Alagamentos deixam moradores de rua mais vulneráveis
Eles se protegem como podem das fortes chuvas, mas tiveram colchões e alimentos levados pelas águas
As chuvas fortes em Belém aumentam a situação de vulnerabilidade das pessoas em situação de rua. Normalmente invisíveis aos olhos da sociedade, esses homens e mulheres ficam ainda mais expostos à ação da natureza e, também, à falta de políticas públicas eficazes dos governantes. Dalcilei Rodrigues dos Santos tem 30 anos e vive na área do Mercado de São Brás. Oriundo de Moju, no interior do Pará, ele está na capital quase há seis anos. Disse que veio em busca de trabalho, já que a serraria onde trabalhava, naquele município, foi fechada por órgãos ambientais, provavelmente pela prática de irregularidades. E, desde que chegou em Belém, mora na rua.
Na hora do temporal, ele e sua companheira, Brenda, de 23 anos, se protegem como podem. Nem sempre há lençol para eles se cobrirem. O calor humano ameniza, um pouco, o vento frio. É a mesma situação, aliás, de outras pessoas que vivem naquele espaço. "Tem um rodo aqui. Quando a chuva bate, a gente empurra a água para lá", contou Dalcilei, sentado no colchão com sua mulher. Ele afirmou que, nesse período de chuvas fortes, nunca apareceu ninguém do poder público para dar apoio a quem mora no mercado.
"Vem só os irmãos evangélicos. Eles trazem sopa, medicamento, uma roupa. Da prefeitura não veio ninguém", afirmou. "A gente fica aqui e a chuva caindo. Aqui eu considero como minha casa. Eu limpo, não deixo bagunçar. Antes, o pessoal vinha, urinava, fazia as necessidades aí. Agora não. A gente cuida daqui", disse. Dalcilei também contou que ganha a vida carregando carrinhos de lanche, levando-os até uma garagem, localizada ali mesmo no mercado. "Eu ajudo a subir e descer (os carrinhos). E ganho um real, dois reais. Assim vai, ganhando o pão de cada dia", afirmou, acrescentando que não tem parentes residindo em Belém.
Na avenida José Bonifácio, sob a marquise de uma antiga concessionária de veículos, ainda no bairro de São Brás, também vive um grupo de pessoas. Eles contaram que essa área alaga muito durante as chuvas. Por ser um local aberto, não há como eles se protegerem dos temporais. "Enche tudo aqui. Alaga. Tem urina de rato... E nós vamos para a Caixa Econômica (cujo prédio fica ali perto, no cruzamento com a avenida Governador José Malcher)", disse Josinete de Souza Cezário, a Nete, 44, que vive em situação de rua desde os 11. Ela contou que, por causa das chuvas, o grupo já perdeu alimentos, entre os quais arroz, e também colchões. "A água levou três colchões da gente", lamentou.
Nete também afirmou que, nesses dias de muita chuva, representantes do poder público não aparecem nesse local. "Eles (os governantes) podiam dar uma força pra gente sair da rua", disse ela, que, por causa de problemas familiares, saiu de sua casa, em Tucuruí, também no interior do Estado, e veio, ainda criança, para Belém. Na parede daquela antiga loja de veículos, o artesão Levy, que assina artisticamente como "Art,Vy", faz pinturas legais. Uma delas diz: "Fazer o bem sem saber a quem". São imagens de uma artista de rua e que amenizam o sofrimento diário dessas pessoas.
A reportagem entrou em contato com a Prefeitura de Belém, que não se manifestou até o fechamento desta edição.
Palavras-chave
COMPARTILHE ESSA NOTÍCIA