Esporte Olímpico no Pará: Pouca tradição do estado é relacionada à falta de patrocínio e estrutura
No Dia Mundial do Desporto Olímpico, reportagem falou com atletas de diferentes gerações para entender o motivo pelo qual o Pará, pioneiro em conquistas olímpicas, segue com pouca participação nos Jogos.
Contar a história do Brasil nos Jogos Olímpicos e não falar do Pará é impossível. Guilherme Paraense, militar do Exército nascido em Belém, foi o primeiro medalhista de ouro do país no tiro esportivo, nas Olimpíadas da Antuérpia-1920. Desde então, dezenas de atletas paraenses disputaram os Jogos, mas nem por isso o estado que ajudou a forjar o legado olímpico brasileiro tem tradição na competição.
No Dia Mundial do Desporto Olímpico, comemorado neste domingo (23), o Núcleo de Esportes de O Liberal conversou com atletas paraenses de diferentes gerações para entender o motivo pelo qual o Pará, estado pioneiro em conquistas olímpicas, segue com pouca participação nos Jogos. As respostas foram muito parecidas: falta de patrocínio e estrutura de treinamentos.
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Preparação prejudicada
Em Paris-2024, apenas atleta do Pará tem vaga garantida: o boxeador Michael Trindade, de 23 anos, que vai defender o Brasil na categoria até 51 kg. Desde que começou a fazer parte da seleção brasileira de boxe, o atleta deixou o Pará e rumou para o centro-sul do país, em busca de melhores condições de patrocínio e de treino.
"No estado é muito, muito difícil um atleta viver só com esporte, pela falta de apoio que temos. No meu caso tinha que treinar das 5h às 6h, porque às 7h ia trabalhar. Chegava às 17h em casa e ia treinar de novo, até às 18h, já que às 19h tinha que ir para a escola. Com essa rotina, não tem como a gente se manter no esporte. Quando a gente chega à maioridade temos que trabalhar, vem responsabilidades. Em 2021 passei a compor à seleção brasileira e vi que fora de Belém temos melhores condições de treino e, com isso, minha melhora foi evidente", contou.
Quem, em menor escala, também sofreu com a falta de estrutura para treinamentos no estado foi a ex-atleta olímpica Mônica Rezende. Nos Jogos de Seul-1988, ela se tornou a primeira paraense a compor a seleção brasileira de natação. Em conversa com a reportagem, a ex-nadadora disse que, na época, fez quase toda a preparação para a competição no Clube do Remo. No entanto, precisou sair do estado quando teve que disputar provas classificatórias para as Olimpíadas.
"Havia uma equipe multidisciplinar naquela época. Não tinha esse nome, mas usava o mesmo conceito, um treinador, um preparador físico e uma nutricionista. O trabalho desses profissionais contribuiu para que eu tivesse um bom rendimento. Até março de 1988 eu treinava no Remo. Recebi um convite, então, do Minas Tênis Clube e fui para lá. Fiquei lá até julho, quando consegui a vaga no revezamento 4x100 e, em agosto, fui para as Olimpíadas. A preparação, a grosso modo, foi feita toda aqui. Eu comecei a elevar o meu grau de treinos em 1980. Então, trabalhei oito anos para chegar lá. Fiquei aqui até o Minas, que tinha uma estrutura muito melhor, me convidar. Eu representei o Minas nos Jogos, mas sinto que toda a minha preparação foi no Remo", disse.
Baixo financiamento
Na conversa com os atletas, uma coisa pareceu evidente: não se pratica esporte sem dinheiro. A falta desse incentivo, sobretudo vindo de patrocinadores, tem feito com que muitos esportistas do estado abandonem a modalidade ou precisem mudar para outros lugar para buscar investimento.
Segundo Michael, no boxe o maior problema está relacionado à prioridade. Nas Olimpíadas, só são aceitos atletas não-profissionais. Ele conta que todos os investimentos do nicho estão voltados aos profissionais, deixando o esporte olímpico no limbo dos investimentos.
"No boxe eles estão dando muita prioridade ao boxe profissional. Eu acho que é errado. O boxe profissional tem que ter os seus promotores e eles fazem o evento. Nenhum boxe profissional fora do Brasil há apoio governamental, mas aqui existe. Então, está faltando essa falta de apoio. Eu mesmo já representei o Pará em outros estados por conta da bolsa que o Governo paga, mas precisamos de mais incentivo", explicou.
Já Mônica foi mais a fundo na discussão. Segundo ela, não existem clubes no Pará com condições financeiras de manter um atleta de alto rendimento. A ex-nadadora acredita que um olhar mais atento ao esporte olímpico dentro das agremiações faria com que o Pará tivesse equipes mais competitivas.
"Eu acredito que no mundo as coisas mudaram. A tecnologia evoluiu, os treinamentos também. Então, há a necessidade de se buscar as melhorias, na qual estamos atrasados. Eu acredito que, para que a gente possa melhorar, ter equipes competitivas, é necessária uma melhor estrutura. Temos aqui [no Pará] a oportunidade de treinar o ano inteiro, por questões climáticas. O que falta, na minha opinião, é olhar todo o nosso redor e fazer com que haja mudanças nos treinos, nos equipamentos, na tecnologia. Isso é uma garantia de que vamos conseguir resultados. Se eu não traçar metas, o objetivo nunca vai ser alcançado", finalizou.
Parcela governamental
Em relação ao investimento público, o Governo do Pará possui uma série de iniciativas ao esporte olímpico no Pará. A principal delas é o Bolsa Talento, que contempla 71 atletas com ajudas de custo para treinos e competições. Segundo a Secretaria de Estado de Esporte e Lazer (Seel), os gratificados na categoria "nacional" recebem R$ 1.125,63 mensais, enquanto aqueles que estão na categoria "estadual" garantem R$ 750,45 por mês, além de cinco treinadores, que ganham o valor de R$ 900,49.
Além disso, o Governo possui dois projetos esportivos para crianças e adultos. O "Gol do Brasil", que dá aulas de futebol para jovens, possui 210 alunos matriculados em atividades que ocorrem no Centro Esportivo da Juventude (CEJU), ao lado do Mangueirão. Já na Universidade do Estado do Pará (Uepa) ocorre o programa "Talentos Esportivos", que reúne mais de 320 alunos para a prática das seguintes modalidades: ginástica artística, vôlei, natação, tênis, basquete e saltos ornamentais.
A ginástica, inclusive, tem um projeto específico no Centro Norte da modalidade. Lá, a Federação de Ginástica, em parceria com o Governo do Pará, realiza um projeto social, destinando 30% das vagas de forma gratuita para pessoas de baixa renda. A iniciativa conta com cerca de 100 alunos de ginástica artística e cerca 50 alunos de ginástica rítmica.
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