Presidente eleito da OAB reforça compromisso com reestruturação e modernização da entidade
Em entrevista ao Grupo Liberal, Sávio Barreto afirma que as prioridades iniciais da gestão são para projetos que não exigem alocação de grandes recursos financeiros
O novo presidente da Ordem dos Advogados do Pará (OAB-PA), Sávio Barreto, de 46 anos, compartilhou, durante uma entrevista exclusiva ao Grupo Liberal, as perspectivas da nova gestão da entidade para o próximo ano. Eleito para comandar a seccional no triênio 2025-2027, o advogado Sávio Barreto ressaltou que a prioridade será concretizar as propostas que não exigem alocação de recursos financeiros, neste primeiro momento, destacou a reestruturação da entidade e a transparência financeira nos projetos.
Durante a conversa, o advogado destacou a importância da atuação da OAB e das comissões temáticas em prol da sociedade, especialmente sobre temas mais complexos e que são comuns a todos os cidadãos. O presidente eleito também reforçou o compromisso com a modernização da entidade e defendeu a postura conciliadora para a construção de pontes entre diferentes setores da sociedade. Sávio Barreto também frisou o compromisso em fazer com que a OAB/PA seja mais presente perante a sociedade e a advocacia, além de se posicionar sobre o que for de interesse público. Confira a entrevista completa.
Como está sendo a transição entre a atual gestão e a sua? Está havendo colaboração entre as partes?
Existe um provimento do Conselho Federal, de número 185, que estabelece regras relativas à transição de gestões no âmbito da OAB. Nós fomos acionados já com
base nesse provimento pela atual gestão, que nos convidou para uma reunião, eu tive uma reunião com o presidente atual, Eduardo Biriba, e com outras pessoas que compõem a diretoria e a gestão. A gente está em uma etapa inicial de conversas com o objetivo de repassar as rotinas internas de cada setor para as pessoas que vão ocupar a futura gestão. Eu estou sendo acompanhado nessa transição pela minha diretoria e por alguns conselheiros que estão, aos poucos, compreendendo essas rotinas para que a gente possa, a partir do dia 1º de janeiro, iniciar a gestão e funcionando plenamente em todos os setores da OAB, a partir daí, executar o nosso projeto, que apresentamos durante as eleições e que envolvem muitas mudanças estruturais dentro do sistema.
Dentre as suas propostas, o senhor já mencionou: reestruturação completa do sistema da OAB PÁ; maior transparência nas contas; combate à morosidade judicial; acolhimento aos advogados em início de carreira; inclusão digital dos advogados mais experientes; presença e fortalecimento das comarcas no interior. Quais dessas metas o senhor pretende alcançar já no primeiro ano de gestão? Como isso será possível?
Aquilo que a gente tem certeza que pode ser executado imediatamente é o que não depende de recursos financeiros. Porque tudo que depende de recurso a gente vai ter que aguardar o relatório final, que será apresentado pela gestão, para que a gente possa saber efetivamente o que a gente pode executar o que tem disponível para a gente fazer em termos de obras, melhoramentos, mudança de sistemas, tudo que envolve ônus financeiro para OAB, o que não depende disso, a gente está pronto para executar imediatamente. Se você me perguntar sobre o portal da transparência, já existe tecnologia para isso, é preciso apenas a iniciativa. Claro que isso vai demorar, talvez um mês, dois ou três meses, para você, efetivamente, implantar um sistema que vai poder se comunicar com o portal e transmitir todas as informações financeiras detalhadas sobre as contas da OAB. Isso é o que pode ser executado de imediato, as mudanças estruturais que a gente pretende implementar na corregedoria, como distribuição eletrônica de processos; judicialização de todos os processos éticos disciplinares e digitalização deles, para que eles tramitem pela via digital, pode ser feito também imediatamente; assim como a digitalização dos processos internos; de pedidos de estruturação de pessoa jurídica, fornecimento de certidões -- para que o advogado peça isso diretamente pela internet, não havendo mais necessidade de um protocolo físico ---, podemos fazer imediatamente; reestruturar o funcionamento das comissões temáticas, exigindo um projeto para que a gente possa executar imediatamente, fornecendo mais estrutura para com essas comissões possam cumprir o seu papel perante a sociedade civil e a advocacia. A gente vai tentar, no espaço de tempo mais curto possível, dentro daqueles 100 dias de gestão --- que são aqueles dias que você tem que mostrar cara e mostrar porque veio, executar tudo que estiver ao nosso alcance daquilo que não depende de recursos. O que for de obras e melhoramento, a gente vai aguardar esse cenário financeiro, para que a gente possa fazer um planejamento ao longo do ano.
