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Aliados a remadores, catadores de recicláveis ajudam o ambiente e miram o empreendedorismo

Materiais recicláveis geram renda para famílias de duas cooperativas que funcionam em um galpão de triagem no bairro da Sacramenta

Dilson Pimentel e Amanda Martins
fonte

A falta de cuidado de parte da população com o despejo inadequado de lixo agrava o problema da poluição nas águas da Baía do Guajará. Há muito tempo tem sido comum encontrar sacolas plásticas, garrafas pets e papelão boiando nos rios que cortam Belém e banham a capital. São detritos que caíram de embarcações ou foram descartadas pelos próprios moradores das redondezas. Esse desrespeito às águas das praias e furos da capital paraense é uma realidade que já mobiliza iniciativas - ações que podem não apenas ajudar a reduzir o problema, com conscientização desse desafio ambiental, mas também dinamizar cadeias produtivas que geram valor a partir do que é descartado pela cidade.

Um dos objetivos do Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado na última segunda-feira (5), é sensibilizar a opinião pública quanto à valorização do meio ambiente. E se, por um lado, há quem não se importe, um grupo de canoeiras de Belém mostra que é possível fortalecer frentes de enfrentamento a esse desafio com a “canoagem ecológica”, unindo o esporte à responsabilidade socioambiental.

A turma, que tem uma base próximo ao Complexo Ver-o-Rio, no bairro do Umarizal, costuma realizar atividades durante finais de semana, saindo sempre da famosa ‘Prainha’. No último sábado (3), foi feito mais um desses treinos, que costumam incluir boas ações para o meio ambiente.

“O meu dia começa muito pior se eu não for remar, enfrento com mau humor e fico mais estressado”, disse sobre o corpo sentir falta das atividades que são geralmente feitas por ele às quartas e sextas-feiras.

image Grupo de canoagem: programações incluem retirada resíduos das águas (Tarso Sarraf)

Além de exercitar a consciência corporal, Antônio disse ter ganhado ao longo dos anos a social também. Isso porque, os participantes são habituados a conciliar a prática esportiva com a coleta de lixos e resíduos encontrados na Baía do Guajará e no Rio Guamá, onde geralmente navegam.

“A gente já passou por algumas situações que não gostaríamos de ter visto no rio. Uma vez fomos para a Base Área e, ali, tem uma empresa portuária com uma renda de contenção. Ela se rompeu e nós encontramos caixa, plástico, papelão. Toda a rede de esgoto estava saindo, fora o forte odor”, relembrou pesadamente o advogado.

Antônio mencionou ser comum encontrar óleo das embarcações na beirada do rio. As roupas, sapatos, isopor e resto de frutas, por conta da Feira do Ver-o-Peso ser próximo, são encontrados e coletados pela equipe.

“Tem muita latinha de cerveja no rio e não é o lugar onde ela deveria estar. Não se parece que aquele lixo foi deixado ali por acaso, parece que alguém simplesmente jogou e foi sendo levado. Não afeta só essa área, porque o rio vai caminhar e pode levar até Mosqueiro”, complementou o advogado sobre a falta de conscientização das pessoas.

image Remadores unem atividades a compromisso ambiental (Tarso Sarraf)

População pode estar ingerindo peixe com sabor de plástico

A contaminação da flora não é apenas a única consequência que o descarte irregular do lixo pode causar. O advogado também chama atenção para o quanto a fauna pode ser prejudicada.

“O pessoal fala muito mal da sacola plástica por conta das tartarugas, que confundem com água-viva, que faz parte da dieta delas. A primeira atitude dela é comer a sacola, como ela não vai conseguir engolir, morre sufocada”, explicou Antônio.

Trazendo para a realidade paraense, o advogado cita o quanto não é incomum abrir um peixe e encontrar “alguma coisa dentro”, mas que isso é pouco visto porque as pessoas consomem ou o pescado nos restaurante ou compram “bonitinho” e limpo.

