Governos abrem mão de arrecadação e economia reage

Desoneração combate efeitos da crise e população percebe benefícios no consumo cotidiano

Fabrício Queiroz
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A adoção de medidas de redução de impostos é um fato pouco comum na política econômica brasileira. Neste ano, porém, a população vem acompanhando a divulgação de sucessivos cortes sobre tributos que incidem sobre diversos setores. Nesta semana, o Governo Federal anunciou um novo corte na cobrança do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). No caso de veículos, por exemplo, o desconto do tributo passou de 18,5% para 24,75%, complementando outros dois decretos já publicados neste ano que visavam incentivar a indústria nacional e reaquecer a economia.

Ainda em 2022, o principal ato nesse sentido veio a partir da aprovação da Lei Complementar nº 194 que permitiu a desoneração do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) incidente sobre combustíveis, gás, energia elétrica, telecomunicações e transporte coletivo, fixando alíquotas entre 17% e 18% em todo o país.

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Governos estaduais publicaram decretos incorporando a medida às suas realidades locais, apesar da perda de arrecadação gerada. O Comitê Nacional dos Secretários de Fazenda, Finanças, Receita ou Tributação dos Estados e Distrito Federal (Comsefaz) estimou que os prejuízos para os cofres estaduais poderiam chegar a R$ 67,7 bilhões somente em 2022. Já no Estado do Pará, a Secretaria de Estado da Fazendo (Sefa) calculou perdas de R$ 2,9 bilhões em um ano, sendo R$ 1,5 bilhão somente de julho a dezembro deste ano. Mesmo assim, desde 4 de julho, um decreto estadual estabeleceu uma alíquota de 17% para os itens descritos na lei federal. Até então, o ICMS era de 28% para a gasolina, 25% para o álcool, 25% para a energia elétrica e 30% a para comunicação.

A quem favorece a redução de imposto

O economista e conselheiro do Conselho Regional de Economia dos Estados do Pará e Amapá (Corecon PA/AP), Sérgio Melo, explica que a redução de impostos geralmente é adotada com o objetivo de favorecer consumidores ou empreendedores afetados pelo aumento de preços de determinados produtos, de estimular atividades produtivas consideradas prioritárias ou de conter efeitos recessivos na economia. O fomento ao reaquecimento de alguns setores e o combate aos efeitos da crise provada pela pandemia seriam algumas razões por trás das medidas recentes.

“Em todos eles, em um primeiro momento o governo renuncia a arrecadação pela diminuição da alíquota, porém deve ser considerado também o aumento da atividade econômica decorrente da redução do imposto, o que pode compensar parcialmente os efeitos para o estado da desoneração tributária”, esclarece o economista, reiterando, no entanto, que esse é um movimento observado também em outros países diante do aumento da inflação impulsionada pela escassez de insumos agrícolas e industriais e pelos efeitos da Guerra entre a Rússia e a Ucrânia

“Esses elementos externos têm gerado fortes efeitos na economia brasileira, principalmente de inflação, o que enseja medidas do setor público para conter tais efeitos. Estamos vendo alguns exemplos, como a redução do ICMS de alguns produtos, especialmente da gasolina, o que visa conter a escalada de preços percebida desde o último ano e que afeta diretamente as famílias que possuem carros, além de empreendedores como motoristas de aplicativo e taxistas”, analisa Melo.

No curto prazo, os efeitos da redução de impostos já são sentidos no dia a dia do consumo da população. No Brasil, o preço médio da gasolina caiu de R$ 7,39 o litro no fim do junho para R$ 5,89, segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Já nesta semana, a redução do ICMS no Pará conteve a alta prevista nas contas de energia. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) aprovou um reajuste médio de 15,12%, no entanto o consumidor final deve perceber uma redução de 5,24% em decorrência do decreto estadual que fixou a alíquota do tributo em patamar menor.

