Casos de violência doméstica aumentam 25% no Pará em 2023
Criminalista explica que o aumento do acesso à informação à população acerca do assunto; as alterações sofridas recentemente na legislação brasileira; e a atuação repressiva do Estado contribuem para que o número de denúncias cresça
Os casos de violência doméstica cresceram 25% no estado do Pará, nos sete primeiros meses deste ano, segundo dados da Secretaria Pública e Defesa Social do Pará (Segup). Os registros do órgão apontam que em 2022, de janeiro a dezembro, foram computados 10.085 casos. Em relação ao período de janeiro a julho, foram registradas 5.168 em 2022 e 6.473 ocorrências em 2023. “O aumento de 25% se dá em função das medidas de combate à violência e a criação dos canais de denúncia do Governo do Pará, como por exemplo: o sistema ‘Alerta Pará Mulher’, o aplicativo SOS Maria da Penha, o Programa Pró-Mulher Pará, além da ampliação do atendimento de algumas delegacias especializadas para 24h, e da criação da Delegacia Especializada em Feminicídio e Outras Mortes Violentas contra Gênero (Defem)”, justificou a Segup.
Sobre as ocorrências de feminicídio, a secretaria informou que, de janeiro a julho de 2023, foram registrados 32 casos. No mesmo período de 2022, foram 34 ocorrências, o que representa uma redução de 6%. No período de janeiro a dezembro de 2022, foram registrados 49 casos do mesmo delito em todo o Estado, de acordo com o órgão.
Para a advogada criminalista Adriana Ribeiro, especialista em crimes contra a vida, em relação à violência doméstica, “a criação de instrumentos de denúncia, como canais de atendimento de fácil acesso para a população, e as políticas públicas de incentivo fazem com que os números cresçam”. “São vítimas que sempre sofreram violência, mas que estavam à margem dos dados estatísticos”, analisa.
“Os dados demonstram que a soma das três grandes forças de combate à violência de gênero estão cada vez mais trazendo resultados efetivos. São essas: o aumento do acesso à informação à população acerca do assunto; as alterações sofridas recentemente na legislação brasileira; e a atuação repressiva do Estado diante da violência pela condição do gênero feminino”, destaca a advogada.
Campanhas de conscientização também são importantes aliadas no combate aos crimes contra a mulher. O Agosto Lilás, por exemplo, é um movimento de enfrentamento à violência doméstica e também surgiu com objetivo de divulgar a Lei Maria da Penha, que completou 17 anos no início deste mês. A campanha defende a importância da conscientização da sociedade através da informação, além de ações sociais de combate à violência contra a mulher.
Segundo Adriana Ribeiro, a criação dos canais para a realização de denúncias anônimas também foram importantes para a redução dos casos de feminicídio, citados pela Segup. Além disso, a advogada criminalista destaca que a legislação ficou mais rigorosa, a exemplo da implementação do inciso VI no Art. 121 do Código Penal, que “trouxe expressamente o conceito de feminicídio, que é o homicídio contra a mulher por razões da condição do sexo feminino”.
“Além de recentes alterações na Lei Maria da Penha, que permitem a concessão de medidas protetivas independentemente da causa ou da motivação dos atos de violência e da condição do ofensor ou da ofendida, isso permite que essas sejam concedidas sempre que a mulher se encontre em situação de risco, trazendo mais segurança jurídica às decisões e a essas mulheres em condição de vulnerabilidade”, explica Adriana.
Apesar dos avanços, a advogada avalia que ainda há um longo caminho a ser percorrido no combate à violência contra a mulher. “O Brasil continua sendo um dos países com índices mais altos nos casos de violência contra a mulher. Isso é reflexo de um problema estrutural na nossa sociedade que vem sendo combatido com o passar dos anos, mas que precisa continuar sendo observado e tratado com seriedade, para que os números de casos possam ser cada vez menores”, comenta.
Para a criminalista, para que haja uma redução efetiva dos casos de feminicídio, por exemplo, há necessidade de ações do Estado, podendo se dar de forma coletiva ou individual. “Quando tratamos do aspecto individual, tratamos da identificação de fatores de risco (separação recente, comportamentos de controle, posse de armas e outros) e fatores de proteção (existência de rede de apoio, acesso a recursos financeiros, medidas protetivas). A atuação individual nos casos de violência, com identificação de fatores de risco e a proteção da mulher, é capaz de evitar o feminicídio na maioria dos casos. Já de maneira coletiva, temos, por exemplo, a ampliação das casas de acolhimento e criação de canais de atendimento à vítima”, defende Adriana.
Às vítimas de violência, a advogada orienta sobre a importância da formalização da denúncia. “Procure a delegacia mais próxima. Faça um Boletim de Ocorrência dos fatos e solicite pelas medidas protetivas que podem ser deferidas tanto contra o agressor, a exemplo do afastamento deste do lar, impedimento de qualquer tipo de contato e aproximação com a vítima, ou em favor da vítima, como a recondução desta ao lar após o afastamento do agressor. É necessário saber que você vai estar amparada pelo Estado, e que a lei assegura seus direitos para que você não se permita permanecer em uma situação de constante agressão”, esclarece Adriana.
Delegada reforça canais para denúncia
Andreyza Teixeira, titular da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam) de Ananindeua, na Região Metropolitana de Belém, reforça que as denúncias podem ser feitas através do Disque Denúncia, pelo número 181, além do Disque 100, 180 e 190. “Também pode procurar uma delegacia e solicitar medidas protetivas. É importante destacar que o número 190, do Centro Integrado de Operações (Ciop), atende casos que estejam ocorrendo no momento da ligação. Na Delegacia da Mulher, a vítima terá acolhimento e atendimento especializado, podendo ser encaminhada para outros órgãos da rede, como abrigo público, Conselho Tutelar, Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS)”, explica a delegada.
Palavra da vítima é amparada por lei, diz titular da Deam
“Por lei, a mulher não precisa ter provas para solicitar medidas protetivas. A palavra da vítima é amparada pela Lei Maria da Penha, que inclui cinco tipos de violência: física, psicológica, moral, patrimonial e sexual. Quando a denúncia gerar um inquérito policial, será necessário ter provas. A vítima pode apresentar prints de conversas ou gravação de ligações, por exemplo. É importante que a mulher anote datas e episódios das agressões e salve em um local seguro. Um boletim de ocorrência pode ser feito de forma virtual e usado para provar a frequência da violência. É importante registrar os machucados em fotos e salvar em lugar seguro. Quando o crime ocorrer em ambiente sem a presença de outras pessoas, a vítima pode acionar as testemunhas de ‘revelação’, que são pessoas para quem a mulher expôs a situação. Amigos do casal também podem ser acionados para declarar que o denunciado é uma pessoa agressiva”, orienta Andreyza.
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