Projeto da Ufra pretende reduzir a emissão de gases nocivos na produção de carvão vegetal

O projeto busca trazer para a realidade da Amazônia o sistema fornos-fornalha que utiliza a tecnologia para baixa emissão de gases durante a carbonização

O Liberal
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Unindo ciência e sustentabilidade, um projeto da Universidade Federal Rural do Pará (Ufra) busca alternativas para redução dos impactos ambientais na produção de carvão vegetal — um combustível rico em carbono e produzido a partir da carbonização da madeira.  O projeto busca trazer o sistema fornos-fornalha — um modelo de carbonização desenvolvido pelo Laboratório de Painéis e Energia da Madeira (Lapem) da Universidade Federal de Viçosa (UFV) — que utiliza a tecnologia para baixa emissão de gases nocivos durante a carbonização. O estudo, intitulado de “Geração de bioenergia a partir de resíduos do manejo florestal sustentável: descentralização da matriz energética e impactos socioambientais na Amazônia”, é coordenado pelo professor Thiago Protásio, da Ufra campus Parauapebas. 

O carvão energético é altamente demandado e usual pelas indústrias, devido a eficiência energética. No entanto, tanto a origem legal dessa madeira quanto às consequências carbonização para o efeito estufa atrai preocupações. Para reduzir esses impactos, o forno-fornalha reúne quatro fornos circulares, conectados a uma fornalha central O objetivo é reduzir a emissão de gases poluentes, que são espalhados no ar em meio ao processo de transformação da madeira em carvão. Com o sistema, a emissão de gases poluentes e causadores do efeito estufa deixa de ocorrer, como explica o professor. O projeto teve início em dezembro de 2022, e a equipe deve iniciar a construção do protótipo em 2024. 

“Os gases que saem dos fornos são direcionados para essa fornalha central, onde serão queimados, eliminando completamente a fumaça resultante da transformação da madeira em carvão vegetal. Com isso, a chaminé só irá liberar o CO2 e água. O CO2, por sua vez, será novamente capturado pelas árvores durante a fotossíntese, fechando assim o ciclo do carbono”, explica. 

image Com o forno-fornalha a emissão de gases poluentes e causadores do efeito estufa deixa de ocorrer. (Divulgação / Ascom Ufra)

Entre as medidas também está o manejo florestal legalizado e o reaproveitamento de restos de madeira certificada para a carbonização. Dados do Balanço Energético Nacional indicam que o Brasil é o maior produtor mundial de carvão vegetal. Só em 2021, o país produziu mais de 6 milhões de toneladas deste insumo energético, sendo 4,255 milhões de toneladas destinada a produção de ferro-gusa e de aço. Segundo dados da Indústria Brasileira de Árvores (IBÁ), 94% da produção nacional de carvão vegetal é proveniente de florestas plantadas com eucalipto, sendo os 6% restantes obtidos a partir de manejo florestal sustentável e legalizado. 

“Isso significa que 70% da produção brasileira de carvão vegetal é destinada ao setor de gusa e aço. Não incentivamos o desmatamento de jeito nenhum, o projeto utiliza o que sobra do manejo legalizado, e transforma esses resíduos em carvão vegetal”, diz o professor.

Início

As ações da pesquisa devem começar com a liberação dos recursos para a construção de uma unidade piloto de produção de carvão vegetal. A unidade deverá ser construída na área da empresa do Grupo Keilla, (antigo Grupo Cikel), conhecida como Complexo Rio Capim e localizada no município de Paragominas, como detalha a Ufra.

“A diferença é que agora vamos adaptar essa tecnologia para a carbonização de resíduos do manejo florestal da Amazônia, já que ainda não existem estudos sobre isso voltados à nossa realidade”, afirma o professor. O professor explica, ainda, que, mesmo utilizando biomassa sustentável, a transformação da madeira em carvão vegetal ainda emite gases nocivos ao efeito estufa.

