Inteligência artificial é promissora na área da saúde, mas ainda há entraves na aplicação

Se usadas no dia a dia, ferramentas podem contribuir para a melhoria da qualidade de vida, diagnósticos precoces e tratamentos mais precisos

Elisa Vaz

O uso das novas tecnologias, especialmente da inteligência artificial (IA), traz benefícios a diversos setores. Na área da saúde, tem impulsionado técnicas que contribuem para a melhoria da qualidade de vida, diagnósticos precoces e tratamentos mais precisos, embora ainda esteja muito no campo da pesquisa, dados os desafios que precisam ser superados.

A aplicação das novas tecnologias na rotina médica ainda precisa avançar, na opinião do professor Givago Souza, docente vinculado ao Instituto de Ciências Biológicas (ICBIO), da Universidade do Pará (UFPA). Em países menos desenvolvidos, que ainda não têm uma saúde de ponta, como é o caso do Brasil, a realidade é um pouco mais atrasada, mas há potencial “enorme” de crescimento, segundo ele.

“Por exemplo, tivemos um trabalho na universidade, com uma aluna de doutorado, em que foi utilizada a inteligência artificial para fazer uma avaliação de imagens do fundo do olho e saber se aquela imagem era de homem ou mulher. Isso poderia ajudar no diagnóstico de algumas doenças, mas ainda está no campo da pesquisa. Infelizmente, não temos isso na rotina dos hospitais de referência e muito menos na atenção primária. Ainda existem alguns passos para que isso se torne uma realidade”, avalia.

Desafios

Para a completa aplicação dessas ferramentas tecnológicas na rotina da saúde, afirma o professor, é preciso fazer o esforço de criar um grande banco de dados. Os algoritmos de inteligência artificial, de acordo com ele, são ferramentas que funcionam a partir de um banco de dados - só assim elas conseguem dizer o que é saudável ou não, por exemplo, para diagnosticar doenças.

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“Essa quantidade de informações requer um investimento grande para termos onde guardar esses dados, e até para colher esses dados. Não é só uma pessoa, é um esforço muito grande”, comenta. Um segundo problema na aplicação de algoritmos de IA na área pública, a exemplo do Sistema Único de Saúde (SUS), para Givago, é o acesso à internet e à conectividade. Até porque, segundo o professor, em muitos casos se faz necessário o armazenamento em nuvem, o que requer conexão.

“Nem sempre, mas, em algumas situações, o processamento é tão pesado que precisaria de um computador muito potente ou de internet, isso também dificulta. Não é em todos os locais, especialmente em um país mais pobre, que há internet disponível com essa qualidade de tráfego de informação. Esses ainda são alguns entraves que a gente pode enfrentar para colocar essas ferramentas na rotina dos profissionais da área da saúde”, pontua.

Ainda, outra barreira é a capacitação dos trabalhadores para executar com precisão as novas tecnologias, como destaca o docente da UFPA. Para ele, há uma necessidade de educação para o uso de ferramentas de IA. “Vai ser muito importante, também, ter instrução para a interpretação desses dados, porque são informações completamente diferentes de dados que essas pessoas estão acostumadas na rotina clínica, então acho que vai haver a necessidade de uma educação continuada desses profissionais da área da saúde”.

Benefícios

As tecnologias já fazem parte do dia a dia da população. Por exemplo, boa parte das pessoas, hoje, utiliza os chamados smartwatches, ou relógios inteligentes, responsáveis por monitorar comportamentos ao longo do dia, como o número de passos dados, distância percorrida, o alcance de elevação, calorias que foram perdidas, duração de exercícios, nível de batimento cardíaco, tempo de sono e até ovulação, no caso de mulheres.

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Hoje, tudo isso é utilizado, em geral, para um controle individual da saúde. Mas Givago acredita que, no futuro, esses dados possam entrar em um banco de informações e, possivelmente, ser utilizados para monitorar e prevenir doenças na sociedade. Embora nem todas essas ferramentas sejam de inteligência artificial, há boa parte que usa a tecnologia e, por isso, passa pelos mesmos desafios de outras ferramentas.

“Quem trabalha na área da saúde já percebeu que pode usar esses sensores que estão nos relógios e celulares para extrair informações. Já criaram aplicativos para smartwatch e smartphones que podem dar informações importantes sobre a saúde das pessoas. Então, uma das coisas que a gente trabalha aqui na universidade é para criar, desenvolver protocolos e avaliar, por exemplo, a qualidade do movimento, o equilíbrio de pessoas e outros tipos de ferramentas para medir a frequência cardíaca e fazer pequenos questionários para encontrar algum risco à saúde”, conta.

Givago lembra que essas inteligências não substituem exames nos hospitais, mas ajudam a identificar uma possível necessidade de ajuda médica. Isso, para o professor, é “o futuro”, especialmente no que se refere à atenção primária. Uma vantagem, além disso, é que se torna mais barato dessa forma, já que o celular é algo que faz parte da rotina das pessoas e os relógios inteligentes têm se popularizado. “Mais importante que o uso da inteligência artificial para identificar problemas é a qualidade dos sensores que existem no celular, no relógio, que já permitem fazer ótimas descrições de algumas funções de saúde das pessoas”.

Ética

Quando se fala em inteligência artificial, também surgem debates sobre a ética em relação ao uso de dados. Givago cita que o Brasil já tem um plano para implementar a chamada “Saúde Gigital”, ou seja, para usar ferramentas tecnológicas na saúde. Porém, é preciso separar o atendimento na rede pública da privada, segundo ele. No primeiro cenário, segundo ele, há a necessidade de se ter equipamentos portáteis onde os dados fiquem armazenados para todos os profissionais terem acesso.

“Em relação à privacidade dos dados, é uma outra coisa que precisa ser discutida, porque uma vez que o dado está disponível para outros setores, vamos ter que proteger a identidade das pessoas que foram avaliadas, inclusive colocando regras para o uso desses dados que estarão na rede. Esses dados vão ser usados para quê? Para estudos epidemiológicos, para monitoramento do Estado, provavelmente não devem ser usados para expor uma condição de saúde de alguém. Então, isso é uma coisa que, sem dúvida, vai ser o debate do século XXI. O que fazer com esses dados e como proteger as pessoas de qualquer tipo de exposição?”, questiona o docente e pesquisador.

Pesquisa

Quanto às atividades desenvolvidas na UFPA, há vários grupos que trabalham com diferentes formas de aplicar inteligência artificial. Segundo Givago, vários grupos de diversas faculdades e laboratórios têm estudado a temática. “Aqui, somos um grupo da área da saúde que aplica ferramentas de inteligência artificial para diferentes fins, especialmente para ajudar no diagnóstico de doenças. Um dos nossos trabalhos é avaliar o tremor de mãos de pessoas com a doença de Parkinson”, relata.

Em suma, a incorporação da inteligência artificial na área da saúde promete revolucionar diagnósticos, tratamentos e monitoramento da saúde. Apesar dos obstáculos, as pesquisas em instituições demonstram um caminho promissor na aplicação dessa tecnologia para o benefício da sociedade.

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