A Prefeitura Municipal de Belém e o governo do Estado se comprometeram a abrir imediatamente dois novos abrigos públicos destinados a atender venezuelanos em situação de refúgio, em Belém - em especial para atenção a migrantes da etnia Warao - , enquanto a capital ainda aguarda resposta do governo federal ao apoio que deveria ser dado ao estado de calamidade social decretado pelo município em julho passado.
Esse foi o principal compromisso firmado na manhã desta segunda-feira (27), na reunião convocada pela PMB e a Secretaria Municipal de Saúde (Sesma) para explicar os procedimentos adotados para atendimento de saúde aos indígenas venezuelanos em Belém - após a morte de duas crianças da etnia, na sexta e sábado, com suspeitas de sarampo.
A PMB reuniu com o Ministério Público Estadual (MPE), Ministério Público Federal (MPF) e Ministério Público do Trabalho (MPT), além de representantes da Secretaria de Saúde do Estado (Sespa), Secretaria Municipal de Educação (Semec), Secretaria de Estado de Educação (Seduc), órgãos de assistência como a Funpapa e também a Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh). A reunião foi classificada como emergencial e ocorreu no auditório da Codem, na avenida Nazaré.
Os dois novos abrigos serão instalados em casas a serem alugadas pelo Estado e PMB. O funcionamento deve ser previsto para assim que possível, e dependerá apenas de trâmites legais para a locação e conversações com lideranças Warao, que precisam ser ouvidas.
"Não tenho dúvida de que as condições atuais dos abrigos na Campina, onde esses venezuelanos hoje moram de aluguel, contribuem drasticamente para a saúde dessas famílias", disse o prefeito Zenaldo Coutinho, que esteve presente na reunião. "Agora esperamos a ajuda do governo federal para dar uma solução à questão dos abrigos, já que a administração municipal e o Estado estão prestando apoio em assistência, em saúde e em educação".
A previsão é que dois outros abrigos possam ser instalados pela administração municipal, assim que os recursos federais puderem ser acessados.
"O balanço da reunião foi positivo, uma vez que o abrigamento é uma das medidas que há tempos já vêm sendo cobradas do poder público municipal, estadual e federal. Essas pessoas não podem mais ficar nas ruas", avaliou Felipe Moura Palha, procurador da República.
Ele lembrou que o MPF já havia ajudado a se firmarem vários compromissos do município e do Estado com o acolhimento e atenção básica às famílias venezuelanas que há um ano começaram a se instalar em Belém. "O desabrigamento é hoje a principal causa das penúrias de alimentação e saúde pelas quais passam essas populações, que hoje vêm vivendo de aluguéis em situações insalubres".
O MPF ressalta que dez recomendações urgentes de atendimento aos venezuelanos no Pará já foram acordadas com os governos municipal, estadual e federal. São medidas para garantir abrigamento e atenção à saúde infantil e de mulheres, educação e outras. "Algumas coisas já foram feitas, mas, até o momento, são ainda insuficientes para dar conta das necessidades da atual situação", avaliou Moura Palha.
Esta segunda a Sesma divulgou que já são 12 os casos de sarampo investigados atualmente pela saúde municipal entre os Waraos em Belém. Porém, ainda aguardam-se as confirmações definitivas desses casos, incluindo o do menino de quatro meses falecido sábado no hospital Barros Barreto (confirmado com sarampo) e o da menina de sete meses falecida sexta no Hospital Pronto Socorro Municipal Mário Pinotti (ainda sob investigação de morte por sarampo, a ser confirmada por novos exames laboratoriais).
Desses 12 casos, seis tiveram sorologia positiva para sarampo, mas também aguardam exames que confirmem diagnósticos.
Rita Rodrigues, psicóloga do projeto municipal Consultório na Rua, disse na reunião na Coden que as políticas da prefeitura de atenção à saúde devem prosseguir com as mesmas estratégias, mesmo com algumas peculiaridades culturais e desafios já identificados na especificidade dos atendimentos prestados às etnias. O mesmo foi ressaltado por Vernilce Borges, enfermeira da Vigilância Epidemiológica da Sesma, e Leila flores, diretora do Departamento de Vigilância da secretaria municipal de saúde.
A menina Cleimar Rattia, de 7 meses, já apresentava há alguns dias sinais de estar com a doença. A criança estava na UTI do Pronto Socorro Municipal da 14 de Março desde o último dia 18.
A criança já havia realizado exames para possíveis diagnósticos de sarampo e vírus influenza A e B, quando foi atendida na Unidade de Pronto Atendimento (UPA) da Terra Firme, no dia 16 de agosto.
A família Warao da pequena Cleimar Rattia é uma das dezenas que hoje residem nas duas pensões mantidas por aluguéis pagos por venezuelanos no bairro da Campina, em Belém. A criança vivia com os pais na casa da Campos Sales.
Voluntários estimam que 150 venezuelanos vivam nessas duas residências, pagando diárias de R$ 30 por família, com dinheiro conseguido do trabalho como pedintes nas ruas. Segundo levantamento feito pela Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh), estima-se que até julho passado o Pará contava com 334 Waraos em todo o Estado: 229 estariam em Belém, além de outros já instalados em Santarém (54), Altamira (36) e Jacareaganca (15).
A moradia onde vivia a família da pequena Ceimar, na Campina, não tem o mesmo apoio do poder público, como ocorre na Casa de Passagem Domingos Zahluth, gerida hoje pela Secretaria de Estado de Assistência Social, Trabalho, Emprego e Renda (Seaster), na travessa do Chaco. Lá, residem hoje 82 indígenas da etnia. O abrigo é o único em todo o Estado oferecer acolhimento, alimentação e atendimento geral aos migrantes, mas encontra-se com lotação esgotada.