Naufrágio em Cotijuba: processo se assemelha ao incêndio na boate Kiss, diz promotor do MPPA
Promotor Edson Augusto Cardoso de Souza quer que comandante da embarcação também seja julgado por tentativa de homicídio contra os 62 sobreviventes do naufrágio
O naufrágio da lancha Dona Lourdes II, em setembro de 2022, na ilha de Cotijuba, se assemelha ao incêndio da boate Kiss que, registrado no Rio Grande do Sul, deixou 242 mortos e 636 sobreviventes. Quem aponta isso é 2º Promotor de Justiça do Tribunal do Júri, Edson Augusto Cardoso de Souza. E isso ficou mais evidente com a decisão do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) que, na quarta-feira (18), por meio do promotor, ofereceu aditamento à denúncia contra o réu Marcos de Souza Oliveira, comandante daquela embarcação.
E isso ficou mais evidente com a decisão do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) que, na quarta-feira (18), por meio do 2º Promotor de Justiça do Tribunal do Júri, Edson Augusto Cardoso de Souza, ofereceu aditamento à denúncia contra o réu Marcos de Souza Oliveira, comandante daquela embarcação.
Além da acusação por homicídio qualificado (motivo torpe) cometido contra as vítimas mortas, a Promotoria requer que seja também julgado por tentativa de homicídio contra os sobreviventes do naufrágio. O aditamento tem como objetivo propor sanções punitivas proporcionais ao número de vítimas afetadas pela tragédia, "que ceifou 24 vidas e afetou a integridade física e psicológica de 62 sobreviventes".
Levando em conta os fatos apurados nos autos, o promotor de Justiça Edson Augusto requer que sejam contabilizadas individualmente todas as incorrências dos 24 crimes de homicídio qualificado e 62 crimes de tentativa de homicídio, alegando que os sobreviventes passaram por situação de alto risco “devido à irresponsabilidade do réu Marcos de Souza Oliveira”.
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Em entrevista à Redação Integrada, na manhã desta terça-feira (24), o promotor explicou essa linha de atuação do MPPA. “O Ministério Público inicialmente ofereceu uma denúncia contra o Marcos, que estava preso. Considerando que estavam ausentes muitos documentos sobre as pessoas que tinham morrido e o número de passageiros, o Ministério Público requereu diligências”, disse.
“As diligências voltaram agora. Em resumo, o que aconteceu. Aumentou o número de vítimas mortas. E todas as pessoas que estavam no barco, e que sobreviveram, eu as incluí como vítimas em potenciais - vítimas de tentativa de homicídio, porque elas se salvaram, porque nadaram, porque foram socorridas. Em resumo, é um processo que se assemelha muito ao da Boate Kiss. O Boate Kiss, todo mundo que morreu, se tornou vítima. E quem se salvou, no caso, se tornou vítima não fatal”, afirmou.
O aditamento oferecido decorre das diligências empreendidas em autos suplementares de inquérito policial, através de depoimentos e juntada de documentos no decorrer do processo, que originalmente contava apenas com a acusação de homicídio qualificado pelas vítimas mortas.
Ao oferecer a denúncia inicial em outubro de 2022, já constava dos autos que a embarcação operava de forma clandestina, não estando autorizada a oferecer o serviço de transportes de passageiros, bem como os equipamentos de segurança, como os coletes, estavam em desconformidade com as normas em vigência.
Além disso, segundo relatos, o réu não orientou os passageiros como procederem, quando a embarcação estava afundando, pelo contrário, disse não ser preciso apanhar os coletes. E, por fim, o número de passageiros estava sem controle, pois o próprio acusado, perante a autoridade policial, disse não haver lista de passageiros, já tendo o barco parado em vários portos, com seguidos embarques de mais passageiros. A Redação Integrada tenta contato com a defesa do comandante da embarcação.
