Dia do Sexo: número de pessoas que têm repulsa pela prática sexual é crescente, avalia especialista
A reportagem de O Liberal conversou com a sexóloga clínica e educadora sexual Monica Moura, que analisou como o pensamento humano sobre o sexo evoluiu ao longo do tempo
Na era digital, o sexo está mais acessível do que nunca, com aplicativos de encontros e pornografia facilmente disponíveis a um clique. No entanto, a humanidade parece estar menos interessada na prática sexual. Estudos publicados são unânimes em apontar que nunca se fez tão pouco sexo em toda a história da civilização. O paradoxo desse cenário, em que a oferta é abundante, mas o interesse decai, levanta questões sobre como a sociedade enxerga o sexo e as novas formas de relacionamentos. Para esta sexta-feira (6/9), Dia do Sexo, a reportagem de O Liberal conversou com a sexóloga clínica e educadora sexual Mônica Moura, que analisou como o pensamento humano sobre o sexo evoluiu ao longo do tempo.
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De acordo com Mônica Moura, a história da sexualidade humana pode ser dividida em fases muito distintas. Na Antiguidade, por exemplo, o sexo era visto como uma prática natural e livre. "Existiu um momento lá no passado que o sexo não era visto como algo feio, a homossexualidade inclusive era vivida livremente. Se pensarmos nas relações gregas e romanas, percebemos como o sexo era muito mais livre”, afirma.
Com o passar do tempo, essa liberdade foi sendo substituída por regras e convenções. Na Idade Média e boa parte da chamada era vitoriana no ocidente, o sexo passou a ser entendido como algo que deveria ocorrer apenas dentro do casamento, geralmente arranjado, e muitas vezes visto como uma obrigação.
"O sexo era visto como um dever, uma obrigação”, explicou Monica Moura. Esse comportamento também estava profundamente ligado à noção de casamento como uma instituição sagrada, especialmente sob a influência da Igreja Católica, que promoveu a castidade e a ideia de que o sexo tinha um papel meramente reprodutivo. “O sexo era tabu no casamento, os homens buscavam o prazer sexual em outras parcerias, pois era um tabu com a própria esposa”, diz a especialista.
A ideia do amor e a revolução sexual
Com a chegada do século XIX, o casamento começou a ser associado ao ideal de amor romântico, embora a expressão sexual ainda fosse fortemente reprimida. “Apesar de falar muito de romantismo, o sexo naquela época era visto como um tabu", destaca a sexóloga. O cenário só começou a mudar de forma significativa a partir da revolução sexual da década de 1960, quando a liberdade sexual ganhou espaço, impulsionada por movimentos feministas e pela introdução dos contraceptivos.
Contudo, ao passo que as décadas seguintes trouxeram uma maior aceitação da pluralidade sexual, simbolizada pelo movimento LGBTQIAPN+, o surgimento da era digital e das redes sociais parece ter trazido novos desafios. "Quando enxergamos que as redes sociais, apps de namoro, pornografia, que isso tudo está muito disponível, o sexo sai daquele lugar do desejável, do difícil. E tudo que está muito disponível acaba perdendo o encanto", reflete Monica Moura.
Repulsa e desinteresse aumentam
Essa facilidade de acesso ao sexo tem gerado, em alguns casos, uma certa repulsa ao sexo físico, algo que Monica Moura já observou em sua prática clínica. “Chegamos a um ponto onde as pessoas preferem trocar nudes do que transar, preferem conversar no Tinder do que se encontrar pessoalmente”, diz a sexóloga.
Essa tendência destacada pela sexóloga se assemelha ao que foi retratado no filme O Demolidor, de 1993, sucesso de bilheterria protagonizado por Silvester Stallone e Wesley Snipes. O longa projetava uma sociedade futura onde o sexo físico seria substituído por experiências virtuais. Para Monica, essa ficção está mais próxima da realidade do que imaginávamos. “Hoje, percebo e recebo muitas pessoas que têm desenvolvido repulsa ao sexo, está tão disponível e de uma forma tão agressiva que chega até a ferir, infelizmente tem sido um problema”, diz.
O poliamor
A sexualidade hoje, embora plural, é vivida de maneira diferente. Relações não monogâmicas, por exemplo, ganham cada vez mais destaque, o que, segundo a sexóloga, reflete uma mudança na forma como a sociedade lida com o desejo sexual. “As relações poliamorosas estão sendo mais respeitadas. As pessoas estão se permitindo entender mais que o desejo sexual não é monogâmico, não é exclusivo", afirma.
Monica Moura também alertou para as consequências das novas formas de interação sexual, como o surgimento do "pornô de vingança", prática em que vídeos íntimos são expostos sem consentimento, resultando em danos profundos para as vítimas.
Em um contexto onde o sexo parece ter perdido parte de sua aura transgressora, sexóloga conclui que a humanidade, de fato, está vivendo um momento singular. “O sexo é desejado porque ele é proibido, porque é escasso, porque é difícil ter. Para ter desejo sexual a gente precisa dessa escassez. Quando me deparo com muita facilidade, o sexo perde o efeito transgressor, e isso me leva ao desinteresse”, conclui.
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