Há algum “modelo” a ser seguido? Sua gestão busca inspiração em algo que já é realizado em alguma outra OAB do Brasil?
Tenho conversado com a diretoria sobre a necessidade de visitarmos algumas seccionais, recolhermos as experiências de sucesso que eles têm e plantar isso na nossa realidade local, já fizemos isso durante a campanha, desde a eleição passada, quando estávamos construindo o plano de gestão. Visitamos algumas seccionais e aprendemos muito sobre a
gestão interna da OAB, grande parte das nossas propostas são fruto dessa experiência que tivemos nessas visitas. Existe um sentimento de intercâmbio muito grande entre as seccionais, quando a gente visita, somos recebidos com todo entusiasmo; os colegas passam todas as rotinas internas; ensinam o que eles erraram; explicam "olha, essa ideia aqui não funciona, por exemplo"; a Caixa de Assistência do Advogado, que é o órgão importantíssimo, que presta serviços para advocacia, planos de compra coletivas, serviços médicos, creche ,administração das salas de coworking, várias experiências que, pra serem executadas com êxito, é importante você visitar onde elas já estão sendo executadas para saber que determinadas ideias não funcionam dentro daquela realidade ou são extremamente onerosas e não têm sustentabilidade econômica. Essas conversas são importantíssimas e a gente quer iniciar por aquelas experiências que a gente tem certeza que vão funcionar porque ela já estão funcionando em outras seccionais, aquelas situações que envolvem ideias novas e riscos maiores, a gente vai ponderar um pouco mais até porque tem muito o que ser feito apenas copiando as experiências boas que outras seccionais têm que a gente ainda não possui.
O senhor também já citou que é preciso aproximar a OAB da sociedade civil, atuando nas questões mais emblemáticas. Quais são, na sua opinião, as demandas sociais mais urgentes atualmente no Pará? E o que a OAB irá fazer em relação a isso?
A OAB possui, atualmente, 90 comissões temáticas, que envolvem questões jurídicas e questões sociais. Você tem, por exemplo, comissão de direito processual civil, que é uma comissão que trata especificamente de uma questão jurídica de direito relacionada a um tema do direito que é o processo civil. Então, você vai estar em uma comissão que vai trabalhar eventos sobre o processo civil, uma comissão que vai se posicionar sobre eventuais alterações de lei, envolvendo o processo civil; uma comissão de natureza jurídica que interessa principalmente advogados. Tem comissões que os temas estão ligadas às questões sociais muito sensíveis; uma comissão de meio ambiente; uma comissão de moradia; uma comissão de igualdade racial; questões jurídicas propriamente ditas e questões sociais que a OAB também tem o dever institucional de atuar, opinar, acompanhar tudo que envolve o tema social da comissão.
