Biblioteca comunitária transforma vidas no bairro do Guamá, em Belém; vídeo
O Espaço Cultural Nossa Biblioteca tem 45 anos de história na capital paraense
Aos 15 anos de idade, Minéia Neíta não tinha perspectivas além de concluir o Ensino Médio e arrumar um emprego para seu sustento. Mas, parodiando o célebre poema de Carlos Drummond de Andrade, no meio do caminho tinha um livro. Na verdade, muitos livros. Ela soube de um lugar com atrações para o público infantojuvenil e, então, passou a frequentar o Espaço Cultural Nossa Biblioteca, no bairro do Guamá, periferia de Belém. Esse espaço concretiza a proposta da fundadora do estabelecimento, a missionária católica holandesa Madalena Westerweld de facilitar o acesso de crianças, adolescentes e adultos à leitura. Resultado: Minéia concluiu o Ensino Médio, formou-se em Pedagogia e hoje preside a Nossa Biblioteca, ajudando na formação de novos leitores em diferentes faixas etárias.
Na semana em que Belém recebeu a 25ª Feira Pan-Amazônica do Livro e das Multivozes, no Hangar, a reportagem conta essa história de paixão pela leitura. E Minéia e fez questão de afirmar que nunca mais largou os livros. Até porque, como ela, a história da Nossa Biblioteca tem 45 anos, ou seja, ela é, se não a mais antiga biblioteca comunitária surgida antes de ser instituição no país, é uma das mais longevas, com certeza. Esse núcleo de ações culturais e de cidadania funciona na rua 25 de Junho, entre Barão de Igarapé Miri e 3 de Outubro.
Em média, 70 pessoas circulam pelo local, das 9 às 12 horas e das 14 às 18 horas. À noite, o espaço sedia rodas de conversa, reuniões técnicas e encontros de dois grupos de Alcoólicos Anônimos.
Como ter acesso aos livros?
Na Nossa Biblioteca, encontram-se 12 mil títulos catalogados, fora os muitos que serão fichados em breve, como informa Minéia. Como cada título costuma ter de dois a três exemplares, a biblioteca acaba reunindo mais de 24 mil livros. Para ter acesso a esse acervo, basta a pessoa interessada comparecer até lá e preencher uma ficha. A preferência é para estudantes dos bairros do Guamá e da Terra Firme, pela proximidade das casas em relação ao espaço, para se evitar o extravio dos livros.
A maioria dos títulos versa sobre literatura. Mas também há livros didáticos de referência para estudo e mais obras sobre religião, autoajuda, filosofia, sociologia, pedagogia, história e administração, entre outras. Os livros são doados, sobretudo, por professores e estudantes do ensino superior, muitos pais de filhos graduados. Pedagoga com especialização em Garantia de Direitos, Minéia Neíta declara-se apaixonada pela Biblioteconomia.
No espaço reunindo voluntários e algumas pessoas contratadas, o público tem oportunidade de ler livros e também participar de oficinas programadas sobre musicalização, teatro, dança, contação de histórias, de slam (poesia cantada) e outras. “Quem mais fica na biblioteca lendo mesmo são os adolescentes. Eles aproveitam para conhecer obras, autores, e conversar sobre o que leem”, repassa Minéia.
“A Nossa Biblioteca contribui com o desenvolvimento de crianças e adolescentes de bairros da periferia da capital paraense, na medida em que essas pessoas passam a usufruir do espaço na faixa dos seis anos de idade e costumam permanecer no projeto até os 17 anos. Aos 14 anos, elas entram para a formação de mediadores de leitura - jovens que passam a atuar na biblioteca,ou seja, atendendo e orientando a quem chega em busca de conhecimentos novos por meio da leitura”, diz a educadora.
“Aqui é uma referência para o bairro, para os estudantes melhorarem o desempenho nos estudos, e muitos deles hoje estão formados, depois de quando crianças frequentarem a Nossa Biblioteca”, destaca Minéia. Ela ressalta que o acesso aos livros contribui para que muitos adultos tenham consciência acerca dos seus direitos e deveres. “Eu mudei a minha vida a partir da biblioteca e agora, este ano, completo 15 anos atuando nesse espaço”, diz Minéia, aos 42 anos de idade. Ela lembra o caso de uma mãe que, a partir do contato com os livros, voltou a estudar e pretende fazer um curso superior”.
