Pesquisadora da UFPA cataloga mais de 100 espécies de plantas alimentícias não convencionais

As "Pancs" são vegetais consumidos diariamente, com partes que geralmente são descartadas, como folhas, talos e sementes

Gabriel da Mota | Especial para O Liberal
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Você sabe o que são PANCs? As “plantas (ou partes) alimentícias não convencionais” são vegetais consumidos diariamente, mas com pedaços que geralmente são descartados, como folhas de cenoura, talos de couve e sementes de abóbora. As PANCs foram tema da dissertação de mestrado da pesquisadora Larissa Ferreira, docente do curso de Nutrição da Universidade Federal do Pará (UFPA), que listou mais de 100 espécies, sendo a maioria da Amazônia.

O termo PANCs foi utilizado pela primeira vez no ano de 2007, pelo biólogo Valdely Kinupp, em sua tese de doutorado. O conceito é amplo, mas a pesquisadora esclarece que, resumidamente, essas plantas não costumam circular pelos sistemas usuais de produção. Elas podem ser nativas, exóticas, silvestres, espontâneas e cultivadas, desde que tenham aproveitamento para a alimentação humana.

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“Esse conceito também vai referir aqueles estágios de uma planta ou fruta que são considerados não convencionais, por exemplo, antes de amadurecer. A biomassa da banana verde está em alta, e o mamão verde, em muitas culturas, é consumido em pratos salgados como substituto da batatinha ou da batata inglesa”, explica a pesquisadora.

Saberes amazônicos à mesa

O objetivo do estudo de Larissa foi verificar o conhecimento e a utilização de plantas alimentícias não convencionais por estudantes de Ciências Biológicas da região amazônica. O resultado reuniu 112 espécies de PANCs, das quais a maioria é nativa da Amazônia e possui alto percentual de consumo (71%). Mandioca, taioba, jambu, camapu e pupunha são algumas das plantas mais relatadas pelos entrevistados.

image Larissa Ferreira é docente do curso de Nutrição da Universidade Federal do Pará (Foto: Marcelo Salazar)

“Na Amazônia, a gente ainda tem essa cultura alimentar bem forte, eu acho que isso contribuiu muito para esse resultado da pesquisa”, ressalta. A docente cita a maniçoba, prato típico do almoço do Círio de Nazaré, em Belém, como exemplo da inserção das PANCs na culinária paraense: o aproveitamento da folha da mandioca, transformada em maniva no preparo do prato, “é uma parte também considerada não convencional porque muitas pessoas não conhecem ou não consomem”, analisa.

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Saberes femininos à mesa

Outro dado resultante da pesquisa é a predominância de mulheres como a maior fonte de conhecimento em relação às PANCs. “Nos processos de divisão do trabalho e do papel social, desde cedo, as mulheres possuem maior ligação com os recursos vegetais destinados aos cuidados da família”, explica a pesquisadora. Uma vez que o preparo dos alimentos é comumente atribuído a elas, consequentemente, as mulheres assumem papel crucial na detenção desse tipo de conhecimento.

PANCs e segurança alimentar

No final do ano passado, o Brasil retornou ao Mapa da Fome da Organização das Nações Unidas (ONU). O estudo mostrou que mais da metade da população brasileira convive com algum grau de insegurança alimentar, e que 33 milhões de pessoas não têm o que comer. Nesse cenário, as PANCs assumem grande importância: o cozimento adequado de raízes, caules, folhas, flores, frutos e sementes pode ser uma saída para saciar a fome.

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“Hoje, a primeira recomendação do Guia Alimentar para a população brasileira é consumir alimentos in natura ou minimamente processados. E as PANCs corroboram com tudo isso, porque se tratam de alimentos ricos em fibras, que têm também uma quantidade significativa de minerais, de vitaminas, que são importantíssimas para a manutenção da nossa saúde”, analisa a professora da UFPA.

Na visão de Larissa Ferreira, a disseminação de fast foods e de multinacionais do ramo alimentício contribuem para uma globalização da dieta, desincentivando o consumo de plantas alimentícias não convencionais. Além disso, a preservação do conhecimento tradicional sobre as PANCs na região amazônica é fundamental, na opinião da pesquisadora, visando à segurança alimentar e ao aproveitamento da diversidade de alimentos nutritivos disponíveis aqui.

“Acho muito importante que outras pessoas tenham acesso aos alimentos que a gente tem aqui, mas as políticas públicas e todas as estratégias devem assegurar que os amazônidas, em primeiro lugar, tenham seus alimentos tradicionais no seu prato, para que depois sim a gente pense formas, né, de levá-los para outros lugares”, finaliza.

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