Procurador alerta para risco de dano ambiental no aterro sanitário de Marituba
Prazo para funcionamento da área terminará em 30 de agosto, e ainda não se tem local definido para a destinação dos resíduos sólidos da Grande Belém
Na volta das férias, os belenenses poderão ter, ainda em agosto, um problema e tanto pela frente: como ficará a destinação final dos resíduos sólidos (cerca de 1,5 mil toneladas/dia) gerados na Região Metropolitana de Belém? O prazo da prorrogação de funcionamento do Aterro Sanitário de Marituba, mediante decisão judicial, vencerá em 31 de agosto, e até agora não se sabe de projeto para um novo espaço para receber os detritos ou outra alternativa. Não se sabe se o prazo será prorrogado novamente (a primeira prorrogação se deu em 2019 e a segunda, em 2021). O Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA), ao analisar nesta semana recursos do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), manteve a prorrogação do prazo de funcionamento do aterro até o final de agosto.
Para confirmar a gravidade da situação, o procurador de Justiça, Waldir Maceira da Costa Filho, externou, nesta quinta-feira (13), a preocupação dele com o risco de danos ambientais irreparáveis na Grande Belém, a partir do atual aterro sanitário. "Há grandes riscos de danos e desastres que podem ser ocasionadas pelo Aterro, cujos efeitos não serão apenas sentidos pela fauna, flora e população mais vulnerável de Marituba, mas por todos da Região Metropolitana", enfatizou o procurador. Ele destacou que há condicionantes ambientais que não são cumpridas pela empresa responsável pelo aterro, a Guamá Tratamento de Resíduos. "Uma das condicionantes que não estão sendo cumpridas pela empresa diz respeito ao estudo de impacto da emissão de efluentes no Rio Guamá, o que poderá impactar toda a bacia hidrográfica e a saúde da população que dela depende caso não sejam atendidos todos os critérios de segurança", asssinalou.
Na Justiça
Na terça-feira (11), por meio de julgamento em plenário virtual, à unanimidade, a 2ª Turma de Direito Público do Tribunal de Justiça do Pará (TJPA) negou provimento a dois agravos internos em agravos de instrumentos, interpostos pelo Ministério Público, que tratavam de matéria sobre o funcionamento da Central de Processamento e Tratamento de Resíduos (CPTR) de Marituba. Na ocasião, o relator dos agravos, desembargador Luiz Gonzaga da Costa Neto, informou que o órgão ministerial se insurgiu contra decisões favoráveis para prorrogação de continuidade de funcionamento do aterro sanitário de Marituba, sustentando, entre outros argumentos, ser juridicamente impossível a prorrogação.
"O Ministério Público também alegou que a decisão judicial teria sido proferida sem a prévia análise e deliberação técnica do órgão ambiental, constituindo-se em situação inadequada do ponto de vista do regramento do licenciamento ambiental e dos princípios de Direito Ambiental. Porém, o relator negou provimento aos agravos internos afirmando não haver novas circunstâncias fáticas e jurídicas para alteração de decisões anteriores, mantendo as decisões agravadas em todos os seus termos", como informa o TJPA.
Na decisão, o magistrado ressaltou que “o Código de Processo Civil de 2015 firmou o incentivo ao uso de medidas alternativas de resolução de conflitos” e que “nenhuma decisão judicial, nos autos em apreço, notadamente as que trataram da prorrogação de resíduos sólidos no aterro sanitário de Marituba, foi tomada sem a devida manifestação dos órgãos técnicos de controle e fiscalização competentes”.
De acordo com o TJPA, de janeiro de 2021 até os primeiros meses de 2023, o desembargador Luiz Gonzaga da Costa Neto promoveu várias reuniões, formação de grupo de trabalho e designações de audiências virtuais e presenciais, sempre estimulando as partes a alcançarem, por seus próprios meios, uma alternativa de solução para esta demanda social urgente e complexa.
Acordo
O TJPA homologou em 30 de agosto de 2021 o acordo proposto pelo Estado do Pará, por intermédio da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) e da Procuradoria-Geral do Estado do Pará, Município de Ananindeua, Município de Belém e empresa Guamá Tratamento de Resíduos, a fim de regular as condições e premissas da prorrogação do funcionamento do CPTR de Marituba até 31 de agosto de 2023.
