Paciente de 64 anos realiza transplante de fígado em hospital público de Belém
Ana Cristina estava na fila para o procedimento deste 2022
Diagnosticada com cirrose, a professora aposentada Ana Cristina Pereira Nunes Pinto, 64 anos, recebeu o tão esperado transplante de fígado, na Santa Casa de Misericórdia do Pará, em Belém, após ser encaminhada pelo Hospital Barros Barreto. A paciente estava na fila de espera para o procedimento desde 2022 e fazia tratamento para tentar conter o avanço da doença.
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Casada e mãe de três filhos, Ana Cristina foi submetida ao procedimento cirúrgico em 2024, e aguarda a alta hospitalar para celebrar em família. No último final de semana de janeiro, ela foi avisada que receberia um órgão captado em Belém. “A doação desse órgão tem um significado especial, que é salvar uma vida. Sair daquela fila de espera, passar por um processo com uso de muitos medicamentos, muita agonia, muito nervosismo. É o que vivi durante esses anos. Não conseguia dormir. É agoniante”, relata.
Antônio José Pinto Júnior, filho da paciente, conta que: “há anos a saúde de minha mãe vinha se deteriorando. A alimentação cada vez mais regrada, as saídas dela cada vez mais limitadas. E no auge do coronavírus (pandemia de Covid-19) a nossa preocupação redobrou por conta da imunidade dela. Mas graças a Deus ela teve a oportunidade de ter uma família com a consciência da importância de doar um órgão para que continue em outra pessoa”, afirma.
“Nós sabemos que é um momento de perda. É um momento de dificuldade para a família do doador. Mas quando se tem esse gesto de amor, você consegue levar alegria e amor para outra família, que é algo indescritível. Eu queria agradecer a essa família. Somos muito gratos a esse gesto de amor de doação desse órgão”, diz Antonio.
O jovem fez ainda um alerta sobre a importância de doação de órgãos. “Muitas pessoas estão precisando em um leito e nas UTIs, e esse é um ato de dar vida às outras pessoas”, reforça o filho de Ana Cristina.
O cirurgião Rafael Garcia, responsável técnico da equipe de transplante de fígado da Santa Casa, disse que o procedimento foi realizado após a oferta do Hospital Abelardo Santos, que foi captado pela Central Estadual de Transplantes (CET). “Foi o nosso primeiro caso este ano. Depois de quase nove meses sem ter nenhum transplante, por conta de doadores, e os poucos que tiveram não foram compatíveis com quem a gente tinha em fila”, conta o médico.
“Nós tivemos algumas complicações técnicas no caso da paciente. Mesmo assim, foi um transplante muito tranquilo. A cirurgia durou seis horas e meia. Ela saiu superbem. Tomou uma bolsa de sangue só. E a gente já viu o funcionamento do fígado no intra-operatório. Esse caso especificamente é uma vitória muito grande”, acrescenta.
O cirurgião explica ainda que o procedimento realizado em Ana Cristina é 100% da Santa Casa e foi o primeiro sem a tutoria do Hospital Albert Einstein, que encerrou no final de 2023. “É outro marco aqui pra gente, muito perto de ter um ano do primeiro caso, que aconteceu dia 26 de fevereiro de 2023. A gente espera que tenha mais doações, para podermos tirar outros doentes da fila. Nesse período, essa foi a quinta cirurgia”, conclui.
O transplante envolveu dezenas de profissionais. Entre a retirada do fígado doado e o procedimento cirúrgico, participaram mais de 50 profissionais que atuam na regulação, portaria, CTI (que recebe a paciente depois), banco de sangue, laboratório e centro cirúrgico.
Bruno Mendes Carmona, presidente da Fundação Santa Casa de Misericórdia do Pará, disse que desde 2019 havia uma demanda do governo, via Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa), definida como política de saúde pública, para que a Santa Casa fosse referência em transplante hepático. “Com a implantação do transplante de fígado no Estado, nós passamos a não ter mais necessidade de mandar os pacientes para realizar seus tratamentos fora de seus domicílios, em outros estados. Dessa forma, nós iremos conseguir tratar todas as doenças desse paciente, do início até o momento do transplante”, afirma.
Doação de órgãos
No Brasil, aproximadamente 50 mil pessoas precisam de transplante. Para enfrentar esta demanda, é necessário que mais famílias autorizem doações quando há comprovação de morte encefálica. Um doador de órgãos pode salvar até nove vidas, com a doação dos rins, fígado, coração, pulmões, pâncreas e intestino.
A Santa Casa do Pará realiza, além do transplante de fígado, transplante renal pediátrico desde 2019. Desde então, 23 crianças e adolescentes já passaram pelo procedimento. Cerca de 40 pacientes renais pediátricos ainda aguardam na fila de transplante no Hospital, assim como 11 pacientes hepáticos, além de outros em preparação para a fila de espera.
De acordo com o cirurgião Rafael Garcia: “se tivesse doação suficiente, a gente poderia ter essa fila zero. Na região Norte os índices de doação são muito baixos em relação ao restante do País. E sem doação não tem transplante. Não tem motivo a gente ter tudo o que tem aqui de equipe, material, equipamento. Investimento alto, mas se não tem a doação fica difícil. A gente só consegue funcionar se houver a doação”, destaca.
O médico relembra a importância de informar, ainda em vida, sobre o desejo de ser um doador de órgãos. “Só há transplante com doação, e doação só acontece no Brasil se a família autorizar a retirada do órgão. Mas, para isso, as pessoas precisam falar e demonstrar o interesse de ser doador ainda em vida. Aceitar a doação é um gesto muito nobre. De certa forma, a vida continua, seja no fígado, no rim ou nas córneas de alguém”, esclarece.
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