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Quando a gente fala em aproximar a OAB da sociedade, o caminho principal para implementar isso é por meio dessas comissões temáticas, e para se fazer isso eu preciso ter dentro dessas comissões pessoas efetivamente comprometidas em trabalhar, e é muito trabalho, para que OAB é consiga atuar, se posicionar, explorar determinadas questões que estão acontecendo no no meio social, e que a gente tem o o dever de estar presente. Citando em casos práticos, em uma reunião com o prefeito Edmilson, fomos atualizados sobre o novo plano diretor do município que envolve toda uma reestruturação da nossa cidade no que se refere à moradia -- um tema importantíssimo que a sociedade civil está desconectada, apesar do trabalho da imprensa que leva essas informações à maioria das pessoas, é um assunto que impacta fortemente a vida de todas as pessoas e de todas as classes econômicas, mas não está sendo acompanhado plenamente pela sociedade civil. O que a OAB tem que fazer? Tem que acompanhar esse futuro projeto de lei, ver se ele está alinhado corretamente, ver se por trás dele não tem um interesse econômica que pode acabar sendo o contrário ao interesse social, porque, muitas vezes, pode acontecer e você direciona uma alteração, uma normatização da cidade e da Constituição Civil na cidade, não para atender a população, mas para atender um determinado interesse político-econômico. Não pode um assunto dessa envergadura estar passando ao arrepio e à revelia da OAB, temos que selecionar o que era de mais importante dentro daquele tema social, estar presente, acompanhando, criticando e propondo uma ação contra uma política pública, concordando ou discordando de um projeto de lei. Claro que a OAB não tem poder, estrutura ou recursos para atuar em todos os problemas sociais e resolvê-los, mas, nos problemas principais, a gente tem de estar atento e ter um certo protagonismo.
O senhor defende uma postura conciliadora, propondo parcerias em vez de críticas ou cobranças às burocracias jurídicas. Mas, pensando de modo mais amplo e na esfera civil, em um cenário de polarização política, como a OAB seccional Pará pode contribuir para construir pontes entre diferentes setores da sociedade?
A postura conciliadora tem que ser a nossa primeira postura, a nossa primeira atitude. Deve ser uma atitude conciliadora, especialmente quando estamos falando de morosidade na justiça. Estamos lidando com um problema estrutural do Poder Judiciário, que não possui recursos humanos e físicos suficientes para dar vazão ao número de processos que existem dentro de sua estrutura.
Portanto, antes de atirar pedras no tribunal, criticar a morosidade ou dizer que a justiça não funciona, você deve chegar junto ao tribunal como instituição. Mostrar dados, informações, comprovar efetivamente. Não é fazer uma reclamação vazia, mas demonstrar concretamente com base em dados e informações que existe de fato um problema a ser resolvido. Você precisa sentar à mesa e buscar um consenso. Existe ou não existe um problema? Não estou nem falando da solução ainda. Existe ou não? Se a resposta for "sim", então é importante que as instituições cheguem, pelo menos, ao convencimento de que o problema existe.
Agora, se o problema existe, precisamos discutir a solução. De que maneira a advocacia pode contribuir para resolvê-lo? Acreditamos que podemos melhorar a morosidade. Quais caminhos seriam possíveis? Existe a possibilidade de adotarmos alguma dessas providências ou existe outra que o tribunal considere mais eficiente? É assim que se faz um diálogo conciliador.
Agora, se você chega junto ao tribunal e o tribunal discorda da existência do problema, ou até concorda com a existência, mas não aceita adotar nenhuma prática para corrigi-lo, aí você precisa tomar outro tipo de providência. Já não é mais uma providência conciliatória. Nesse caso, você deve buscar providências junto ao CNJ, fazer um protesto público, porque isso afeta não só a advocacia, mas toda a sociedade. Não podemos viver em um país onde não se pode recorrer ao Judiciário, ou onde você leva cinco anos para ter uma sentença de primeira instância.
Aqui, mudamos para outra postura, que já não é conciliatória, mas de enfrentamento. Estamos dispostos a seguir o rito institucional, buscar um caminho conciliatório, porque o início da gestão traz um novo perfil de gestão, com outras pessoas. Então, precisamos começar com esse perfil conciliatório, mas com um cronograma para que a situação seja resolvida com uma solução conciliatória. Caso contrário, partimos para o enfrentamento. Muitas vezes, o enfrentamento pode resultar, mais tarde, em uma situação conciliatória interessante.
