Nova lei deve reduzir casos de violência obstétrica no Pará; entenda

Estado registra 46 casos e 27 óbitos em 15 meses (2023 e 2024), aponta Segup

Eduardo Rocha
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Os números relativos à violência obstétrica no Pará poderão mudar a partir de agora, com a vigência de uma nova lei estadual, a nº 10.495, de 24 de abril de 2024. Essa legislação dispõe sobre a obrigatoriedade de maternidades e estabelecimentos hospitalares que atendam gestantes, públicos ou privados, afixarem, nas áreas comuns e de circulação de gestantes e puérperas, cartazes e/ou placas para a publicização dos canais oficiais que recebam denúncias de violência obstétrica, no âmbito do Estado do Pará. 

Pelo levantamento feito pela Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social do Estado do Pará (Segup), no período de 15 meses, ou seja, nos 12 meses de 2023 e mais os três primeiros meses de 2024, o estado registrou 46 casos e 27 óbitos relacionados à violencia obstétrica. Já de acordo com o levantamento do Ministério das Mulheres, em 2022, 2023 e até abril 2024, o Pará apresentou 17 registros de violência obstétrica registrados pelo Ligue 180 - Central de Atendimento à Mulher, ou seja, 7 em 2022, 10 em 2023 e nenhum até o quarto mês de 2024. Esses registros no Ligue 180, em pequena quantidade, mostram-se em crescimento, em contraposição à queda dos numeros no Brasil: em 2022, 260; em  2023, 223; até abril de 2024, 97. As denúncias foram encaminhadas para as delegacias e, caso praticada por agente público, também ao Ministério Público, como informa essa pasta do Governo Federal. 

A Segup informa que nos meses de janeiro a março de 2024, ocorreram 8 casos de violência obstétrica no Pará, apontando redução de 42% em relação ao mesmo período de 2023, em que foram registrados 14 casos. De janeiro a dezembro de 2023, ocorreram 38 casos de violência obstétrica em todo o Estado. Informa ainda que, ao total, ocorreram 23 óbitos em decorrência de violência obstétrica em todo o ano de 2023. No primeiro trimestre de 2023, foram registradas 11 mortes e no primeiro trimestre de 2024, 4 mortes.

A Polícia Civil informa que, de janeiro a dezembro de 2023, nas Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM´s), foram registrados três boletins onde há violência obstétrica identificada no relato. Já neste ano, de janeiro até agora, um boletim de ocorrência foi registrado na Deam. A PC ressalta que os casos podem ser denunciados em qualquer unidade policial e ainda nas 24 Deams do Estado

Crimes

O Ministério das Mulheres informa que tem dialogado com o Ministério da Saúde sobre ações que visem assegurar a dignidade e a autonomia da mulher no processo gestacional. "Atualmente, o termo 'violência obstétrica' não está expresso no Código Penal Brasileiro, mas condutas como omitir socorro à gestante, lesão corporal durante o parto, violência sexual e injúria, são crimes relacionados à violência obstétrica. É importante destacar que práticas como a Manobra de Kristeller – empurrões para 'ajudar' o bebê a nascer, e episiotomia são banidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS)", repassa o Ministério. 

As mulheres podem denunciar violência obstétrica para o Ligue 180, que funciona 24 horas por dias, todos os dias da semana, inclusive feriados. Também é possível formalizar uma denúncia na Ouvidoria Geral do SUS por meio do 136, ou da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), caso a mulher tenha plano de saúde; no Ministério Público e também no conselho de classe referente ao profissional que praticou a violência. 

Desinformação

Na avaliação da advogada Paloma Regis Brasil, especialista em direito à saúde e violência obstétrica secretária-geral da Comissão de Saúde da OAB-PA, os números reduzidos de denúncias nos canais de atendimentos disponíveis não retratam a realidade dos serviços de saúde. Eles refletem a desinformação e o desconhecimento por grande parte da sociedade, e, em especial, das gestantes e puérperas sobre as condutas que são consideradas violência obstétrica, bem como, dos canais de atendimento disponibilizados para que as denúncias ocorram.

