Exclusivo: casamentos homoafetivos crescem 1.400% em 10 anos de permissão no Pará
Cartórios de Registro Civil do estado têm média de 131 matrimônios entre pessoas do mesmo sexo desde 2013. Casais femininos representam 51,5% do total e masculinos 48,5%.
Desde que os casamentos homoafetivos foram legalmente equiparados aos casamentos heterossexuais, o Pará apresentou um aumento de 1.400% do número de uniões entre casais do mesmo sexo. O levantamento é da Associação dos Notários e Registradores do Estado do Pará (Anoreg-PA), com base em informações da Central de Informações do Registro Civil (CRC Nacional), base de dados nacional de nascimentos, casamentos e óbitos administrada pela Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil). Neste domingo (14), as decisões que garantiram o direito civil ao matrimônio completam 10 anos.
Nesse período, os cartórios de registro civil paraenses registraram uma média anual de 131 celebrações. Do total, 51,6% delas são entre casais femininos, com 740 uniões, sendo 135 em 2022. Os demais 48,4% foram entre casais masculinos, com 695 matrimônios, sendo 211 cerimônias no ano passado.
Esses números só foram possíveis quando, em 2013, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) publicou a Resolução nº 175 e padronizou a atuação dos 7.757 cartórios do Brasil. Antes, os cartórios eram obrigados a solicitar autorização judicial para celebrar esses matrimônios e muitas vezes, por falta de uma lei, esses pedidos eram negados. Dois anos antes da da resolução do CNJ, o Supremo Tribunal Federal (STF) já havia equiparado as uniões estáveis homoafetivas às heteroafetivas.
No Pará, até abril de 2023, foram registrados 1.435 casamentos homoafetivos. Em 2013, primeiro ano de vigência da autorização nacional, foram 25 celebrações, seguidas por 58 em 2014; 87 em 2015; 76 em 2016; 100 em 2017; 201 em 2018; e 159 em 2019. Em 2020, primeiro ano da pandemia, foram 119 celebrações. Em 2021, os matrimônios voltaram a crescer, com 140 uniões, atingindo o recorde em 2022, com 346, ano com o maior crescimento, com aumento de 147%. Até o mês passado foram 124 casamentos.
“O casamento entre pessoas do mesmo sexo é mais uma conquista que é celebrada nos Cartórios de Registro Civil no Pará. É aqui que nascem os direitos do cidadão brasileiro, com seu primeiro registro e com a certidão de nascimento, e, também é aqui que nasce esta nova família brasileira, formada por pessoas que se amam e que tem seu direito de convivência assegurado com o casamento civil”, destaca Conrrado Rezende, Oficial de Registro civil e também diretor da Anoreg-PA.
LEIA MAIS
Como dar entrada no processo de casamento homoafetivo civil
Para realizar o casamento civil é necessário que os noivos, acompanhados de duas testemunhas (maiores de 18 anos e com seus documentos de identificação), compareçam ao Cartório de Registro Civil da região de residências de um dos nubentes para dar entrada na habilitação do casamento.
Todos devem estar de posse da certidão de nascimento (se solteiros), de casamento com averbação do divórcio (para os divorciados), de casamento averbado ou de óbito do cônjuge (para os viúvos), além de documento de identidade e comprovante de residência. O valor do casamento é tabelado em cada estado, podendo variar de acordo com a escolha do local de celebração pelos noivos - em diligência ou na sede do cartório.
Com 10 anos de relacionamento, casal de Belém viu a lei ser discutida e colocada em vigor
Há um década, o analista de dados Lenno Ávila, de 42 anos, e o Relações Públicas Kleber Dümerval Ávila, de 46 anos, decidiram começar uma história juntos. O mesmo tempo em que o casamento homoafetivo foi permitido. Eles lembram de ter visto a legislação ser discutida, alterada e então finalmente, em dezembro de 2019 — ano em que outros 158 casais homoafetivos se uniram no Pará —, conseguiram legitimar a união e conquistar todos os direitos civis relacionados ao matrimônio. Uma história que nem imaginavam que iriam viver quando apenas trocaram olhares em um barzinho.
A decisão do casamento veio num momento em que Kleber e Lenno estavam numa fase de muitas conquistas e celebrações. Tinham acabado de comprar um apartamento e os planos de legitimar e dividir a união eram cada vez mais frequentes. Com a possibilidade legal, não havia mais por que adiar o passo. "Ficamos um pouco receosos no começo por conta da família e o momento político muito conservador do país. Mas graças a Deus, todo mundo participou. Foi único! Bem pouco antes da pandemia. Foi um momento em que nos sentimos abraçados", diz Kleber.
Lenno diz que desde que se casaram, sentiram um novo nível de bem-estar e liberdade. Se sentiram legitimados como cidadãos. Por isso, diz que se um casal LGBTQIA+ se sentir seguro, quiser e estar feliz com a ideia, não há por que não casar. "Damos o nosso exemplo que estamos bem, estamos felizes com nossa decisão. Inclusive, é uma forma de honrar tantos outros casais que não foram legitimados antes da lei. Todos têm seu tempo e alguns ainda têm receio por conta dos preconceitos da sociedade, mas é bom buscar seus direitos. Quando vemos um casal homoafetivo numa novela, num filme, não é só para se mostrar. Isso é legitimar que é um casal como qualquer outro", complementou.
"É triste que o Congresso não tenha trabalhado de forma mais sensível nessa questão que foi definida pelo STF e pelo CNJ. Enquanto as pessoas trouxerem crenças privativas de religiões para o legislativo, será difícil abarcar o direito coletivo, como deve ser uma democracia. O casamento é uma afirmação. Se têm certeza, casem. Quanto mais a sociedade tiver contato com essas células familiares, menos esse medo absurdo vai prevalecer e menos violência, e menos discurso de ódio num dos países que mais mata LGBTs no mundo", conclui Kleber observando que o casamento homoafetivo é muito mais do que um capricho.
Palavras-chave
COMPARTILHE ESSA NOTÍCIA