Para o estudo serão pesquisados resíduos de 25 espécies nativas. Serão realizados testes de validação da tecnologia aplicada na Amazônia, o que inclui análises de como realizar a carbonização de forma adequada a essas espécies, especificamente alterando o tempo e a temperatura dos fornos para obtenção de maior produtividade de carvão vegetal.

O pesquisador explica que as árvores da Amazônia são de grande porte e estocam mais biomassa do que árvores de eucalipto. “Uma galhada de árvore da Amazônia, como a maçaranduba e o angelim vermelho, possui diâmetro entre 30 cm a 45 cm de diâmetro. Isso é mais que o diâmetro de um eucalipto de 15 anos de idade”, detalha.

Benefícios

A alternativa pode abastecer indústrias que utilizam o carvão vegetal de forma legalizada, como as indústrias de ferro-gusa do Polo Carajás (localizado entre os estados do Pará e Maranhão). “Carajás é o segundo maior polo siderúrgico do Brasil, e depende do carvão vegetal para produzir ferro-gusa. O minério de ferro do Pará é o melhor do mundo e o carvão vegetal é rico em carbono, insumo fundamental para siderurgia”.

Segundo dados do anuário 2021, divulgado pelo Sindicato da Indústria do Ferro no estado de Minas Gerais (SINDIFER), a produção de ferro-gusa na região de Carajás foi de 498.043 toneladas, o que equivale a 9,5% da produção nacional.

“O reflorestamento na nossa região é incipiente e precisa se desenvolver. Uma alternativa em curto prazo é a utilização da biomassa sustentável do manejo florestal, o que reduz o consumo de combustíveis fósseis, contribuindo para a geração sustentável de energia na Amazônia Legal e consolidando uma matriz energética mais segura e menos poluente. A melhoria do processo de carbonização com o aumento do rendimento da conversão e, queima dos gases produzidos no processo, propiciará maximizar o uso dos resíduos florestais e diminuir o impacto ambiental na Amazônia”, afirma.

Manejo

A Instrução Normativa Nº 5, de 11 de dezembro de 2006, publicada pelo Ministério do Meio Ambiente, menciona no artigo 2º, inciso XIV, que os resíduos da exploração florestal (galhos, sapopemas e restos de troncos, por exemplo) podem ser utilizados como produtos secundários do manejo florestal para a produção de madeira e energia. 

O professor explica que o manejo florestal da Amazônia é conduzido de forma a propiciar a recuperação do estoque de biomassa em um ciclo de 25-30 anos. “Basicamente, 5 a 10 árvores por hectare são colhidas utilizando técnicas de mínimo impacto na floresta. No entanto, apenas as toras dessas árvores são destinadas às serrarias. Na maioria dos planos de manejo, a copa das árvores (galhada) é deixada na floresta e, dessa forma, não tem utilização comercial. O projeto visa dar uma destinação ambientalmente adequada aos resíduos dos planos de manejo florestal da Amazônia. Isso possibilitará o desenvolvimento socioeconômico da região, sem prejuízos ao ambiente”, diz. Além de construir o sistema, os pesquisadores irão treinar a mão de obra local, para que a tecnologia seja utilizada pelos pequenos e médios produtores de carvão vegetal.

O projeto foi aprovado na Chamada CNPq/MCTI/FNDCT Nº 59/2022 – Produção de Conhecimento Voltado para Soluções e Tecnologias Associadas à Mitigação e Adaptação às Mudanças do Clima. O estudo tem a parceria de pesquisadores da Universidade Federal de Lavras (Ufla), Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Universidade Federal de Viçosa (UFV), Universidade Federal de Jataí (UFJ), Universidade de Brasília (UnB) e Centre de Coopération International en Recherche Agronomique (CIRAD/França). Participam da iniciativa, também, as empresas do Grupo Keilla, Blue Timber Florestal S.A., Instituto Ambiente Florestal Eirelli e Siderúrgica Norte Brasil S.A. 

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