Assédios sexual e moral crescem no Brasil; empresas devem combater

O registro de casos de assédios moral e sexual nas empresas voltou a crescer em 2021 no país, após uma queda no início da pandemia da covid-19. No ano passado, foram computados 3.049 processos de assédio sexual e 52.936 de assédio moral, segundo dados do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Para efeito de comparação, 2019 e 2020 tiveram, ao longo de todo o ano, 12.349 e 12.529 casos, respectivamente.

Administrador e atuante na área de Recursos Humanos (RH), Saulo Pedroso afirma que a pandemia e o consequente isolamento social podem ter resultado direto nesses números. “Por conta das inúmeras mudanças, acredito que os gestores tenham se sentido muito pressionados e muitos não souberam lidar com isso e acabaram pressionando também sua equipe. Isso pode gerar um assédio moral. Esse momento desestabilizou a humanidade como um todo, muita gente. Antes existia muito daquela máxima: ‘da porta da empresa para dentro, o funcionário deixa seus problemas de lado’. Hoje a psicologia comprovou que não existe isso, é a mesma pessoa, não tem como separar. Passar por momentos de estresse pode gerar depressão e os gestores podem descontar nos funcionários”, afirma ele, que também integra a Associação Brasileira de Recursos Humanos no Pará (ABRH-PA).

Além disso, Saulo ressalta que a pandemia acelerou a situação do home office, que já era comum em outros países, mas não no Brasil. Com essa nova modalidade de trabalho, muitos gestores têm dificuldade em continuar seguindo as regras tradicionais e, em muitos casos, o trabalho não tem hora para começar ou terminar, as jornadas são mais longas, então os funcionários se sentem assediados moralmente em determinadas situações.

Quanto ao assédio sexual, o profissional acredita que o principal fator foram as reuniões online. Muitas vezes internas, sem muitos participantes, ele diz que fica mais fácil que o gestor tenha algum tipo de atitude que se encaixe neste comportamento. “Por levar as interações para o ambiente virtual, sem pessoas por perto e fora da empresa, muitas pessoas podem confundir”, comenta. Por outro lado, ele ressalta que pode haver um lado positivo nisso tudo e que o alto número pode significar que as pessoas passaram a denunciar mais os casos de assédio. “No meio virtual tem como gravar videochamada, ligação, printar mensagens nas telas, isso gera uma segurança aos colaboradores, porque têm como provar que o assédio ocorreu, essa é uma facilidade”, garante.

Segundo o TST, assédio moral é a exposição de pessoas a situações humilhantes e constrangedoras no ambiente de trabalho, de forma repetitiva e prolongada, no exercício de suas atividades. É uma conduta que traz danos à dignidade e à integridade do indivíduo, colocando a saúde em risco e prejudicando o ambiente de trabalho. O assédio moral é conceituado por especialistas como toda e qualquer conduta abusiva, manifestando-se por comportamentos, palavras, atos, gestos ou escritos que possam trazer danos à personalidade, à dignidade ou à integridade física e psíquica de uma pessoa, pondo em perigo o seu emprego ou degradando o ambiente de trabalho.

Já o assédio sexual, que em ambientes de trabalho pode envolver uma relação de poder, é um ‘constrangimento com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, de quem se aproveita da condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função’, conforme consta no Código Penal. Especialistas dizem que ele pode ocorrer de diversas formas, com avanços sexuais não aceitáveis e não requeridos, ou por meio de contatos verbais ou físicos, que criam uma atmosfera ofensiva, vexatória, humilhante, hostil e de subordinação.  Esse comportamento sexual pode acontecer em forma de chantagem ou intimidação. Um estudo realizado em 2021 pela Think Eva, em parceria com o Linkedin, revelou que 47% das mulheres entrevistadas já sofreram assédio sexual no local de trabalho. E outro levantamento da Mindsight, empresa de gestão de RH, aponta que mulheres sofrem três vezes mais ações de assédio sexual do que os homens.

Empresa deve combater

O setor de Recursos Humanos das empresas tem um papel muito importante no combate ao assédio moral ou sexual, pois uma de suas funções é proteger os colaboradores. “O RH entra nessa parte de cuidar das pessoas, não pode apenas fazer demissões e admissões. Para evitar assédio no ambiente de trabalho, o primeiro passo é atuar na prevenção, com treinamentos e palestras, mostrando limites, falando do home office, ressaltando cuidados que as pessoas têm que ter com as palavras para não gerar má interpretação, além de criar meios de denunciar, para que as vítimas se sintam acolhidas e ouvidas”, pontua Saulo.

Como, em boa parte dos casos, quem pratica assédio sexual ou moral não o faz apenas com uma pessoa, o administrador acredita que seja fundamental fazer a queixa, até para evitar que mais colaboradores passem pela mesma situação. Caso o RH da empresa não resolva o problema, a pessoa pode procurar a Polícia ou o Ministério do Trabalho para denunciar.

As empresas que têm essa prática de combate são capazes de mudar a realidade do assédio aos poucos, na avaliação de Saulo, porque ajudam a inibir esse tipo de comportamento. “Só o fato de estar falando deixa o colaborador mais atento. Às vezes a pessoa acha que é normal trabalhar muito, brincar de certa forma, mas se tem a conscientização ele fica mais ligado para quando alguém passar do ponto. Os gestores também vão tomar mais cuidado, porque sabem que os funcionários estão atentos. Uma empresa que esclarece isso tem mais chances de reter funcionários e trazer resultados”, avalia.