Forma de democracia participativa pode resolver gargalos no Pará

Dimensões territoriais do estado são verdadeiros entraves para que a voz da população seja ouvida de forma igualitária. No entanto, especialistas afirma que prática é fundamental para a realidade da região.

Camila Azevedo
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A Constituição de 1988 criou no Brasil um sistema chamado de democracia participativa. A ferramenta vai além das decisões tomadas no Legislativo e no Executivo e encontra formas de alcançar a população dentro desse processo por meio de algumas práticas, como as consultas públicas. A implantação do modelo é benéfica em todas as partes do país, mas em estados como o Pará, que possui uma vasta dimensão territorial, é ainda mais especial, uma vez que as longas distâncias são somadas à grande pluralidade econômica, política e cultural existentes, havendo a necessidade de ampliar a escuta dos moradores para a criação de medidas eficazes a todos.

Especialistas consideram que a democracia participativa é uma alternativa à representativa. Isso porque as instituições, apesar de conterem entes eleitos pelo povo, são limitadas em abarcar as demandas da sociedade. Por isso, envolver a população é fundamental: as atividades que são consideradas parlamentares passam a ser cotidianas da população. No entanto, o grau de eficácia depende da mobilização social. Em campos, por exemplo, como a saúde pública, realizar conferências têm uma grande influência na implementação de ações mais direcionadas para o setor - não apenas definindo diretrizes, mas também fiscalizando a execução de projetos.

Apesar de necessárias, as consultas públicas, um dos mecanismos da democracia participativa, ainda enfrentam desafios. Antônio Gomes Moreira Maués, professora titular da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Pará (UFPA), explica que é fundamental que um grande número de pessoas seja envolvido no processo para que ele tenha sucesso. “No Brasil, o voto é obrigatório e, portanto, a ampla maioria da sociedade participa, quando você cria esses canais de democracia participativa, quando você realiza consultas públicas, é importante envolver o maior número de pessoas interessadas, de grupos sociais, organizações da sociedade civil para que ela seja realmente representativa”.

Pouco avanço

O professor destaca que, mesmo com a importância do processo, pouco avanço foi feito nas últimas décadas. “Os instrumentos de democracia participativa avançaram mais em alguns campos do que em outros”, afirma. No que se refere a políticas públicas sociais, uma série de ferramentas foi desenvolvida, como conselhos municipais, estaduais e federais, realidade que não é tão vista quando o assunto é economia. “Decisões de caráter econômico, por exemplo, em geral estão isoladas e não contam com esses mecanismos de consultas públicas. Decisores sobre investimento público, sobre obras de infraestrutura, não costumam ser submetidos a uma consulta a menos que haja uma questão ambiental envolvida”.

Em 2012, o Pará passou por uma consulta pública para saber a opinião da população sobre a divisão do estado. A ação do governo estava vinculada à decisão do povo e, por isso, não houve a criação de novas unidades federativas a partir do território paraense. Antônio Gomes lembra que “essa é uma decisão que nós chamamos de caráter vinculante, ou seja, o poder público tem que seguir aquilo que foi decidido pela população em plebiscito”. “Portanto, consultas públicas são esses mecanismos, esses instrumentos, por meio das quais o Estado, o poder público, ouve à sociedade no seu processo de tomada de decisões, ouve à sociedade para tomar as decisões sobre um determinado tema de interesse público”.

Consultas públicas ajudam a entender a realidade do Pará 

De acordo com o cientista político Renan Bezerra, as dificuldades geográficas do Pará são determinantes para que as desigualdades sejam proporcionalmente grandes. O estado detém 14,6% de toda a superfície do Brasil e é o segundo maior em questões territoriais, ficando atrás do Amazonas. “Então, a gente não consegue ter o mesmo tipo de formação econômica, cultural e social. Tem município que tem formação muito diferente da capital [Belém]. Se pegarmos uma cidade mais ao sul, vamos ter um tipo de formação histórica, social e econômica, um tipo de setor produtivo mais ou menos avançado. Por isso, eles podem pensar de forma diferente”, enfatiza.

“É importantíssimo que você ouça a população em cada região, cada município… É importante pela diversidade que nós temos [dentro do estado]. O efeito positivo é que você entende melhor a cabeça da sua população sobre o que pensa; e serve como uma ferramenta de transparência pública. [Porém], tem efeito negativo. Um determinado tema pode sofrer pressão de determinados grupos de interesse, que podem acabar mascarando essa consulta pública em detrimento de vontades particulares”, completa o cientista político.

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