Ato na Santa Casa chama atenção à rede de proteção contra estupros de crianças

Mulheres lembram Dia Mundial da Infância e caso da menina violentada dos seis aos dez anos

Redação integrada de O Liberal
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Um ato realizado na manhã desta segunda (24) em frente à Santa Casa de Misericórdia, em Belém, marca o Dia Mundial da Infância, data lembrada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). Um movimento pelos direitos de mulheres se postou com cartazes em frente à maternidade pública. A ação "Criança não é mãe: em defesa das meninas da Amazônia" é motivada pelo recente epispódio da menina capixaba de dez anos que ficou grávida, após ter sido estuprada pelo tio, e que teve a gravidez interrompida nesta segunda-feira (17), em Pernambuco, após autorização judicial. Veja:

A criança era violentada desde os seis anos pelo tio e era ameaçada para não fazer denúncias. O homem foi preso nesta terça-feira (18), em Betim (MG). Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2019, o Brasil contabiliza seis internações diárias por aborto envolvendo meninas de 10 a 14 anos, vítimas de estupros que engravidaram após os atos de violência.

"A Declaração Universal dos Direitos das Crianças e o Estatuto da Criança e do Adolescente defendem uma infância protegida de todo tipo de exploração, negligência e violência. 
Testemunhamos o preocupante desenlace de um caso de violência sexual contra uma criança no Espírito Santo, com exposição midiática de dados sigilosos da vítima e incitação a violências que produzem revitimização da criança e sua família, buscam criminalizar e deslegitimar a prática do abortamento previsto em lei e esvaziam o debate sobre a violência de gênero contra crianças e adolescentes – em específico, contra as meninas e a gravidez na infância e adolescência e o direito à interrupção da gravidez previsto na legislação brasileira (código penal de 1940) em caso de estupro", dizem as manifestantes em comunicado que circula nas redes. 

image Ato pediu reforço à rede de atenção e proteção à infância (Akira Onuma / O Liberal)

Reforço à rede de atenção contra violências


A ação quer chamar  atenção também para a necessidade de aprofundamento da discussão sobre a importância de políticas públicas que fortaleçam a rede de enfrentamento à violência contra as mulheres quanto e o sistema de garantias de direitos de crianças e adolescentes.

"A psicologia está diretamente inserida e implicada nessa atenção. Reitera-se o preconizado no art. 17 do ECA, quanto à inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral de crianças e adolescentes, à preservação da imagem e da identidade, da autonomia, entre outros direitos. Além de feri-los, exposições sensacionalistas e midiáticas como a citada reforçam a instauração de um campo de disputas que retira do espaço de debate o zelo pelas práticas de promoção do direito da criança", dizem as organizadoras do ato.

O Conselho Regional de Psicologia do Pará e Amapá (CRP 10) está dando apoio à manifestação, aliado a ações também realizadas pelo do Conselho Regional de Psicologia do Espírito Santo. O objetivo é reforçar orientações ligadas à atuação profissional da psicologia em situações de violência sexual. 

"A escuta e atuação, fundamentadas na ética profissional, devem construir suas balizas no debate transversal à violência de gênero, ao abortamento, à justiça reprodutiva e à necessidade de defender uma concepção da infância fundamentada na promoção e garantia de direitos", diz o Conselho regional de Psicologia.

'Criança não é mãe'


Eunice Guedes, do Fórum de Mulheres da Amazônia Paraense e da Articulação de Mulheres Brasileiras, disse que, em todo o País, integrantes do movimento feminista estão fazendo um ato de denúncia. E, em Belém, é um ato de explicitação para sociedade paraense de que não se aceita mais a violência contra a mulheres e, principalmente, contra as crianças.
Segundo ela, a maioria das vítimas de estupro são meninas e negras. “Criança não é mãe”, afirmou, acrescentando que o Estado precisa cumprir o que está previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

“Essa criança do Espírito Santo não precisava passar por toda essa violência física e psicológica”, afirmou. Eunice disse que essa não é uma situação só da menina do Espírito Santo. “Esse caso ganhou a mídia graças a uma rede de apoiadoras, aos movimentos de mulheres e movimentos femininas, que se mobilizaram”.

image Cartazes e faixas foram levados à Santa Casa (Akira Onuma / O Liberal)

Eunice Guedes citou ainda a “invisibilidade” da morte de mulheres, de meninas e de crianças por falta de garantia de direitos e por falta de garantir o que está previsto no ECA e no Código Penal de 1940. “Essa é uma situação extremamente difícil, de morte e de adoecimentos de mulheres e meninas neste país e, principalmente, na pandemia, com quase 70% dos serviços que existem, que não são muitos no país, fechados para o atendimento às mulheres e meninas, essa menina teve que fazer uma via crúcis, teve que sofrer violência psicológica, assédio moral, teve seu nome e suas informações publicizadas pelas redes sociais, sofreu violência quando chegou ao Recife”, ressalta Eunice. 

“E, dentro do próprio serviço, ainda teve profissionais de saúde que foram lá para pressioná-la para que ela pudesse rever a sua posição. Essa menina, que já era estuprada, ainda teve que sofrer todos esses problemas. E, para poder sobreviver nesse país de impunidade, teve que entrar no programa de proteção à testemunha. Ela e a família, para poder ter um pouco de dignidade e garantia de prosseguir após esses episódios que não deveriam atingir nenhuma criança. Isso é um crime. Criança é para brincar, para aprender, é para ser protegida, não para ser abusada e criminalizada”, diz a representante do órum de Mulheres da Amazônia Paraense. 

O ato em frente à Santa Casa não contou com  um carro de som para se respeitar o espaço, que é um hospital, disse a organização. A Santa Casa é o único hospital público da região Norte referência para o serviço de aborto legal.

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