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ARTIGO - Amazônia Seca: o bode da vez

Eng. José Maria Mendonça

“Governo libera operação de termelétricas nas áreas atingidas pela seca na Região Norte”. Essa notícia é incoerente, desligada da realidade e publicada como se anunciasse algo inusitado. Primeiramente, porque o sistema nacional é interligado e totalmente integrado. Em segundo lugar, essa prática é comum e tem aumentado a participação das termelétricas a cada ano. A nossa conta mensal de energia reflete essa participação mais significativa das termelétricas, cujo custo da geração é muito superior ao das hidrelétricas, resultando em aumentos anuais acima da inflação na conta de energia paga pela sociedade brasileira.

É importante entender o motivo dessa mudança na base do Sistema Interligado Nacional – SIN, que interconecta todas as usinas geradoras de energia elétrica do Brasil, cuja base precisa ser de uma fonte de energia constante. Pela concepção inicial, a base era e continua sendo hídrica, hidrelétricas com grandes reservatórios que é a forma mais econômica de armazenar energia elétrica. No entanto, nossos órgãos de controle criminalizaram nossos complexos hidrelétricos e dificultam a construção de novos complexos. Quando permitem, obrigam que sejam a fio d’agua (sem ou com pequenos reservatórios), tornando-as intermitentes, assim como as usinas eólicas e fotovoltaicas. Essa decisão equivocada foi tomada por despreparo ou incompetência.

A prova disso são as construções das hidrelétricas de Belo Monte, considerada a terceira ou quarta maior do planeta (localizada no Pará, precisamente no rio Xingu), Jirau e Santo Antônio (ambas em Rondônia, no rio Madeira), que estão entre as cinco maiores do Brasil. Ficam semiparalisadas de agosto a meados de novembro por não terem reservatórios, desperdiçando milhões de megawatts tão importantes para o setor elétrico nacional. A sociedade civil lamenta, mas nada pode fazer.

No entanto, acredito que a motivação da notícia era chamar a atenção para a “seca da região Norte”, o que se traduz em “seca na Amazônia”, algo que não é inédito. Trata-se de um fenômeno complicado, mas natural e cíclico. No século passado, esse fenômeno ocorreu nos anos de 1906, 1916, 1926, 1936, 1958, 1963 e 1997, e neste século ocorreu nos anos de 2005, 2010 e 2023, sempre no período de junho a outubro, raramente se estendendo até novembro. A origem é conhecida e já foi bastante estudada: quando o aquecimento do Atlântico Norte coincide com o fenômeno El Niño, que naturalmente provoca chuvas no Sul e seca na região equatorial da Amazônia. Essa coincidência faz com que os ventos alísios que se deslocam de leste para oeste soprem fracos, são eles os responsáveis pela umidade do Bioma Amazônia. 

Sempre defendo que as informações cheguem à sociedade de forma precisa. Me incomoda a maneira como alguns de nossos dirigentes usam os fatos, principalmente em relação ao clima. Exemplificando, durante o Seminário “Caminhos para Transição Energética Justa no Brasil”, realizado em 11/10/2023, a Dra. Ana Toni, Secretária de Mudança do Clima (MMA), durante a sua fala, não sei se como técnica ou se profetizou, disse: “cada vez mais haverá secas na Amazônia e enchentes no Sul”. Pela importância do seminário, essa declaração deveria ser acompanhada de dados.

Sobre as enchentes do Sul, variam de intensidade devido ao El Niño e são recorrentes. Quanto à seca na Amazônia, é um fenômeno cíclico, e as secas que ocorreram nos anos de 1963 e 1906 foram as maiores; no entanto, a de 1926 foi a mais dramática. A seca de 2023, até o momento não atingiu o nível das secas maiores e da mais dramática.

Entendo que a menção à seca na Amazônia tem como objetivo atrair atenção para um chá das 5 em Paris ou para cumprimentar o Rei Charles, na Inglaterra, visto que a palavra “Amazônia” costuma provocar diversos tipos de delírios em nossos amigos do chamado “primeiro mundo”.

Fazendo uma análise cronológica simples, fica claro que o fenômeno da seca na Amazônia não afetaria o sistema elétrico nacional, desde que as Usinas de Belo Monte, Jirau e Santo Antônio tivessem sido construídas de forma convencional, com reservatórios adequados para suas potências máximas, visando a maior produção possível durante o ano todo. O período de maior fluxo das águas, tanto do rio Xingu quanto do rio Madeira, é de novembro a março, e ambos são afluentes da margem direita do rio Amazonas. A seca da Amazônia, quando ocorre, é de junho a outubro, sendo mais rigorosa nos afluentes da margem esquerda do rio Amazonas. Os dados explicam por si só. 

Encerro este artigo de opinião com a frase: “Os incompetentes sempre arrumam um bode expiatório para jogar a culpa por sua própria incompetência”, cujo autor desconheço. Concluindo, o bode da vez é a seca na Amazônia. 

Eng. José Maria Mendonça Presidente do Centro das Indústrias do Pará (CIP)

E-mail: mendonca@fiepa.org.br

Belém-Pa, 19/out/2023

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