Efeito dominó do bem

A publicitária Ingrid Bittencourt, 30, pratica a canoagem há dois anos. Para ela, foi muito natural aliar o esporte ao cuidado com o meio ambiente, principalmente porque, quando se começa a remar se ganha um “olhar sustentável”, provocando a sensação de querer cuidar da natureza e adotar atitudes sustentáveis.

image Para publicitária Ingrid Bittencourt, prazer de remar combina com olhar sustentável (Tarso Sarraf)

“Passamos a querer um ambiente limpo não só para a gente quanto para as futuras gerações. A gente acaba tendo uma consciência a mais tanto de recolher o lixo que a gente acha na água quanto de ter mais controle do nosso consumo”, disse Ingrid, acrescentando que todos buscam se ajudar de alguma forma.

Foi participando das aulas que a funcionária pública Renata Valena dos Santos de Sousa, 36, passou também a aprender a ter atitudes consideradas mais ecológicas, como buscar reciclar o lixo. “Uma das instrutoras batia muito na tecla: ‘vamos reciclar nosso lixo que pode ser dinheiro para outras pessoas’. Lá em casa, eu brigo porque naquela correria e comodidade a gente acaba não fazendo o certo”, disse Renata.

image Renata: sabendo que atitude é 'pequena' frente ao problema, feliz por fazer a diferença (Tarso Sarraf)

A funcionária pública é moradora da Avenida Augusto Montenegro, mas se desloca aos sábados para participar da atividade executada, que ocorre em outro bairro. Mesmo sabendo que a atitude dela é "pequena" perto do lixo crônico, Renata se sente feliz por fazer a diferença.

Lixo recolhido é levado a uma cooperativa para reciclagem

Não existem números exatos de recolhimento do lixo que são retirados pelo grupo de caieiras Caruanas, segundo a instrutora Luciana Quintana, 41. Ela é uma das sócias do projeto e diz que se for juntar tudo o que recolhido a cada remada dá “muita coisa”.

image A instrutora Luciana Quintana diz que 'não existem números exatos de recolhimento do lixo que são retirados pelo grupo de caieiras Caruanas' (Tarso Sarraf)

Apesar de já terem encontrado objetos grandes, como por exemplo, sofás e geladeiras, próximo a Ilha das Onças, em Barcarena, onde o grupo também realiza remos, os materiais que são recolhidos pertencem aos "recicláveis”. E é justamente esse o destino deles após o fim das atividades.

“Doamos para a Cooperativa Belém. Dependendo da quantidade de lixo que nós doamos, podemos enviar para lá ou pedimos para recolher”, explicou Luciana. O espaço costuma dar o destino adequado levando o produto a um novo ciclo de reaproveitamento.

image Mutirões de remadores recolhem lixo da baía do Guajará (Tarso Sarraf)

Cooperativas geram renda com recicláveis

Em um galpão de triagem, que funciona às margens do canal São Joaquim, no bairro da Sacramenta, em Belém, funcionam duas cooperativas de catadores de material reciclável. Uma é de Águas Lindas, em Ananindeua. A outra, da capital. Além de ajudar a cuidar do meio ambiente, esse trabalho gera renda para esses trabalhadores e suas famílias. Muitos desses homens e mulheres trabalhavam, antes, no lixão do Aurá, na Região Metropolitana, que foi desativado.

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image Cooperativas de catadores regam renda a partir de materiais descartáveis (Tarso Sarraf)

Como funciona a coleta?

Sarah Reis é presidente da Cooperativa dos Trabalhadores de Materiais Recicláveis de Águas Lindas (Coparal), que surgiu da Associação dos Recicladores de Águas Lindas (Aral). A primeira etapa do trabalho é nas ruas de Belém, com a coleta porta a porta nas residências. O material é arrecadado, ainda, nos chamados “grandes geradores” – condomínios, empresas e hospitais.

A coleta nas casas é de 8 às 14 horas. E ocorre na Pedreira, Marco, Marambaia, Médici e Sacramenta, de segunda a sexta. No galpão, o material é pesado e passa por uma triagem diária. É separado por tipo, cor, produto. “Depois ele é prensado e ‘fardado’ e, assim, segue para comercialização”, afirmou Sarah Reis.