Incêndio na Boate Kiss
Na madrugada de 27 de janeiro de 2013, um incêndio atingiu a boate Kiss, na cidade gaúcha de Santa Maria, deixando 242 mortos e 636 sobreviventes. E a Justiça remarcou para 26 de fevereiro de 2024 o novo julgamento dos quatro réus envolvidos nesse incêndio.
A decisão veio após a anulação da primeira condenação dos acusados pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), que posteriormente foi confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Advogado diz que acidente foi causado pela maresia
Advogado do dono da lancha, Dorivaldo Belem disse acreditar na absolvição de Marcos de Souza Oliveira. “E, assim, nós vamos enfrentar esse processo na expectativa de que o acidente não foi porque ele não tinha habilitação, o acidente não foi porque o barco era clandestino, o acidente não foi porque tinha excesso de passageiro, não foi porque a rota não era autorizada. Não. O naufrágio foi um caso fortuito. Foi a maresia que quebrou, danificou o sistema de controle do barco e o levou a fundo”, afirmou.
Ainda segundo o advogado, Marcos estava com uma embarcação boa e tinha colete “e tudinho”. “Esse é o grande ponto de discussão do processo que a gente vai enfrentar. E, trazendo por analogia, eu vou lembrar do Titanic, de 1910, uma embarcação das mais seguras, que se dizia até que não afundava", disse.
"Uma equipe de pilotos altamente qualificada, uma rota autorizada com os passageiros dentro do limite da capacidade daquele navio e ele foi para o fundo. Deu de cara lá com iceberg e afundou. Morreram 1 .500 e poucas pessoas. Então, não foi por causa do barco, nem do piloto, nem excesso de passageiro, nem rota. Acidente da natureza que levou esse navio ao fundo. E aí, a gente trazendo para cá, não se pode punir um rapaz desse aí por todos esses crimes, querendo atribuir para ele um acidente que não foi culpa dele”, afirmou.
Ele disse ainda que, no clamor dos acontecimentos após o naufrágio, as autoridades se voltaram para o Marcos, o piloto. ‘Ah, o piloto é culpado de tudo’. E aí as razões dessa acusação, no que eles se basearam? Ele não era habilitado, primeiro ponto. Segundo, o barco não tinha segurança, era um barco não autorizado, clandestino", contou.
E terceiro, ele estava fazendo uma rota não autorizada. E o quarto argumento para essa acusação seria excesso de passageiros. "Então são quatro elementos em que se baseou a Polícia, a Justiça, para de imediato decretar a prisão do piloto e assim trazer uma resposta à sociedade. Só que, passados os dias e com a entrada da defesa, isso começou a ruir", afirmou Dorivaldo Belém.
"Provamos que o barco tinha todas as vistorias", afirma advogado
"Nós provamos, primeiro, que ele era habilitado e autorizado pela Capitania dos Portos. Uma habilitação que lhe dava condições de pilotar embarcações de maior porte, com capacidade de passageiros e carga. Esse argumento caiu. O segundo: provamos que o barco tinha todas as vistorias aprovadas e habilitadas pela Capitania dos Portos, que fiscaliza e autoriza a questão de segurança. Então o barco era seguro, de acordo com as características para a região. Portanto, um barco que estava apto para as viagens Marajó-Belém, Belém-Marajó, tanto que ele fazia essa rota normalmente de Cachoeira do Arari para cá”, afirmou.
E o terceiro elemento em que se baseia a acusação é o excesso de passageiros. “Aí, quando nós mostramos que ele era habilitado, o barco era seguro pela Capitania e autorizado e que não havia excesso de passageiros até então, aí a Justiça, o Tribunal concedeu de imediato a sua liberdade e ele responde ao processo em liberdade”, afirmou.
Ainda segundo o advogado, em relação ao excesso de passageiros, ficou a dúvida: a lancha tinha mais gente do que poderia e isso causou acidente ou não? "É isso que vai se discutir aí nesse processo", afirmou.
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