Brasil é o país que mais gasta tempo no celular diariamente no mundo
A pandemia de covid-19 só agravou o uso de celular devido à necessidade de trabalho remoto, aulas a distância e menos opções de entretenimento
O estudo State Mobile 2022, publicado por uma empresa de análise de aplicativos e mercado, indica que o Brasil é o país que mais utiliza aparelhos celulares no mundo. Com 5,4 horas diárias, os brasileiros lideram o ranking que inclui países como Coréia do Sul (5h), Japão (4,6h) e Estados Unidos (4,2h). O levantamento aponta ainda que a pandemia de covid-19 pode ter sido um fator agravante para o cenário brasileiro, visto que, em 2019, a média de tempo gasto era de 3,8 horas diárias, um aumento de 1,6 horas. A pesquisa demonstra que no mundo o uso de celulares cresceu em 30%.
A psicóloga e doutora em Ciência, Klaudia Sadala, explica que o comportamento do brasileiro com relação ao uso do celular está diretamente relacionado aos seus hábitos de consumo e saúde mental.
“É importante pensar que o celular tem substituído as outras telas, como tablet e notbook nos últimos anos, além disso o aumento no uso de aplicativos (Ex. saúde e bem estar, planejamento financeiro, bancos digitais, mercado de alimentos) e alteração no formato de consumo de bens e serviços (do presencial para o online) devem ser levadas em consideração. Por outro lado, os brasileiros são grandes consumidores de conteúdos advindos das redes sociais, um recurso de vinculação social, tentativa de se sentir incluído, ver e ser visto”, afirma.
Segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Organização Pan-americana da Saúde (OPAS), o Brasil é o país mais ansioso do mundo, com 9,3% da população ansiosa, e o segundo maior das Américas com depressão, sendo que tal doença atingia 5,8% da população, antes da pandemia. A especialista ressalta que isso diz muito sobre nossa forma de reagir à nossas dores e demandas psicossociais, as quais incluem dificuldades em relação ao trabalho, emprego e renda, violência e nos últimos anos crise política e econômica. “As redes sociais passam a ser um refúgio e ao mesmo tempo um ambiente de bombardeio de estímulos (como ser, como agir e viver), além de informações e notícias catastróficas. Quem está com alterações importantes na saúde mental pode encontrar nas redes sociais, uma fuga da realidade, evitando entrar em contato com medos, desconfortos e enfrentamentos”, pontua.
Pandemia de covid-19 agravou o uso de celular
Na análise de Klaudia Sadala, a pandemia agravou o uso excessivo do aparelho celular. “Com o isolamento social estar conectado se torna uma forma de estar em interação, de não se sentir tão sozinho, de se fazer presente na vida dos familiares e amigos, sobretudo se pensarmos nas redes sociais. De alguma forma estar conectado, nos fez sentir que a vida não “parou”, que temos com quem “compartilhar” nossas dores, lamentos e experiências. Intimamente relacionado à pandemia, o uso de aplicativos de entrega de comida teve um crescimento expressivo. O número de sessões nesses apps foi de 194 bilhões em 2021, um aumento de 50% em relação ao ano anterior”, destaca.
O uso excessivo do celular causa prejuízos ao sono e ao desenvolvimento de habilidades sociais. “Segundo um estudo da faculdade de Medicina de Harvard, publicado na revista Nature, a luz azul emitida por aparelhos celulares e tablets ativa os neurônios e perturba o sono. Neste sentido, as pessoas podem ter a sensação de estarem sempre ligadas e disponíveis, características não compatíveis com o sono. A luz emitida pelas telas dos dispositivos bloqueia a liberação da melatonina – que é o hormônio responsável por avisar ao corpo que está na hora de dormir. O sono é regulador do humor e da saúde mental, se ele não estiver equilibrado, todo o resto sofrerá alterações/prejuízos. O desenvolvimento de habilidades sociais fica prejudicada, pois a relação virtual distancia dos desafios da vida diária e permite pensar que tudo será resolvido em um clique, não desenvolvemos tolerância em esperar, em sermos frustrados, ou falar sobre nossos sentimentos na presença de outra pessoa”, ressalta Klaudia Sadala.
Se usado com moderação, o celular pode ser um aparelho benéfico e aliado do usuário. “O celular é um recurso tecnológico importantíssimo, hoje seria bem difícil pensar em nossa vida sem ele. Ele viabiliza nossa comunicação, aprendizagem, trocas relacionais, endereços, sites de busca, acesso a informação/orientação (como o caso das consultas online), compras e uma infinidade de recursos, porém seu uso deve ser administrado de forma equilibrada, e quando pensamos em crianças e pré-adolescentes, devem obrigatoriamente passar pela supervisão de adultos. Não há uma indicação precisa do tempo de uso, porém quando nossa qualidade de vida tiver sendo impactada, devemos rever nosso tempo de conexão”, orienta a especialista.
Publicitário buscou uma relação mais sadia com o uso do celular
O publicitário Newton Correa, de 28, percebeu há alguns anos que precisava rever seus hábitos e decidiu diminuir o tempo de uso do aparelho celular. “Desde 2018 eu sinto a necessidade de diminuir o tempo de uso no celular. Os motivos são vários, vão desde dores de cabeça e vista cansada, até picos de ansiedade gerados pelo excesso de conteúdo das redes sociais. Além disso, eu notei que o meu dedo mindinho (o que sustenta o celular quando eu o seguro na mão) está "distorcido", ele não volta mais para o lugar certo por passar tanto tempo carregando o peso do aparelho”, conta.
Para reduzir o tempo de uso, Newton procura sempre testar técnicas diferentes, como a pomodoro que propõe uma divisão da jornada em intervalos de 25 minutos. Durante esses intervalos de tempo, uma determinada tarefa deve ser realizada ininterruptamente. Ao fim de cada período, é feita uma pausa de 5 minutos e, ao final de cada 4 blocos de 25 minutos, uma pausa de 30.
“Já fui adepto de aplicativos que bloqueiam smartphone por um determinado período, vez ou outra uso o pomodoro para me concentrar em tarefas mais complexas e também comecei a criar listas com metas e uma delas é reduzir o tempo no celular. Outros hábitos simples ajudam bastante como: desativar notificação de redes sociais e ler mais sobre a nossa relação com a internet”, revela o publicitário.
Atualmente, Newton costuma passar, em média, 4 horas diárias utilizando o aparelho celular e sente menos ansiedade. “Sempre que eu percebo que passei pouco tempo usando celular foi porque estive fazendo outra atividade mais interessante. O ponto é justamente esse: repensar como a gente consome o nosso tempo e buscar formas de aproveita-lo de outra forma que não seja olhando para o celular”, acrescenta.
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