Sírios de minoria religiosa fogem para o Líbano após queda de Assad

Perseguição religiosa imposta pelo novo regime sírio, especialmente aos alauítas, provocou uma nova fuga de civis da Síria

Gustavo Freitas / Especial para O Liberal
fonte

Mais de seis mil sírios de origem alauíta cruzaram a fronteira com o Líbano em busca de refúgio da perseguição religiosa imposta pelo novo regime sírio, liderado por Ahmed al-Sharaa. Nos últimos dias, 350 famílias seguiram esse caminho, segundo autoridades libanesas, fugindo da violência sectária.

O êxodo ocorre em meio à intensificação do conflito no país. A situação tem sido particularmente sensível para os alauítas, uma minoria religiosa associada ao regime deposto de Bashar al-Assad, que tem sido alvo de ataques. De acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, centenas de civis, incluindo famílias inteiras, foram mortos em massacres sectários na última semana.

Ao longo de dois dias, as forças de segurança do governo entraram na região de Homs para deter uma insurreição de grupos ligados a Assad, enquanto mesquitas em áreas leais ao governo emitiram pedidos de jihad, ou luta sagrada. Durante a violência que se seguiu, o Observatório Sírio de Direitos Humanos diz que mais de 1.200 civis foram mortos, a grande maioria deles alauitas.

image Massacres na Síria levantam dúvidas sobre capacidade de governar das novas autoridades
Desde a queda de Assad, a região costeira tem sido cenário de ondas de violência, com sequestros e tiroteios, segundo testemunhas

image Família aguarda repatriação de paraenses há seis anos prisioneiros na Síria
Karina Aylin e o filho, Abdallah, de sete anos, aguardam em meio ao conflito de guerra para serem repatriados ao Brasil

Nos últimos anos, o Líbano tem enfrentado uma das piores crises financeiras de sua história. A libra libanesa perdeu mais de 90% de seu valor em relação ao dólar, levando a uma hiperinflação e ao aumento vertiginoso da pobreza no país. Além da crise financeira, o Líbano se viu forçado a receber quase 1.5 milhões de refugiados sírios que fugiram às pressas ao longo da guerra civil na década passada, agravando os problemas internos do país.

Em Beirute, os subúrbios mais carentes se tornaram terreno para a maior parte dos refugiados sírios, que ainda precisam de assistência diária para ter acesso a itens básicos. Além dos baixos salários e o crescente número de mães e crianças pedindo ajuda nas ruas da capital libanesa, esses refugiados ainda enfrentam um crescente sentimento de rejeição dos libaneses, que acusam os sírios de prejudicar a economia e o ordenamento do Líbano.

Divisão sectária

A Síria foi governada por mais de 50 anos pela família Assad, pertencente à minoria alauíta, uma corrente xiita que representa cerca de 10 a 15% da população. Enquanto isso, os muçulmanos sunitas, que formam cerca de 70% da população, sempre estiveram à margem do governo.

image Ataque com carro-bomba deixa 20 mortos na Síria
Nenhuma reivindicação de responsabilidade pelo ataque havia sido feita

image União Europeia dará ajuda de € 235 milhões à Síria e a países vizinhos
É a primeira visita de um alto responsável das instituições comunitárias à Síria após a queda do presidente Bashar al-Assad

Quando Hafez al-Assad assumiu o poder em 1970, foi a primeira vez que um alauíta passou a governar a Síria. O regime de Assad se fortaleceu por meio de uma combinação de apoio estratégico e repressão das elites sunitas, ao mesmo tempo em que dependia fortemente da fidelidade alauíta no aparato militar e de segurança.

Grupos islâmicos sunitas, como a Irmandade Muçulmana, lideraram uma revolta armada contra o regime de Assad, acusando-o de secularismo, corrupção e favorecimento sectário. O conflito atingiu seu ápice no massacre de Hama em 1982, quando o regime reprimiu a insurgência, resultando na morte de milhares de pessoas. Esse massacre aprofundou ainda mais as divisões sectárias, com os sunitas interpretando as ações do regime como um ataque alauíta ao Islã sunita.

Assad também promoveu uma identidade secular para o país, reprimindo movimentos islâmicos e marginalizando as instituições religiosas sunitas, ao mesmo tempo em que deu segurança a outras minorias, como cristãos e drusos, que também eram ameaçados por sunitas.

Agora governado por al-Sharaa e seu grupo sunita Hay'at Tahrir al-Sham(HTS), a Síria vive momentos de incertezas quanto ao futuro dessas minorias, que passaram a buscar refúgio em diferentes pontos. Além do Líbano, nos últimos dias, a base russa em Latakia abrigou centenas de sírios, alauítas e cristãos, que fugiram às pressas de suas casas. O governo russo era um dos principais aliados do presidente deposto.

Os drusos, em grande parte, também apoiavam Assad e, embora não tenham sido alvos dos massacres recentes, temem que podem ser os próximos. Nas Colinas de Golã, ocupadas por Israel desde 1967, residem cerca de 24 mil drusos que passaram a receber a garantia de proteção do governo israelense contra qualquer ação repressiva do novo governo sírio.

A comunidade drusa é uma pequena seita religiosa do Oriente Médio caracterizada por um sistema diverso de doutrinas. Na Síria, cerca de 700 mil drusos compõem uma das maiores comunidades minoritárias do país. A proteção dada a eles por Israel em Golã, faz parte de uma política estratégica dos israelenses, que há muito pratica o que é conhecido como "doutrina periférica", onde busca alianças com minorias, como os drusos, e países ao redor da região, a fim de reforçar sua própria segurança.

Desde a queda de Assad, Israel expandiu sua presença no território sírio, criando uma “zona tampão” no sul do país para "garantir a segurança" e a estabilidade da área. Com uma área de 1.200 quilômetros quadrados, o território anexado por Israel é um terreno estratégico, com vista para a região israelense da Galileia, bem como para o Líbano, além de fazer fronteira com a Jordânia.


 

Entre no nosso grupo de notícias no WhatsApp e Telegram 📱
Mundo
.
Ícone cancelar

Desculpe pela interrupção. Detectamos que você possui um bloqueador de anúncios ativo!

Oferecemos notícia e informação de graça, mas produzir conteúdo de qualidade não é.

Os anúncios são uma forma de garantir a receita do portal e o pagamento dos profissionais envolvidos.

Por favor, desative ou remova o bloqueador de anúncios do seu navegador para continuar sua navegação sem interrupções. Obrigado!

RELACIONADAS EM MUNDO

MAIS LIDAS EM MUNDO