BBB gera debates sobre vitiligo; conheça a histórias de pessoas e entenda melhor a doença autoimune
Dermatologista conta que descobriu vitiligo aos sete anos e que a doença a levou a seguir a área médica
A Biblioteca virtual em saúde, do Ministério da Saúde, caracteriza o vitiligo como uma doença da perda da coloração da pele, devido a diminuição ou ausência de melanócitos, que são as células que produzem melanina, que pigmenta a pele. Com a entrada da participante Natália Deodato no reality show Big Brother Brasil (BBB 22) tem gerado debates sobre a doença, que não é contagiosa, mas autoimune e que gera manchas brancas pelo corpo de quem convive com o vitiligo.
A médica dermatologista Marcella La-Rocque, 36 anos, descobriu aos sete anos de idade o vitiligo e, por isso, na vida adulta decidiu fazer residência em dermatologia. A maranhense, filha de pais paraense desde criança encarou com tranquilidade a doença, melhor até que os pais, conta.
"Descobri que tinha vitiligo aos sete anos, então não tive reação. Meus pais tiveram. Levaram-me a vários dermatologistas até acreditarem no diagnóstico. Acredito que na época a condição era ainda mais estigmatizante. Penso que eles tinham medo da minha reação ao crescer. Fiz vários tratamentos, desde a medicina tradicional a medicina alternativa... Essa foi uma das perguntas na entrevista pra residência médica em dermatologia no Rio de Janeiro: 'foi por causa do vitiligo que quiseste fazer medicina?'. Meus pais inicialmente demoraram a aceitar. Tinham medo de me ver sofrendo. Mas quando perceberam que eu não me importava com isso, me fizeram ajudar as pessoas", explicou.
Marcella recorda que a mãe levava as pessoas que tinham acabado de descobrir o vitiligo, para conversar com ela, quando tinha entre 12 e 15 anos e conta que por entender as dores e questionamentos das pessoas, seguiu na dermatologia. "Assim eu conversava com elas, mostrava minha dose de amor próprio e acho que assim fui 'empurrada' para a dermatologia. Eu adorava ajudar as pessoas nesse sentido. De fato, acho especial compreender melhor meus pacientes, uma vez que sei o que é ter uma doença crônica, ou seja, que não tem cura. Entendo as dores e ás vezes até da vontade de não tratar e respeito isso. Atendo inúmeros pacientes com vitiligo. Até porque trouxe pra minha cidade, Imperatriz, o tratamento de primeira linha que é a fototerapia UVB-NB (UVB NarrowBand)", comentou.
"Vou te falar que de início eu mesma cheguei a imaginar: 'quem vai querer se tratar comigo se não posso me curar?'. Um pensamento muito tolo, não acha? Tolo e leigo. Conforme fui estudando e na própria residência vi que os pacientes se identificavam comigo. Eu também tinha dores a compartilhar, além de formas a contorná-las. A resposta do tratamento é individual, mas o fato de ter vitiligo facilita sim na adesão ao tratamento e na autoconfiança", completou.
Como profissional da área, a dermatologista explica que o vitiligo é uma doença genética, crônica - não tem cura - e tem origem autoimune. Ela explica que as células de defesa não reconhecem os melanócitos e por isso os atacam, causando a destruição e, por isso, causa a ausência de produção da melanina naquela área.
"Em resumo podemos dizer que nossas células de defesa não reconhecem os melanócitos como parte do nosso organismo. E eles são as células que produzem a melanina, que é o pigmento que dá cor a pele. As células de defesa destroem os melanócitos porque se 'confundem' e acham que eles são intrusos. Uma vez destruídos, não temos mais as células que produzem cor a pele, e então vemos as manchas brancas características da condição. Não existe prevenção, já que tem origem genética. Meus pais, por exemplo, não tem vitiligo, mas o gene foi herdado de um deles", ressaltou.
O mais importante, destaca a médica, é falar que não se trata de uma doença contagiosa e que precisa de uma tendência genética para desenvolver. E explica que o preconceito ainda é muito presente e que os gatilhos emocionais, como estresse podem causar o aparecimento das manchas ou aumentá-las para quem já tem a doença.
