Aumento das queimadas leva ruralistas e governo a defenderem maior punição à prática ilegal

Ministério do Meio Ambiente e governo federal já analisam propostas que aumentam a pena para esses crimes

Ricardo Brito e Lisandra Paraguassu/Reuters
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O grande aumento das queimadas no país, principalmente nos meses de agosto e início de setembro, fez com que o Congresso e o governo federal passassem a defender um aumento das punições a quem faz isso ilegalmente, com os dois Poderes avaliando propostas e iniciativas para inibir a prática.

Enquanto o governo ainda estuda ideias para aumento das punições, mesmo com dúvidas sobre sua eficácia, parlamentares pretendem pautar em breve propostas que aumentem a pena para incêndios criminosos em áreas de florestas ou rurais para seis a 10 anos de prisão.

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O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, deputado Pedro Lupion (PP-PR), afirma que o governo nem sequer precisa apresentar uma nova proposta porque deputados da bancada ruralista já tem três projetos prontos contra as queimadas criminosas, inclusive tornando em alguns casos o delito inafiançável.

"Os maiores prejudicados com as queimadas são os produtores rurais", argumentou ele, ao chamar de "sandice" quem acha que o agronegócio se beneficia disso. Ele citou o prejuízo com a queima de lavouras de cana-de-açúcar em São Paulo, estimado em 1 bilhão de reais, com a vegetação demorando cinco anos para ser recuperada.

Lupion disse ainda que a bancada tentou na quinta-feira votar um requerimento de urgência de alguma das propostas, mas não conseguiram. Na próxima sessão, vão tentar novamente -- esse expediente da urgência permite que a proposta vá diretamente para votação em plenário, pulando a fase das comissões.

De maneira geral, as duas primeiras propostas aumentam a pena para incêndio em florestas e vegetações de dois a quatro anos de prisão para de seis a dez anos; a terceira prevê um aumento de pena em até um terço se ela se espalhar por áreas urbanas ou rurais de mais um município.

No governo, a própria ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, já afirmou que são analisadas propostas não apenas de aumento da pena, mas que incluem ainda o confisco de terras de proprietários considerados culpados pelas queimadas ilegais.

O secretário extraordinário de Controle do Desmatamento do Ministério do Meio Ambiente, André Lima, defende que as propostas são importantes por ter um efeito dissuasório na conduta. Contudo, o maior problema é se comprovar o nexo causal do crime -- a ligação entre o que foi feito e o resultado. 

A pena, mesmo elevada, não poderia ser aplicada se não houver uma prova material da autoria pelo do proprietário ou posseiro que colocou fogo acidental ou proposital, ou então um flagrante, que é muito difícil nesses casos.

"Mesmo que o próprio proprietário ou posseiro coloque fogo, acidental ou proposital, se não provarmos a autoria, o que é muito difícil se não há flagrante, a pena de 10 anos não vai ser aplicada", disse Lima. 

Segundo o Mapbiomas, a área queimada somente em agosto no país é equivalente a de todo o Estado da Paraíba ou da Costa Rica.

Uma das preocupações é, segundo o Ministério do Meio Ambiente, que os incêndios vêm substituindo o desmatamento puro e simples, mais visado e com punições criminais, administrativas e multas muito mais altas.

Cerceados pela fiscalização, desmatadores estariam colocando fogo em terras para "limpar o terreno" depois de tirar as madeiras nobres. Queimado, o solo é ocupado por gado antes de ser vendido ilegalmente.

Ao contrário do desmatamento, em que o dono da terra ou o usuário é facilmente identificável e beneficiado diretamente, o que permite a responsabilização facilmente, as queimadas tem uma investigação muito mais complicada. Se um proprietário põe fogo fora do seu próprio terreno, mesmo sabendo que a queimada pode invadir sua área, é difícil de apontá-lo como responsável.

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Lima explica que, para além do aumento das penas, o governo trabalha para regulamentar o Plano de Manejo Integrado do Fogo, legislação aprovada este ano que pretende prevenir e combater incêndios em áreas sensíveis, mas também regular como as queimas protetivas podem ser usadas e a responsabilidade dos proprietários de terra.

Uma das medidas é prever que donos de terra tomem medidas mínimas, como manter faixas de terra sem vegetação que funcionam como barreiras naturais para impedir a propagação de incêndios, os chamados aceros, o controle do excesso de vegetação seca, um mínimo de equipamentos contra incêndio, o treinamento de funcionários. A previsão é que proprietários rurais precisem ter, como empresas urbanas, o mínimo de condições para combater incêndios.

"Então, o maior problema em relação aos incêndios é a responsabilidade do proprietário ou posseiro em adotar medidas preventivas, preparatórias e estar em condição de fazer o primeiro combate em sua propriedade para evitar que se alastre e se torne um grande incêndio", disse.

"Quem quer vender crédito de carbono florestal ou ter serviço ambiental da floresta contabilizado em sua cadeia produtiva tem que assumir também a responsabilidade em protegê-la, não basta exigir que o Estado o faça", continuou.

Cobranças

Em outra frente, o governo federal -- que tem sido cobrado pelo Supremo Tribunal Federal a ampliar suas ações após o fogo se alastrar pelo Pantanal e pela Amazônia -- estuda uma forma de aumentar as punições para quem causar incêndios ilegais em áreas de floresta disseram à Reuters fontes que acompanham o tema, mas a discussão levanta dúvidas ainda sobre a eficácia das medidas.

As discussões ainda são muito incipientes, relataram as fontes, e há dúvidas sobre o que poderia ser mais eficaz para de fato tentar reduzir esse tipo de crime, que vem crescendo no país

"Ainda está em estudo, não tem nada substancial ou concreto ainda. As áreas técnicas ainda vão se reunir ainda para uma discussão preliminar", disse uma fonte do Planalto.

Vários setores do governo, incluindo a Polícia Federal -- que tem mais de 50 inquéritos abertos para investigar queimadas propositais --, querem punições mais duras.

O diretor de Meio Ambiente e Amazônia da PF, Humberto Freire, defendeu que os crimes ambientais precisam receber o tratamento mais adequado e moderno em razão da gravidade do problema. Segundo ele, "infelizmente" grupos criminosos perceberam a situação, alta lucratividade e baixas penas para esses delitos.

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"A gente precisa ter uma legislação moderna, não só penal, mas processual também, porque quando se eleva a punição se acaba dando ferramentas processuais de investigação mais incisivas", disse ele, ao exemplificar que hoje em dia dificilmente um juiz concede uma prisão preventiva numa investigação desse tipo por uma pena baixa.

Para o secretário Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Mario Sarrubo, contudo, uma eventual elevação de pena, por si só, não vai trazer resultados significativos. "O mais importante para os incêndios é reestruturar nossos sistemas de fiscalização", afirmou ele, para quem pedagogicamente não importa o tamanho da multa, mas sim que ela seja aplicada.

Sarrubo afirmou que seria mais eficiente, por exemplo, proibir acesso para quem faz queimadas criminosas a financiamentos estatais ou até mesmo o confisco de terras.

No entanto, as medidas precisam passar pelo Congresso, e uma das fontes avalia que a Legislatura atual tem dificuldades de aprovar medidas que possam penalizar produtores rurais, o que poderia dificultar a aprovação dessas medidas que poderiam ter um impacto mais forte que o próprio aumento da pena. 

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