A exemplo da atuação do Judiciário paraense na matéria, em 13 de setembro de 2022, estiveram reunidos representantes dos Municípios de Belém, Ananindeua e Marituba, além de Ministério Público do Estado do Pará (MPPA) e da empresa Guamá Tratamento de Resíduos para apresentação, por parte da Prefeitura de Belém, dos Estudos de Viabilidade Técnica, Operacional, Ambiental, Econômico-Financeira e Jurídica referente aos Serviços de Limpeza Urbana e de Gerenciamento de Resíduos Sólidos de Belém.
"E mais recente, em 18 de maio de 2023, em audiência coordenada pelo Poder Judiciário, as Prefeituras de Belém, Ananindeua e Marituba aceitaram a proposição do Governo do Pará para que o ente estadual tome a frente da resolução acerca da reposição dos resíduos sólidos da Região Metropolitana de Belém (RMB). A proposta foi apresentada em audiência solicitada pela Procuradoria Geral do Estado", como informa o TJPA.
Questionamentos
O procurador Waldir Macieira destacou, nesta quinta-feira (13) que os recursos do MPPA indeferidos pelo desembargador relator, cujo julgamento em plenário virtual encerrou-se no último dia 10 deste mês, referiam-se a Agravos Internos interpostos pelo Ministério Público do Estado do Pará logo após a prorrogação do acordo de 2019, "tendo em vista o MP não ter sido sequer intimado para tomar conhecimento dos termos da prorrogação propostos pelas empresa, Estado do Pará e Municípios de Belém e Ananindeua antes da decisão judicial".
Nos recursos, como explicou o procurador, "defendeu-se a incompetência absoluta do desembargador relator para prosseguir no feito, a não disponibilização dos autos ao Ministério Público para manifestação em momento anterior a homologação do acordo, e, por fim, a efetivação da prorrogação sem a devida observância dos riscos ambientais e dos inúmeros autos de infração que já haviam sido emitidos pelos órgãos ambientais em face do Aterro Sanitário de Marituba evidenciando a impossibilidade técnica de manutenção do seu funcionamento".
Waldir Macieira destacou que apesar dos recursos terem sido interpostos em meados de 2021 e se referirem a impossibilidade de prorrogação do acordo firmado em 2019, apenas foram julgados em julho de 2023, "não sendo os inúmeros apelos ministeriais atendidos ou sequer ouvidos, resultando na prorrogação do acordo que mesmo em vistas de ter seu prazo encerrado (31/08/2023) não foi integralmente cumprido tanto pelas empresas envolvidas, quanto pelo Estado do Pará e Municípios de Belém, Ananindeua e Marituba".
Ambiental
Tanto o acordo de 2019 quanto o de 2021 previam cláusulas penais aos seus descumpridores, as quais nunca foram executadas pelo órgão julgador que homologou os acordos de prorrogação, mesmo diante de vários requerimentos formulados pelo Ministério Público pedindo a multa e penalidades previstas nas cláusulas do acordo, como pontuou o procurador de Justiça.
"Ademais, para além da questão processual, não se pode perder de vista que enquanto as prorrogações do acordo são homologadas, sem os descumpridores (prefeituras e empresa) serem sequer notificados judicialmente quanto as suas falhas, a população de Marituba padece com o mau cheiro e gases tóxicos lançados pelo Aterro, ocasionando doenças a população que se torna cada dia mais vulnerável, bem como danos ambientais incalculáveis", afirmou o membro do MPPA.
Para fins de exemplificação dos riscos, o procurador acrescenta a emissão do Auto de Infração AUT-1-S/23-01-00600 emitido pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) em janeiro de 2023 à Guamá Tratamento de Resíduos, em razão do não atendimento das condicionantes nº 10,13,14,15 e 16 da Licença de Instalação nº 3235/2022, referente a implantação da Estação de Tratamento de Efluente-ETE junto ao CPTR Marituba.
O procurador Waldir Macieira apontou que desde 2019 os municípios envolvidos e o Estado do Pará assumiram o compromisso de buscar alternativas ambiental e legalmente possíveis para a demanda, "mantendo-se em completa inércia durante todo esse período, sem que lhes fossem imputadas quaisquer penalidades para tanto, encontrando-se a população da região metropolitana de Belém em meados de julho de 2023, e, repita-se, nas vésperas do encerramento do prazo do acordo de 2021 (31 de agosto), sem qualquer perspectiva de solução alternativa viável".
