Comunidade acolhe idosos e pessoas em situação de rua de Belém
Movimento da Igreja Católica trabalha para restaurar vidas por meio da palavra de Deus
Estima-se que cerca de 2,4 mil pessoas vivam em situação de rua em Belém, de acordo com a Fundação Papa João XXIII (Funpapa). Acolher esses cidadãos, jovens ou idosos, e lutar pela reconstrução e acolhimento de cada um é o objetivo da Comunidade Missão Belém, movimento da Igreja Católica que busca promover uma resposta social frente às desigualdades e os vícios particulares de cada um, como drogas e álcool. Para isso, os caminhos do Evangelho e uma rotina voltada à oração e doação ao próximo são fundamentais no processo de cura de quem aceita a proposta de vida nova.
A comunidade teve início em São Paulo, no ano de 2005, e está espalhada pelo Brasil todo. Foi após a observação de que as pessoas em situação de rua precisavam de mais do que só comida, que os primeiros missionários começaram a se organizar para levar a palavra de Deus e o convite de mudança. No Pará, o sítio que acolhe a população em restauração fica em Santa Isabel, Região Metropolitana de Belém. Atualmente, 164 homens fazem parte das atividades diárias da comunidade. Entre idosos, cuidadores e acolhidos, cada um tem um trabalho diferente e um propósito durante a caminhada espiritual.
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Responsável geral pela missão da comunidade no Pará, padre Divã de Sousa explica que, inicialmente, um processo de conversa é feito para que as pessoas entendam a situação que estão e tenham vontade de mudar de vida. “A gente vai até eles na rua, fazemos essa forma de evangelização, tentamos apresentar um projeto de vida, dar uma nova ideia para eles. Mesmo eles estando na rua, acreditam que estão bem, que são livres e não precisam sair daquela realidade. Então, nosso trabalho é despertar isso. Quando a gente desperta, eles vêm. Mas, também, tem aqueles que os próprios irmãos que já passaram por essa casa convidam”, diz.
Rotina
O caminho de cada pessoa é traçado ao longo de seis meses, tempo estabelecido para o desenvolvimento do trabalho de reestruturação, e envolve informações religiosas, catequéticas, humanas e meditação diária. Quem não é batizado, recebe o batismo e aprende diariamente sobre a igreja. “A gente acredita que a partir da palavra de Deus, eles podem mudar de vida. Se Deus entra, a droga sai. Eles ficam nesses meses, fazem um projeto. Então, ou retomam a vida [após o processo], ou fazem algum trabalho. Se não estiverem prontos, ficam mais seis meses para se preparar para essa saída”, detalha o padre.
Tanto os idosos que são cuidados, quanto os acolhidos que cuidam, tem uma rotina específica. Ela envolve oração, preparação de alimentos, cuidados com as hortas e animais. “A gente inicia o dia sempre com meditação pela manhã. Eles tiram um propósito, que a gente chama de diário espiritual, isso ajuda a fazer a restauração. Depois vão fazendo os trabalhos, começam por volta das 8h, a gente chama de laborterapia, que é uma atividade que ele vai fazer dentro da comunidade, quem trabalha com os idosos, cuida deles, quem sabe fazer comida, faz o almoço. Cada um vai ser direcionado para uma realidade”, relata.
Formação espiritual ajuda a contornar crises
A irmã Josiane Angelon, de 42 anos, é uma das missionárias envolvidas no trabalho de restauração que a Comunidade Católica Missão Belém oferece. Ela conta que o objetivo maior do projeto é a evangelização. “É levar as pessoas que a gente cuida a conhecer e fazer essa experiência de uma vida nova em Deus. Esse é nosso maior objetivo, através de todo trabalho que a gente desenvolve, da evangelização, formação e tudo aquilo que a gente proporciona, é fazer com que as pessoas façam a experiência com Deus, como um dia nós fizemos. A gente espera que, a partir disso, a pessoa consiga reestruturar a sua vida”.