"As regiões mais fáceis de ter vitiligo são as zonas de atrito do corpo: joelhos, cotovelos, mãos, face e região genital. Na maioria das vezes não apresenta sintoma algum. Apenas alguns casos podem ter uma coceira leve. Traumas mecânicos podem desencadear o vitiligo. Chamamos de fenômeno de Köebner, onde machucamos pode virar lesão. Então devemos tomar cuidado com cirurgias eletivas, procedimentos ou esportes que gerem muitos traumas mecânicos. O estresse não é uma causa, mas um gatilho para o surgimento das manchas ou a piora das mesmas. Infelizmente ainda há preconceito. Prefiro acreditar que seja pela falta de informação. Eu mesma na infância já fui retirada de piscina. Na adolescência, já vi manicures brigando pois não queriam fazer minhas unhas, uma vez que tenho vitiligo nos pés e mãos. Sem falar nos olhares e comentários. Mas eu amadureci, estudei e me fortaleci. Mas sei o quanto isso pode ser doloroso pra quem ainda está em processo de aceitação. Podemos vencer isso com informação!", reforçou.
Natália Deodato participante do BBB gera identificação e debates na web sobre vitiligo
Desde que o Big Brother Brasil 2022 começou, os debates a respeito de vitiligo foram suscitados na casa mais vigiada do país e também na internet. A modelo Natália Deodato, 22 anos, trouxe o debate para o programa e repercutiu do lado de fora. Alguns posicionamentos são carregados de preconceitos, como a declaração do ex-BBB Nego Di ao chamá-la de dálmata, fazendo referência as manchas brancas na pele. Quem convive com a doença reforça que os abalos psicológicos são constantes, pois a autoestima oscila, principalmente, devido as críticas e ofensas externas.
A jornalista Mayara Souza, 27 anos, descobriu aos 12 anos o vitiligo e conta que aconteceu logo após a separação dos pais, o que causou um grande abalo psicológico. As manchas brancas começaram a surgir em várias partes do corpo, mas principalmente em uma das pernas.
"Eu sofri alguns traumas devido a separação dos meus pais. Após isso, surgiram algumas pequenas manchas, em lugares diferentes do meu corpo, e uma bem grandona na minha perna. Na fase da adolescência eu sofri bastante preconceito, as pessoas perguntavam se era mancha? Queimadura? Me chamavam de mesclada, malhada! Foi bem difícil lidar com essas 'brincadeiras de mal gosto'. Eu era muito vaidosa, e nessa fase da infância e adolescência essas críticas machucaram muito", relatou a jovem.
Mayara relembra que na época fez acompanhamento profissional, mas não conseguiu dar continuidade ao tratamento, por conta dos remédios que eram caros. Já adulta, ela resolveu trabalhar as inseguranças e fazer a tatuagem de um desenho animado, em cima do vitiligo, e hoje conta que faz parte e até esquece da doença. A jovem acredita que a representatividade em um programa de televisão aberta é muito importante.
"Na época eu também fiz um breve acompanhamento com uma dermatologista e psicóloga. Os remédios eram caros, então fiz pouco tempo de tratamento. Fiz uma tatuagem em cima do vitiligo da perna na tentativa de esconder. Passei anos até aceitar e superar, mas hoje eu não me importo com os julgamentos externos. Acredito que com a presença de uma personalidade influente, as pessoas podem sim repensar sobre o assunto e procurar compreender melhor antes de julgar", completou a jornalista, referindo-se a figura de Natália que também tem vitiligo e está no BBB", ressaltou.
Marcella La-Rocque,Acho se sente representada e acredita que outras pessoas também se sentirão assim, vendo uma mulher com vitiligo em rede nacional. "Excelente ter uma participante linda e com vitiligo. Independente de como será sua trajetória no programa, me sinto sim muito representada. Tenho certeza que os debates com o tema vitiligo irão aumentar, o que é ótimo pra combatermos a desinformação e o preconceito. Representatividade é de suma importância. Tenho uma paciente que vai a consulta com sua Barbie com vitiligo. Temos modelos com vitiligo e agora temos uma BBB!", finalizou.
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