Mudança de vida foi também verificada na vida de Naura Figueiredo, 32 anos. Essa dona de casa e artesã mora na passagem Rossy, perto da Augusto Corrêa. Casada e com dois filhos, ela pretende fazer o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), para uma vaga no curso de Medicina Veterinária.
“Eu não vinha antes para a biblioteca, mas, depois, o meu filho e a minha filha passaram a frequentar o espaço e eu vim; então, eu posso dize que sou uma pessoa antes e outra depois da biblioteca, porque eu não tinha perspectiva de vida, era uma dona de casa e só, mas, agora, eu quero aprender mais, eu estava ancorada e agora o meu navio pode ir para onde eu quiser”, afirma. Naura atua como mediadora de leitura e professora em projeto social da Nossa Biblioteca.
Estudantes de escolas públicas são incentivados à leitura
O Governo do Estado e a Prefeitura de Belém adotam ações propulsora do hábito de leitura entre estudantes em escolas públicas estaduais e municipais. No caso da Secretaria de Estado de Educação (Seduc), o órgão informa que dispõe de 584 bibliotecas em todo o Pará e “acredita que a leitura é um instrumento fundamental para a transformação de vidas, considerando que quem lê, amplia o vocabulário, desenvolve a escrita, aprimora a capacidade de interpretação textual e proporciona o conhecimento sobre assuntos gerais”.
Além disso, externa a Seduc, “a leitura estimula a criatividade e o poder de comunicação, sendo um exercício fundamental para a memória e concentração, a qual colabora principalmente para a saúde de todos que praticam esse hábito”.
Assim, como repassa o órgão, o Governo do Estado, por meio da Seduc, tem incentivado o acesso da comunidade escolar às obras literárias, seja abastecendo e dotando as bibliotecas com acervos regionais, nacionais e internacionais, com equipamentos tecnológicos e realizando ações de mediação de leituras.
Outra iniciativa, desta vez destinada a mais de 19 mil profissionais da educação da rede pública estadual, é o programa de fomento à leitura, o Credlivro, benefício este garantido por lei que disponibiliza o valor de R$ 200,00 durante as edições da Feira Pan-Amazônica do Livro e das Multivozes.
Em Belém, projetos impulsionam a leitura de mundo por estudantes
Na Prefeitura de Belém, a Secretaria Municipal de Educação (Semec) promove o incentivo à leitura nas escolas municipais a partir de vários projetos de leitura, letramento e literatura, para desenvolver o senso crítico, consciente e participativo dos mais de 69 mil estudantes do município.
“Este trabalho é desenvolvido pelo Sistema Municipal de Bibliotecas Escolares (Sismube), que atua em projetos como ''Mediação de Leitura'', ''Baú das Histórias'', ''Biblioteca Gitinha'', ''Artistagens do Esperançar'', proporcionando o acesso, em especial, à literatura infanto-juvenil paraense, tanto na educação infantil quanto no ensino fundamental”, repassa a Semec.
A rede municipal de ensino conta com 83 bibliotecas escolares e 90 escolas recebem o projeto itinerante “Baú das Histórias” que fomentam entre os estudantes à imaginação, a criatividade e a leitura de mundo diante da sua realidade.
Uma ação da Prefeitura é o programa Alfabetiza Belém, que busca alfabetizar mais de 11 mil pessoas até 2024, promovendo uma leitura de mundo. Este projeto inclui alfabetizar indígenas da etnia Warao, tanto na língua portuguesa quanto na língua materna-espanhol.
A Prefeitura de Belém informa, ainda, que pela primeira vez concedeu bônus livro em 2021 para todos os profissionais da educação para a Feira Pan-Amazônica do Livro e das Multivozes. E neste ano, concede novamente, incluindo a I Festa Literária de Belém, da Bienal de Artes de Belém, num investimento de R$ 2.824,400 distribuídos em bônus de R$ 200, cada.
Palavras-chave
COMPARTILHE ESSA NOTÍCIA