severos, afetando desde a biodiversidade até fenômenos climáticos e oceanográficos. Um exemplo recente é o acúmulo atípico de algas na praia do Atalaia, em Salinópolis (PA), o que levantou questionamentos sobre a relação entre resíduos descartados de forma incorreta e eventos naturais graves. Neste domingo, 30, é comemorado o Dia Internacional do Lixo Zero, data que busca conscientizar sobre a importância de reduzir a quantidade de resíduos gerados, promovendo a reutilização, a reciclagem e o consumo consciente. A iniciativa busca sensibilizar a população sobre o impacto do lixo no meio ambiente e incentivar práticas mais sustentáveis em nossa rotina. Em Belém, o Movimento República de Emaús tem promovido iniciativas de reciclagem e educação ambiental que têm gerado impactos significativos na comunidade.
O que aconteceu em Salinas?
No início de março, moradores e turistas de Salinópolis notaram uma grande quantidade de algas na praia do Atalaia. O professor José Eduardo Martinelli, do curso de Oceanografia da Universidade Federal do Pará (UFPA), explica que essas algas pertencem ao gênero Sargassum, conhecido por formar extensos tapetes flutuantes no oceano. Segundo Martinelli, a proliferação anormal desse tipo de alga pode estar associada ao aumento da poluição marinha e às mudanças climáticas. “A presença de microplásticos nos oceanos, provenientes do descarte inadequado de resíduos, também é transportado por essas algas flutuantes. Esses plásticos servem como base para fixação de organismos e podem eventualmente transportar espécies exóticas”, explica o pesquisador.
Além do impacto visual, o excesso de algas pode gerar mau cheiro, dificultar a entrada de luz na água e comprometer o ecossistema marinho local.
O lixo e seus impactos no meio ambiente
O pesquisador José Eduardo Martinelli relata que a poluição dos oceanos, causada principalmente por plásticos descartáveis, tem efeitos diretos na fauna e na flora marinha. “Os microplásticos, fragmentos resultantes da degradação de materiais plásticos, são encontrados em diversas partes da Amazônia e do litoral paraense”, alerta.
Ele também conta que esses resíduos podem ser ingeridos por animais marinhos, causando intoxicação e até morte. Além disso, estudos indicam que os microplásticos podem chegar ao ser humano por meio do consumo de peixes e frutos do mar contaminados. “Essas partículas podem absorver metais pesados e compostos tóxicos presentes na água, aumentando os riscos para a saúde”, acrescenta o professor.
Outro fator agravante, segundo o pesquisador, é a liberação de nutrientes provenientes do esgoto e da decomposição de lixo, que pode estimular o crescimento excessivo de algas. Esse fenômeno, conhecido como eutrofização, leva à diminuição do oxigênio na água, prejudicando a biodiversidade aquática.
A poluição plástica nas praias da Amazônia
A região costeira da Amazônia enfrenta um grave problema ambiental: a poluição por resíduos sólidos, especialmente plásticos, que afetam suas praias e ecossistemas marinhos. O Observatório da Costa Amazônica (OCA), ligado à Universidade Federal do Pará (UFPA), realiza estudos sobre a presença desses resíduos em várias praias da região, como Salinópolis, Algodoal, Mosqueiro e Outeiro.
De acordo com a professora e pesquisadora Sury Monteiro, a situação é alarmante e exige ações imediatas. “Realizamos pesquisas em várias praias da região, e o plástico é o resíduo mais presente. Encontramos plásticos em diversas cores, como branco, azul, transparente, amarelo, preto, entre outras, e em diferentes composições, como PET, poliestireno e polipropileno. Eles aparecem em várias formas, como garrafas, palitos, cotonetes, sacolas, PVC, isopor, redes de pesca, cordas, embalagens de alimentos, fraudes e até preservativos. A diversidade é alarmante”, relata a professora Sury.
A pesquisa do OCA também destaca o impacto das atividades turísticas e pesqueiras nas praias da Amazônia. “Realizamos ações periódicas de quantificação e limpeza das praias, e essas ações mostram que as atividades turísticas são as principais responsáveis pela quantidade de lixo nas praias, especialmente durante feriados e períodos de férias, quando o volume de resíduos plásticos aumenta consideravelmente. Em Algodoal, por exemplo, também observamos muitos petrechos de pesca, como redes, boias e cordas, o que indica que a pesca também contribui para a geração de resíduos”, explica a pesquisadora.
A identificação e compreensão dos resíduos encontrados nas praias é essencial para propor mudanças na legislação e nas atitudes da sociedade. “Somente com a conscientização da população sobre os efeitos do lixo nos oceanos e nas praias podemos ter soluções reais. Precisamos transmitir essas informações de forma clara e urgente, alertando a sociedade sobre os danos que o plástico está causando e propondo alternativas para a solução do problema. Afinal, todos fazem parte do problema e todos devem ser responsáveis pela solução”, afirma Sury Monteiro.
Como reduzir o problema?
Para minimizar os impactos da poluição, é de extrema importância ações sustentáveis e políticas públicas voltadas à gestão de resíduos sólidos. O conceito de “Lixo Zero” incentiva a redução do consumo de plásticos descartáveis, a separação correta dos resíduos e o reaproveitamento de materiais recicláveis.
No Pará, organizações como o Movimento República de Emaús tem promovido iniciativas de reciclagem e educação ambiental. José Maria Dias, coordenador de sustentabilidade de capacitação de resíduos do Emaús, conta que o projeto destaca a importância do envolvimento da população no descarte consciente. “Cada pessoa pode fazer sua parte evitando plásticos descartáveis, separando os resíduos corretamente e destinando materiais recicláveis para cooperativas. São pequenas atitudes que fazem uma grande diferença”, afirma.
O Emaús desenvolve ações ambientais que têm gerado impactos significativos na comunidade. José Maria Dias detalhou um dos principais projetos da organização, que envolve a coleta e reutilização de materiais. “Nós realizamos uma grande coleta, em alguns bairros de Belém, para coletar objetos úteis que uma segunda família possa utilizar.”
A reciclagem de materiais é uma das principais frentes do Emaús, especialmente o trabalho com papel e livros. Além disso, a compostagem desempenha um papel importante no projeto. O coordenador de sustentabilidade do movimento explica que o processo de compostagem é fundamental para a horta orgânica do local, onde materiais que seriam descartados são reaproveitados. “Todo material vindo de alimentos que seriam jogados no lixo são direcionados para a composteira e ela vai produzir o material que vai ser reutilizado na horta.”
O impacto ambiental do trabalho do Emaús vai além da reciclagem, contribuindo para a conscientização de toda a sociedade de Belém sobre o reaproveitamento de materiais. José Maria também conta sobre a importância dessas ações para o meio ambiente. “A importância desse processo junto à sociedade de Belém é que esse material, que antes estava encostado, não estava sendo reutilizado, poderia ir para o meio ambiente e entupir canais, o sistema de drenagem.”
O trabalho do Emaús ajuda a garantir que objetos que poderiam ser descartados de forma inadequada ganhem uma nova vida, beneficiando outras famílias. “As pessoas doam para o movimento de Emaús, e o movimento de Emaús processa esses materiais, dando uma segunda vida e trazendo-os novamente para o convívio dentro de uma casa”, destaca Seu José Maria Dias.
Além disso, o Emaús tem se dedicado a ensinar sobre a importância do descarte correto e a reciclagem, com foco na educação ambiental. “Dentro dos projetos sociais, temos a educação ambiental, para que as crianças e adolescentes tenham essa percepção do respeito com o meio ambiente,” relata o coordenador.
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