O senhor também já mencionou que conversou com alguns advogados que deixaram de contribuir com a anuidade da OAB como gesto de protesto, por não se sentirem representados pela entidade. Como a sua gestão planeja recuperar o espírito de representatividade?
Recentemente, tivemos uma reunião com a sua gestão, e um dos temas abordados foi a inadimplência dos advogados com a anuidade da OAB. O atual presidente da OAB me explicou que essa inadimplência estava em torno de 30% e, após a pandemia, chegou a 50%. No ano passado, foi de 54%. Atualmente, é um pouco inferior a 50%, devido às eleições, já que muitos advogados quitam a anuidade para poder votar. A situação ficou um pouco mais favorável, mas a tendência é que, após as eleições, a inadimplência retorne ao limite de 50%, o que compromete o orçamento da OAB.
Existem problemas quanto à recuperação desse crédito. Hoje, o advogado não é mais suspenso do exercício da profissão pelo não pagamento da anuidade. Para cobrar judicialmente a anuidade, é necessário somar pelo menos cinco anuidades. Não posso cobrar judicialmente por duas anuidades, pois uma lei federal impede isso, e a justiça federal tende a extinguir as execuções cujo valor seja inferior a 10 mil reais. Quando você soma cinco anuidades, o valor não atinge os 10 mil reais, o que torna a cobrança judicial cada vez mais inviável. Como, então, trazer o advogado de volta à situação regular perante a OAB?
Eu só vejo um caminho: a OAB efetivamente prestar serviços que induzam o advogado a pagar a anuidade. Esses serviços podem ser oferecidos por meio da Caixa de Assistência da Advocacia, como está sendo feito em outras seccionais. Exemplos incluem uma rede de descontos ou benefícios, onde para ter acesso a eles é necessário estar em dia com a anuidade. O advogado perceberá que é mais vantajoso pagar a anuidade de R$ 800,00 por ano para ter acesso a esses benefícios do que permanecer inadimplente.
A OAB tem um poder muito grande de barganhar vantagens, porque estamos falando de 29 mil advogados aqui no Pará. Esse poder nos permite negociar grandes vantagens econômicas, como compras coletivas de material de escritório ou equipamentos caros para advogados. Podemos reduzir até 30% do custo desses itens por meio de compras coletivas. Além disso, a OAB pode oferecer serviços como creches ou alguma estrutura que acolha um filho menor de idade durante uma audiência. Esses serviços poderiam ser oferecidos de forma subsidiada, já que a OAB, por ser uma entidade sem fins lucrativos, pode fornecer esses benefícios de maneira mais acessível para os advogados. E tudo isso seria oferecido apenas aos advogados em dia com suas contribuições, porque não podemos oferecer benefícios a quem não está ajudando a custear o sistema. Devemos buscar trazer de volta à OAB os advogados inadimplentes.
Qual é a mensagem que o senhor deixa para a advocacia e para a sociedade paraense neste início de gestão?
Minha mensagem é que a OAB será mais presente perante a sociedade e a advocacia. Queremos efetivamente conectar nossa instituição com os problemas sociais. Queremos acompanhar as políticas públicas e nos posicionar sobre tudo que for relevante para a sociedade, mostrando que a advocacia não busca apenas o interesse particular de ganhar dinheiro com o patrocínio de clientes. A advocacia também quer contribuir com seu conhecimento jurídico para uma sociedade melhor. A nossa lei exige isso da advocacia. Não somos uma atividade como as demais profissões liberais, que têm como objetivo exclusivo o lucro. Nossa legislação é muito clara ao estabelecer que a advocacia deve servir ao público. Temos a responsabilidade de garantir o sustento da nossa família, mas também temos o dever legal de lutar por uma sociedade mais justa, democrática, e por leis que diminuam a desigualdade que ainda vivemos. Queremos mostrar que a advocacia, individualmente e coletivamente, por meio dessa instituição tão importante para a sociedade civil, está presente para cumprir esse papel institucional, para além da defesa dos interesses da advocacia, que é o papel de qualquer conselho de classe.
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