A acolhida recebida e a rotina que a Comunidade promove proporciona uma realidade que, na maioria dos casos, já foi esquecida: a de amor e doação. “Isso proporciona a esses irmãos algo que eles mesmo falam: que nunca foram tão bem acolhidos, não conheciam nada, nem ninguém, estavam jogados na rua. Mas, aqui, encontraram ajuda e amor e também querem fazer a mesma coisa, se colocando a ajudar. A partir disso, eles começam a se doar, fazendo um pequeno trabalho, servindo um almoço, limpando a casa, conversando, às vezes, com um irmão mais novo que chega…”, conta a religiosa.
Esse sistema de ajuda mútua é fundamental quando novos acolhidos chegam. Josiane explica que a euforia causada pela falta dos entorpecentes, geralmente, é motivo para muitos terem desejo de ir embora. “A pessoa que já está caminhando por um tempo e já passou por isso, tem a oportunidade de sentar com esse irmão e partilhar, para que ele possa ouvir e desabafar. A gente fala que é náufrago salvando náufrago, porque mal a pessoa está conseguindo se salvar e já estende a mão para outro que está chegando. Eles vivem essa entrega recíproca”.
Comunidade precisa de ajuda para manter trabalho voluntário
De remédios à roupas, material de higiene e alimentos, a Missão Belém vive por meio de doações e ajudas de pessoas parceiras. No sítio em que as atividades funcionam, há o plantio em horta, mas, nem sempre, a quantidade consegue atender os moradores. “Os nossos recursos são totalmente vindos da providência, da doação de pessoas que tem um bom coração e querem colaborar com esse trabalho. Alguns gostariam de estar aqui entregando a vida, mas não podem, então, ajudam financeiramente. A gente vive totalmente de doações e pessoas que se sensibilizam”, completa a irmã Josiane.
Testemunho de mudança
A taxa de porcentagem de pessoas completamente restauradas na comunidade é de 50%. Isso é, metade de quem é acolhido na Comunidade Missão Belém fica completamente livre dos vícios. Esses são os que aceitam a totalidade do que é proposto, como é o caso do Felipe Viana, de 29 anos. Ele conheceu o movimento em março de 2018, por meio de um familiar. Na época, envolvido no mundo do crime e das drogas, morando em uma rua no bairro do Jurunas, em Belém, a expectativa era passar apenas alguns dias no sítio para descansar e, depois, voltar à rotina.
“Foi bem difícil no começo, eu não conhecia nada, não sabia que ia me adaptar, tinha o pensamento de ficar um ou dois dias e ir embora. Esse é o pensamento que a gente tem. Cheguei, fui bem acolhido pelos irmãos que estavam no processo de restauração, me abraçaram, apresentaram a casa, igual uma pessoa comum faz lá fora quando chega visita, me deram roupa, uma cama, me oferecem algo para comer e eu pensei que nem minha família faz isso por mim. Aquilo me cativou, me deixou feliz de receber um abraço de alguém que eu não conhecia”, relata Felipe.
A motivação para mudar de vida veio, ainda, do exemplo que Felipe dava aos filhos. Ele conta que ficou triste em ouvir uma das duas crianças dizer que queria seguir seus passos no mundo do crime. “Meu filho falou que queria ser igual a mim, queria ser ladrão. Aquilo me deixou muito triste. Depois que eu conheci a comunidade e comecei a rezar, ensinei a ele e ele também já reza. Hoje, como faço faculdade de enfermagem, ele já diz que quer ser médico. Ele veste meu jaleco e eu me lembro lá de trás. Ele já não me vê mais como uma pessoa que roubava e usava drogas, mas como um pai que é presente”, finaliza.
Ajude a Comunidade Católica Missão Belém
O movimento precisa de remédios, material para curativos, roupas e alimentos
Endereços: estrada do Cupuaçu, 2.304, Benevides
Rua Luiz Pretestato de Souza, Benevides
Travessa São Francisco - Parque Verde, Belém
Contato: (91) 99201-3797
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