São diversas as condutas que podem ser classificadas como violência obstétrica, "muitas delas são bastante naturalizadas e frequentes, tornando difícil que sejam identificadas e reportadas pelas vítimas com a utilização dessa nomenclatura". Como a advogada explica, a violência obstétrica são condutas abusivas e agressões cometidas contra gestantes e puérperas ou mulheres em situação de abortamento. As agressões ser físicas, verbais ou psicológicas e podem ou não ocorrer dentro do atendimento nos sistemas de saúde. A violência obstétrica pode ser praticada por diversos agentes e não apenas médicos.

As mais comuns, como ressalta a advogada, são: Manobra de Kristeller (consiste em pressionar a parte superior do útero para acelerar a saída do bebê), Toques excessivos e desnecessários, Episiotomida desnecessária ( corte do períneo), utilização de métodos desnecessários de aceleração do Trabalho de parto sem consentimento ou informação adequada à gestante, indicação da cirurgia cesariana de forma desnecessária e sem a devida informação sobre as consequências para a gestante, xingamentos e desrespeito à autonomia da gestante, negativa do plano de parto, negativa de analgesia, negativa do acompanhante, restrição alimentar e de movimentos sem necessidade, entre outros.

Acerca da nova lei estadual sobre canais de denúncias dessa prática, Paloma Brasil afirma que a legislação vai contribuir para que mulheres tenham acesso a informações e aos canais de denúncia sobre esse assunto. "Espera-se que o número de denúncias cresça após os estabelecimentos disponibilizarem essas informações", assinala a advogada. Ela salienta que a OAB/PA atua na organização de eventos sobre essa temática e, quando procurada, encaminha os casos recebidos de denúncias após atendimento e acolhimento para os canais adequados. "As gestantes precisam estar atentas e buscar informações. A caderneta das gestantes é importante mas não o suficiente. Perguntar e se informar nos canais do SUS e ANS (nos casos em que a gestante possuir plano de saúde) é fundamental para ter conhecimento sobre as fases da gestação, exames importantes e temas como diabetes e hipertensão durante a gestação. Um pré-natal adequado é o primeiro passo para a redução das violências", completa Paloma Brasil.

Lei

Já está em vigor, desde o final do mês de abril a lei estadual nº 10.495, de 24 de abril de 2024, que dispõe sobre a obrigatoriedade de maternidades e estabelecimentos hospitalares que atendam gestantes, públicos ou privados, afixarem, nas áreas comuns e de circulação de gestantes e puérperas, cartazes e/ou placas para a publicização dos canais oficiais que recebam denúncias de violência obstétrica, no âmbito do Estado do Pará. A nova legislação acaba de ser sancionada pelo governador Helder Barbalho no último dia 25 de abril e prevê que se equiparam aos estabelecimentos hospitalares os postos de saúde, as unidades básicas de saúde e os consultórios médicos especializados no atendimento da saúde de gestantes ou puérperas.

De acordo com a lei, os cartazes e/ou placas afixados deverão possuir medidas que permitam sua fácil visualização, devendo conter, em todo caso, os canais de atendimento à mulher, em especial, sem prejuízo de outros: o “Ligue 180” - Serviço de utilidade pública essencial para o enfrentamento à violência contra a mulher; o “Disque 100” - Serviço de Denúncia de Violações aos Direitos Humanos; as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher do respectivo Município.

É imprescindível, segundo a nova lei, ainda que conste nos cartazes e/ou placas que: “A violência obstétrica é qualquer tipo de agressão ou abuso a uma mulher durante sua gestação, no parto, no puerpério ou até mesmo em casos de necessidade de aborto, seja física, verbal ou psicológica”.

A inobservância ao disposto na lei sujeitará o estabelecimento infrator às
sanções de advertência; multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 10.000,00 (dez mil reais), podendo ser agravada em caso de reincidência.

Sespa

Para o cumprimento dessa nova legislação, a Secretaria de Estado de Saúde Pública (Sespa) atua com base na Educação em Saúde, a fim de "ampliar o conhecimento e práticas relacionadas aos comportamentos saudáveis, para que a gestante e/ou puérpera conheça as boas práticas de pré-natal, parto e nascimento e saiba quando tiver os seus direitos violados".

A Secretaria de Saúde orienta que as unidades de assistência ao pré-natal e os hospitais de atendimento ao parto e nascimento sigam as diretrizes nacionais de assistência ao parto no intuito de qualificar o modo de nascer no Brasil.

 

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