Não houve até o momento formalmente pedido de nova prorrogação nos autos, porém faltam aproximadamente 45 dias pra encerrar o prazo da última prorrogação homologada judicialmente, como observou o procurador de Justiça.
Moradores
Herbert Nascimento, que integra o movimento social Fórum Fora Lixão de Marituba!, destacou, nesta quinta-feira (13), que "os moradores de Marituba não aceitam a prorrogação do funcionamento do aterro sanitário no município em virtude dos danos que ele vem provocando nas pessoas, com mau cheiro, a liberação do gás sulfúrico, e a própria capacidade do aterro de receber resíduos já está exaurida". Ele declarou que desde 2013 quando o aterro começou a funcionar no município as famílias sofrem com a situação, inclusive, com pessoas tendo problemas de saúde, como doenças respiratórias e coceiras.
Acerca da polêmica da destinação final dos resíduos sólidos da Grande Belém, a Prefeitura de Marituba informa que "mantém seu posicionamento contrário a presença do aterro no município e segue buscando alternativas viáveis para o descarte dos seus próprios resíduos, inclusive com a implantação de um amplo programa de coleta seletiva na cidade, mas ressalta que a grande problemática do aterro sanitário reside nos resíduos recebidos dos municípios de Ananindeua e Belém, que respondem por cerca de 95% de tudo o que é depositado no local".
Empresa
A Guamá Tratamento de Resíduos explica, nesta quinta-feira (13) que como responsável pelo empreendimento, a empresa "não foi notificada sobre qualquer autorização ou negociação para a prorrogação das suas operações após 31 de agosto de 2023, decisão essa que depende do Estado e das prefeituras de Belém, Ananindeua e Marituba".
"Caso haja continuidade das operações, a empresa necessita de licenças ambientais e operacionais para aumentar a capacidade do aterro sanitário. Além disso, é imprescindível o reajuste nos valores cobrados por tonelada tratada, que está bem abaixo do que efetivamente é gasto pela empresa para o correto manejo e tratamento do lixo. É preciso que haja, ainda, o desbloqueio, pela justiça, de quase R$ 30 milhões, impostos à empresa". informa a Guamá.
A Guamá repassa que já cumpriu com todas as condicionantes, inclusive, com investimentos superiores aos que estavam definidos no termo. "A empresa, nos últimos anos, investiu mais de R$ 150 milhões em tecnologia e segurança ambiental, com iniciativas como a Estação de Tratamento de Efluentes, Usina de Biogás, Parque de Osmose Reversa e instalação de uma Termelétrica.
Hoje a Guamá é exemplo na gestão de resíduos sólidos em um dos maiores centros urbanos da Amazônia, contribuindo para a redução de emissão de carbono e no esforço global para conter as mudanças climáticas".
Monitoramentos
Nesta sexta-feira (14), a Guamá Tratamento de Resíduos enviou nova Nota à Redação. No documento, a empresa repassa que "nunca realizou qualquer emissão de efluente no Rio Guamá e realiza estudos em parceria com a Fadesp/UFPA para verificar a viabilidade de reincorporar ao ambiente águas que são tratadas pela empresa".
"A empresa realiza monitoramentos periódicos da qualidade da água na região de Marituba. São coletadas amostras de 11 poços de monitoramento para águas subterrâneas e 8 pontos de monitoramento das águas superficiais, que são analisadas por laboratório referenciado internacionalmente. Todos os laudos são enviados à Semas. O Aterro Sanitário recebe apenas resíduos domésticos, classe II, ou seja, não envolve substâncias como metais pesados ou tóxicos".
A Guamá informa que "estudo de dispersão atmosférica constatou que os gases emitidos pelo Aterro Sanitário não poluem, não causam danos ambientais e nem danos à saúde da população local". "O gás metano ainda é transformado em energia elétrica", comunica.
De acordo com a empresa, "as lagoas de armazenamento de chorume são cobertas com solo e essa cobertura é finalizada com mantas impermeabilizadas".
"A empresa estabelece uma relação próxima com a comunidade, incluindo visitas, com o objetivo de ouvir ativamente os moradores, compreender os problemas decorrentes da operação e promover a implementação de ações corretivas e preventivas", é comunicado no documento.
O Governo do Estado e as prefeituras municipais de Belém e de Ananindeua foram contatados pela Reportagem Integrada do Grupo Liberal, mas não responderam até o fechamento desta edição.
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