Eleições nos EUA: Estado da Flórida se transforma em reduto do partido republicano
A Flórida já votou em Bill Clinton, George Bush e Barack Obama, mas desde 2016 vota em Donald Trump e elege maiorias republicanas
Em Palm Beach, na Flórida, está localizado o resort de Mar-a-Lago, residência oficial de Donald Trump. A ilha fica a poucos quilômetros de Miami e é cercada por casarões luxuosos de magnatas do mundo todo, mas há alguns anos o local é o epicentro das notícias após o resort do ex-presidente se tornar um hub para eventos políticos do partido republicano.
Antes de se tornar presidente, Mar-a-Lago recebia diversos bailes e eventos beneficentes, com raros encontros de cunho político. Desde a chegada de Donald Trump à Casa Branca até os dias atuais, o resort passou a oferecer jantares oficiais para grupos ligados ao ex-presidente, além de visitas oficiais de chefes de Estado, como o encontro com Viktor Orbán, primeiro-ministro da Hungria, que visitou Trump duas vezes em 2024.
O grupo Turning Point USA, fundado com o intuito de identificar e recrutar jovens em escolas e universidades para militar no partido republicano, desde 2018 realiza encontros e bailes anuais no resort em Palm Beach para seus membros, todos bancados por empresários e organizações ligadas a Donald Trump.
O ex-presidente frequentemente participa de torneios de golf no seu resort e costuma tecer comentários políticos para seus eleitores que têm acesso ao local. Na última semana, um dia após o debate, um vídeo vazado no X(antigo twitter) mostra Donald Trump sentado em um carro de golf, dando gorjeta a um funcionário enquanto ri de Joe Biden. "Ele está acabado, eu destruí ele, ele vai desistir da corrida". Depois, insistiu que os democratas vão optar por Kamala Harris, que também foi alvo de comentários: "ela é muito ruim, é patética", disse.
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Este fluxo de conservadores não está restrito a Palm Beach. Há alguns anos, o partido republicano vem aumentando a sua força em todo o estado da Flórida, crescendo em áreas tradicionalmente democratas, especialmente entre os latinos.
Em 2016, Hillary Clinton derrotou Donald Trump no condado de Miami-Dade por uma diferença de 290 mil votos. Em 2020, Joe Biden venceu no mesmo condado por 85 mil votos. Dois anos depois, Ron DeSantis se tornou o primeiro candidato a governador republicano a vencer em Miami-Dade após 20 anos.
Durante a pandemia, a Flórida de Ron DeSantis abriu as portas para quem quisesse uma alternativa às quarentenas e lockdowns pelo país. O estado foi um dos primeiros a reabrir a economia, com restaurantes, bares e lojas funcionando plenamente enquanto o resto do país vivia sob medidas severas de contenção ao vírus. O republicano também foi contra a implementação de passaportes de vacinas e proibiu mandatos de máscaras, tornando a Flórida atrativa para muitos americanos, especialmente republicanos, que não acreditavam no isolamento social.
De acordo com o Escritório de Pesquisa Econômica e Demográfica da Flórida, cerca de 300 mil cidadãos se mudaram para o estado entre abril de 2020 e abril de 2021. Destes, cerca de 46% já estavam registrados como republicanos, enquanto apenas 23% eram do partido democrata. Em outubro de 2021, pela primeira vez em décadas, os republicanos superaram os democratas em registros de eleitores no estado.
Conhecido por ser um swing state, nos últimos anos a Flórida já votou em Bill Clinton, George Bush e Barack Obama, mas desde 2016 vota em Donald Trump e elege maiorias republicanas. Em 2022, nas eleições legislativas no país, o partido republicano investiu mais de 60 milhões de dólares em publicidade apenas no primeiro trimestre, contra 8 milhões investidos pelos democratas. No fim do ano, o governador republicano Ron DeSantis foi reeleito com 59% dos votos e o partido elegeu ampla maioria nas duas casas legislativas, dando aos republicanos a maior vitória política na história do estado.
Na Flórida, a diversidade de nacionalidades entre os imigrantes residentes também tem sido explorada pelo partido de Donald Trump. Em busca de maior apoio entre colombianos e venezuelanos, o partido republicano financia campanhas publicitárias associando Joe Biden a Gustavo Petro e Nicolás Maduro, na tentativa de dialogar com os cidadãos que se mudaram para os Estados Unidos em busca de uma vida melhor.
"Se aproximar do eleitorado latino é uma prioridade. Nós sabemos que eles são naturalmente conservadores, se importam com a fé, com a família e com seu país. Eles estão vendo os esquerdistas destruírem nosso país", disse o lobista político Matt Schlapp ao canal Telemundo.
Patrícia tem 25 anos e vive em Miami desde 2015, quando emigrou da Venezuela com toda a sua família. Na época, o país venezuelano vivia o ápice da sua crise econômica e registrava a maior inflação do mundo, em torno de 160% ao ano. Patrícia era contra Donald Trump no seu primeiro mandato, mas mudou de opinião nos últimos anos: "eu era muito jovem, hoje eu tenho certeza que ele sabe tudo o que nós já passamos e entende as dores de muitos venezuelanos que não tiveram a mesma oportunidade que eu tive", disse.
Durante o governo Trump, os Estados Unidos reconheceu Juan Guaidó como presidente interino legítimo da Venezuela, contestando a legitimidade de Nicolás Maduro, e implementou um embargo total à Venezuela em 2019, semelhante às sanções ainda aplicadas contra Cuba.
Na Calle Ocho, tradicional rua no bairro de Little Havana em Miami, turistas e cubanos lotam as dezenas de restaurantes, fábricas de charutos e bares especializados na culinária e coquetelaria cubana. No bar mais famoso da região, Ruan Alma é vocalista no conjunto cover do Buena Vista Social Club, o mais tradicional grupo musical de Cuba.
Vivendo na Flórida há 36 anos, Ruan não tinha o hábito de participar dos processos eleitorais, mas se registrou no partido republicano para as eleições de 2020. "Votei antes e votarei em Trump outra vez, ganhei mais dinheiro no seu governo e ele sabia como colocar as coisas em ordem", afirmou.
Little Havana foi refúgio para os primeiros cubanos que fugiram de Cuba após a revolução em 1959, e hoje é alvo central de Donald Trump na disputa eleitoral. Um relatório divulgado pelo Pew Research Center mostra que, desde 2020, 58% dos cubanos estão filiados ou se identificam com os republicanos.
Quando assumiu a Casa Branca, o republicano visitou Little Havana para anunciar que estava implementando restrições mais severas ao governo cubano, cortando o programa de emissão de vistos para americanos visitarem a ilha, restringindo o envio de dinheiro para parentes cubanos e reforçou sanções severas contra entidades cubanas.
Os imigrantes cubanos são maioria na Flórida e, tradicionalmente, são fiéis ao partido republicano. Mas a margem de apoiadores de Donald Trump nunca foi tão alta, indicando uma mudança comportamental no voto latino em todas as comunidades no estado.
"Trump não tolera comunistas e eu também não, por isso gosto dele", disse Ruan ao fim do seu show.
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