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'Meme bom tem de gerar identificação', diz criador da página Melted Videos

A mente por trás das maluquices é uma capivara - ou quase isso

Por Giovanna Wolf - AE

Com suas montagens coloridas, cheias de bonecos e personagens aleatórios, a Melted Videos se tornou uma das principais páginas de humor da internet brasileira. Criada em 2014, ela ganhou fama com seus memes ácidos e cresceu: já soma cerca de um milhão de seguidores entre Instagram e Twitter.

A mente por trás das maluquices é uma capivara - ou quase isso. O animal tipicamente brasileiro, que também simboliza a página, é o alter ego digital de Felipe Misale, 34, natural de São Carlos (SP).

Com o crescimento da página, o profissional com formação em comunicação trouxe outras cinco "capivaras" para o time - nenhuma gosta muito de aparecer. Elas se dividem para buscar referências, criar as artes, e fazer também contatos de parcerias comerciais.

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Misale dá detalhes sobre os bastidores da página, discute sua influência sobre outros meios e entrega o segredo de um bom meme: "É preciso gerar identificação".

Ainda assim, ele revela que não dá muitas risadas daquilo que sai de sua mente. "Você deixa de se emocionar", diz.

No papo, ele também fala sobre como imagina o futuro da página, que deve passar fora do TikTok, atual sensação entre as redes sociais. "Somos muito 'tios' para isso", diz.

Confira a entrevista.

Comecei a página porque estava entediado no trabalho, sentindo que minha criatividade estava limitada. Passei, então, a editar vídeos. Nessa época, eu me inspirava bastante na onda da estética anos 80. Criei a Melted Videos primeiro no YouTube e no Facebook em 2014, mas foi na eleição de 2018 que percebemos o tamanho da página. Começamos a soltar vídeos com o "funk do sax", que viralizaram.

Desde o começo a ideia era não ser aquele tipo de influenciador vaidoso, que começa a ter reconhecimento e passa a aparecer nos Stories falando coisas nada a ver. A "cara" da Melted é a capivara. Sempre fui muito tímido, então criei essa personagem. Fiz vídeos de uma capivara pensando em coisas e falando. No fim, acabou virando um alter ego, uma personalidade que eu gostaria de ter tido.

Temos três grupos no WhatsApp. Um deles é para questões administrativas, como oportunidade de parcerias. Outro é para curadoria: tudo o que vemos de legal na internet, desde um print do Twitter, jogamos lá - nossos memes autorais também colocamos lá primeiro. O que faz mais sucesso nesse grupo de curadoria encaminhamos para um terceiro grupo, que é de organização de postagem. Dividimos tudo e cada um é responsável pelos posts de determinado horário - e no final de semana fazemos escala.

Criamos um estado de humor diário, de acordo com as notícias do Brasil. Imaginamos como se fosse uma pessoa mesmo: como vamos amanhecer hoje? Estaremos felizes ou tristes? Quando a Karol Conká saiu do BBB, por exemplo, todo mundo estava feliz no dia seguinte, então publicamos memes nessa linha. Também estamos em um esquema que postamos primeiro no Twitter, e o que dá mais certo levamos para o Instagram.

Identificação. O meme só vai funcionar se você se ver nele: a pessoa precisa se enxergar naquela situação ridícula. Quem acorda motivado? Praticamente ninguém. Não é uma regra, mas os memes que mais são compartilhados são aqueles que dizem uma coisa que você gostaria muito de falar.

Algumas coisas acho que ficam engraçadas, mas não rio mais. Você fica quase com um olhar clínico de memes, e não se emociona. Na verdade, acho que a Melted nunca foi um humor de gargalhada. A ideia sempre foi causar um estranhamento, aquele riso que você solta de vergonha.

É quase um exercício de tela em branco. O que eu acho muito legal é pegar uma coisa tipicamente brasileira, tirar de contexto e colocar, por exemplo, ao lado de uma frase do Foucault. É criar sem ter poda, sem se preocupar com o que o chefe vai achar. Às vezes, estou andando e vem um estalo de uma frase, que poderia ser um tuíte. Mas pego essa frase e a coloco ao lado de uma imagem do (personagem) Sonic. Isso gera humor de contraste.

O feio sempre foi muito marcante para a gente. Misturamos cores que não combinam com aquelas letras do Windows bem feias, fundos degradê com WordArt, bonecos estranhos e personagens da Disney. Sempre que vou fazer uma montagem penso: como uma pessoa de 50 anos mexendo no Paint faria essa arte? Também treinamos o olhar para buscar referências. Eu acompanho grupos de mensagens de "bom dia" no Facebook.

No começo, achava que não tinha extrapolado. Quando começamos a trabalhar com publicidade, começamos a ver anúncios de muitas marcas que tinham a nossa cara. Percebemos isso também por parte de alguns influenciadores e até de humoristas na televisão. A Globo, por exemplo, sempre teve aquele humor escrachado, do chavão, do personagem gritando. Hoje eu percebo os atores trazendo um humor mais introspectivo e pessoal.

 

Sim. Desde o começo algumas marcas nos chamaram para fazer conteúdo. O ano passado foi um ano horrível para a humanidade, mas, para a gente, trouxe trabalho. Ficamos loucos, cheios de coisas para fazer. Foi quando ficamos conhecidos em todas as agências.

Sempre discutimos se devemos levar a Melted para o TikTok. A resposta é que seríamos ridículos no TikTok porque somos um bando de 'tios' que não têm nada a ver com aquele universo. Somos completamente introvertidos e não faz sentido nenhum para a gente entrar nisso. Estamos tentando transferir algumas coisas para o TikTok, mas não vai dar certo. Temos mais vontade de fazer um podcast. Sempre conversamos sobre essa data de validade e sobre a importância de se adaptar, apresentar novidades e apostar em riscos e em novas fórmulas.

 

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