Regulamentação de aplicativos pode beneficiar até 30 mil trabalhadores do Pará

Motoristas de plataformas de entrega e de corridas defendem direito a férias, décimo terceiro, seguro, aposentadoria e outros benefícios

Elisa Vaz
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Criar regras para o trabalho por meio de aplicativos é um dos objetivos da regulamentação proposta pelo governo federal. Uma das promessas de campanha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e medida defendida pelo atual ministro do Trabalho, Luiz Marinho, essa regulamentação seria uma forma de garantir mais segurança aos trabalhadores e formalizar a atuação profissional de motoristas e entregadores, por exemplo. O Sindicato de Motoristas de Aplicativo do Estado do Pará (Sindtapp) estima que exista um total de 30 mil motoristas de aplicativo no território paraense, sendo 25 mil em carros e 5 mil em motocicletas.

Para o advogado trabalhista Carlos Eduardo Rodrigues, as maiores “polêmicas” em torno do assunto são as questões trabalhistas e tributárias, considerando que há conflitos quanto à vinculação empregatícia dos trabalhadores com as empresas e os motoristas não pagam tributos pelo serviço prestado nas plataformas e também não contribuem com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) para uma futura aposentadoria.

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“Como a legislação não traz essas informações, temos que buscar o melhor caminho tendo em vista essa sombra, então, o Congresso Nacional tem que legislar isso o quanto antes, para resguardar direitos e deveres dos motoristas de aplicativos e dos clientes, que temos um Código de Defesa do Consumidor (CDC) que nos ampara nessa prestação de serviço. O próprio Ministério Público tem legitimidade para propor alguma ação civil pública contra uma empresa que oferece esse serviço, existem ferramentas judiciais”, opina.

Justamente para pacificar conflitos, o especialista acredita que a regulamentação tem “extrema importância”, até porque traria segurança jurídica. Diz ainda que, dependendo da forma como o motorista ou entregador trabalha para as empresas, pode ser caracterizado um vínculo trabalhista.

Algumas demandas que podem ser debatidas, segundo Carlos Eduardo Rodrigues, são a necessidade de recolhimento para o INSS, com contribuições previdenciárias; adicional de periculosidade para motoristas de motocicletas e bicicletas, por estarem vulneráveis no trânsito; entre outras. “A mudança visa a trazer segurança jurídica tanto para os trabalhadores como para as empresas que gerem essas plataformas”, pontua.

A reportagem enviou uma solicitação ao governo federal, por meio do Ministério do Trabalho, para saber como estão as discussões sobre o tema e qual a previsão para que elas sejam concluídas e as propostas apresentadas. O órgão respondeu que o Grupo de Trabalho (GT) tem prazo de 90 dias para apresentar propostas. "No momento, está em fase de discussões", informou.

Também foram solicitados posicionamentos de empresas de aplicativo - transporte e alimentação e bebidas -, mas duas delas informaram que a entidade responsável pelo comentário seria a Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec). Por sua vez, a entidade enviou nota dizendo que suas empresas associadas "apoiam uma regulação do trabalho em plataformas de mobilidade urbana e entregas que busque melhorar a proteção social dos profissionais e garantir a segurança jurídica da atividade".

Segundo a Amobitec, as associadas têm se colocado à disposição do governo para colaborar nas discussões e defendem que o debate tenha como premissas a "flexibilidade e a autonomia que caracterizam as novas relações de trabalho intermediadas por aplicativos, apoiadas pela maioria dos trabalhadores, conforme apontado em diversas pesquisas". A entidade ainda garante que, desde abril de 2022, realiza contribuições à discussão.

Trabalhadores

Segundo o presidente do Sindtapp, Euclides Magno, os trabalhadores de plataformas vivem sem autonomia e direitos básicos da legislação trabalhista. “Entendemos que a CLT [Consolidação das Leis do Trabalho] não é completa, mas é um ponto de partida para a discussão com as empresas. Queremos ter autonomia, hoje não somos autônomos como dizem. Nós não precificamos nosso trabalho, é a empresa que precifica, a empresa que manda o trajeto, que manda o cliente, não temos autonomia nenhuma”, rebate. 

"Também não temos direito a férias, seguro, décimo terceiro, aposentadoria, não temos absolutamente nada. Tudo isso tem que ser discutido para termos o mínimo de condições para exercer a profissão”, ressalta o representante da categoria.

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Na opinião de Euclides, caso seja levado em consideração o lado do trabalhador, a regulamentação será positiva. O único lado ruim, na opinião dele, seria se houvesse alguma limitação de horários de trabalho. Nesta quinta-feira (9), haverá uma reunião com representantes de centrais sindicais do Pará e de outros locais com o ministro Luiz Marinho, adianta o presidente do Sindtapp, para discutir essa legislação.

O porta-voz acredita que a discussão segue o que aconteceu no mundo todo e não vai afastar empresas do país - pelo contrário, pode motivar o poder público a criar aplicativos nesse sentido, já que eles atendem dificuldades do transporte público, na opinião de Euclides.

Dificuldades

Motorista de aplicativo há cerca de sete anos, Fernando Ribeiro, de 51, tem nos meios de transporte desse tipo sua principal fonte de renda. Ele começa a “rodar”, como chama, pontualmente às 6h da manhã, e para de trabalhar por volta das 18h, com apenas um intervalo para o almoço, que às vezes faz na rua mesmo. O motorista questiona o fato de os trabalhadores de aplicativo não terem vínculo de emprego com as empresas mesmo passando tanto tempo de seu dia trabalhando.

“Nós não temos horário para pegar nem para largar, mas, de certa forma, desenvolvemos umas 12 horas de trabalho direto por dia, depois disso o próprio aplicativo bloqueia a conta para o motorista descansar. É todo dia a mesma coisa, tem gente que não tem folga e a maioria trabalha como a primeira opção de renda nessas plataformas. Muitas vezes temos pessoas em casa que são consideradas vinculadas se forem mais de três vezes por semana, então por que os motoristas não têm vínculo se trabalham todos os dias, às vezes 12 horas por dia?”, questiona.

Fernando defende, além das demandas já mencionadas por Euclides, um auxílio para ajudar a compensar o desgaste dos automóveis e uma isenção de imposto para a troca de veículo. Além disso, quer que a regulamentação inclua seguro ou plano de saúde, com direito a licença médica.

“Quando adoecemos, às vezes por questões que adquirimos trabalhando, não temos respaldo nenhum. Se precisar fazer uma cirurgia ou sofrer um acidente e não puder trabalhar, vou ficar em casa sem retaguarda, sem ganhar dinheiro. A partir do momento em que o governo vem com uma proposta de regulamentação, vai trazer benefícios para o trabalhador e para a empresa. Acho que é positivo e vai ser retribuído”, argumenta o trabalhador.

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