Contudo, Sérgio Melo ressalta que é preciso atenção dos governos para que não ocorra distorções de arrecadação e tratamento desigual entre produtos e atividades econômicas no futuro. “É necessária a elaboração de um planejamento orçamentário específico para momentos economicamente desafiadores, com mecanismos de reajuste de curto, médio e longo prazo”, defende.

Benefícios fiscais incentivam desenvolvimento do agronegócio no Pará

O planejamento adequado de uma política fiscal é diferencial para que os benefícios da desoneração sejam mais perenes. No Estado do Pará, uma lei que oferece tratamento tributário diferenciado tem fomentado o desenvolvimento da cadeia produtiva da carne há mais de 15 anos.

Francisco Victer, coordenador do movimento Aliança Paraense pela Carne, lembra que antes da sanção da Lei nº Lei nº 6.914, em 2006, o cenário da atividade era de crescimento desordenado, falta de controle fiscal e riscos sanitários e ambientais. “Eram poucas as opções de indústrias e quase todas situadas no Norte do Estado, obrigando à maioria dos produtores a vender o gado bovino para outros estados, impossibilitando a verticalização e a agregação de valor aos produtos da pecuária no Pará”, afirma.

A implementação dos incentivos fiscais para a pecuária veio acompanhada de uma série de outras medidas, como a observância do macrozoneamento econômico-ecológico do estado, que identificou as vocações produtivas das diferentes regiões. Nesse sentido, o tratamento tributário estabelecido pela lei teve como prioridade o atendimento de empreendimentos localizados nas regiões metropolitana de Belém, Marajó, Nordeste e Sudeste paraenses.

Além disso, a lei criou requisitos para que fosse possível ampliar a verticalização da carne no Pará focando na atração de novos negócios, na modernização dos empreendimentos já instalados, na aquisição de máquinas e equipamentos, bem como na execução de projetos de pesquisas visando o desenvolvimento de produtos ou processos.

De acordo com Francisco Victer, o objetivos previstos tem sido alcançados, contribuindo para a agregação de valor na pecuária e para a conquista de novos mercados para a produção local. “De apenas quatro indústrias de médio porte e inspecionadas até então, ao menos outras 32 indústrias foram implantadas em todo o Estado, todas com inspeção federal ou estadual. Esse processo de industrialização foi fundamental para o crescimento e melhoramento genético do rebanho, bem como para a certificação sanitária internacional com a erradicação da febre aftosa no Pará”, destaca.

Redução de imposto afeta a informalidade

Já o zootecnista Guilherme Minssen também avalia positivamente a adoção de benefícios fiscais para a indústria pecuária. O profissional que já atua há quase 30 anos no agronegócio local considera que quando o Estado diminui o peso da tributação, diminui a informalidade, se dinamiza a economia e o cofres públicos tem possibilidade de arrecadar mais.

“Essa é uma via de mão dupla porque ela acaba gerando mais renda para o estado. Você tem uma possibilidade muito clara de modernizar o parque quando se adotam novas tecnologia que tornam muito mais competitiva a gestão do negócio, além de que todo o tratamento tributário que você consegue tem um caráter socioeconômico. Ele gera inúmeros benefícios para a sociedade rural, que tem uma função social na microrregião que ele trabalha, mas também na geração de renda e na manutenção e geração de empregos”, avalia Minssen, que também é diretor técnico da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Pará (FAEPA).

Para ambos os produtores, a experiência bem-sucedida na pecuária pode ser aperfeiçoada e estendida a outros setores para que o estado mude a base de uma economia predominantemente extrativista para um modelo mais agroindustrial. Francisco Victer aponta como alguns segmentos que merecem atenção a produção de mandioca, açaí, cacau, abacaxi, dendê, soja e laranja, além da avicultura, a apicultura, a pesca e aquicultura e a silvicultura.

“Com absoluta certeza, o Governo prosseguindo e ampliando essas políticas de Incentivo, em poucos anos poderemos perceber mais sinais claros de progresso e desenvolvimento socioeconômico e ambiental do Estado do Pará”, frisa.

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