Na rua, o trabalho é feito por 30 catadores. Na triagem, são cinco. Em média, a cooperativa recebe de 100 a 120 toneladas por mês de garrafas pet, plástico duro, papéis, papelões, latinhas, caixas de leite, entre outros itens.

image Galpão na Sacramenta abriga atividades de duas cooperativas de catadores (Tarso Sarraf)

O que acontece após a coleta e separação?

O material é vendido para os atravessadores, que dispõem da logística necessária para fazer a mercadoria chegar à destinação correta – as indústrias.

“A gente não consegue mandar direto para as indústrias por causa do frete e do imposto. Aí a gente vende para os atravessadores, que têm esse poder aquisitivo para arcar com esses custos”, explica Sarah Reis.

Renda a partir da ajuda à natureza

Para os catadores, e dependendo da produção de cada um, a renda mensal varia de meio a um salário mínimo. Quem trabalha na triagem ganha um salário mínimo. Em sua maioria, os trabalhadores são mulheres. Algumas com uma certa idade e outras que não têm uma profissão para serem incluídas no mercado de trabalho. E que encontraram, na reciclagem, o meio de sobrevivência delas. “Elas mantêm suas famílias através da reciclagem”, disse Sarah.

Um dos principais desafios enfrentados diariamente é a falta de uma maior adesão da sociedade à coleta seletiva. “É a dificuldade das pessoas em separar os resíduos e nos entregarem. Isso dificulta muito”, afirmou. “A reciclagem se tornou um meio de sobrevivência para muitas pessoas”, disse. A Prefeitura de Belém cede os caminhões para eles transportarem esses resíduos até o galpão. “Todo o operacional mesmo, a parte de educação, tudo mesmo feito pela cooperativa. A gente queria que o poder público pagasse por esses serviços que estamos prestando para o município”, disse Sarah. Aos 43 anos, ela também trabalhou no lixão a partir dos 13 anos e durante duas décadas.

image Maria do Socorro, 51, presidente da ACCSB: falta adesão da cidade à coleta seletiva (Tarso Sarraf)

 

 

Apoio das cooperativas

Recente, a Coparal existe há três anos. Mas surgiu da associação (Aral), que tem 18 anos e, depois, virou cooperativa. Dona Edna Maria, 59 anos, trabalha nessa cooperativa. “Para mim, é muito bom. É daqui que ganho o pão de cada dia”, disse ela, que faz a triagem dos produtos. “Eles (a sociedade) nos ajudam lá fora e a gente ajuda (a sociedade) aqui dentro do galpão. Fico feliz com o meu trabalho”, disse.

Rosely Rodrigues de Araújo, mais conhecida como Rose, 48 anos, também trabalha fazendo a triagem da mercadoria. Mora em Águas Lindas. “Trabalho aqui há cinco anos. Para mim, é tudo. É de onde tiro para pagar as minhas contas, para sustentar meus filhos”, contou. Rose também trabalhou no lixão do Aurá. “Quando eu trabalhava no lixão, meus filhos eram pequenos. Eu trabalhei lá 18 anos”, contou. “Eu não tenho estudo. Aqui foi um meio que achei para trabalhar”, disse Rose.

image Rosely Rodrigues de Araújo, a dona Rose, de 48 anos (Tarso Sarraf)

Outra cooperativa que funciona no mesmo galpão é a Cooperativa de Trabalho de Catadores da Coleta Seletiva de Belém (ACCSB), formada por 33 trabalhadores. Na rua, trabalham 15 catadores. Os demais atuam na triagem. O trabalho na rua também é diário e envolve vários bairros da capital. Também é feito porta a porta e nos grandes “geradores” de resíduos. A presidente da cooperativa é Maria do Socorro dos Santos Ribeiro, de 51 anos.

Em média, os trabalhadores ganham de R$ 1.200 a R$ 1.600 por mês. Em média, a cooperativa recebe de 120 a 130 toneladas de resíduos sólidos por mês. O material também é vendido para os atravessadores, que são a nossa salvação. Vem para cá plástico, papelão, papel, alumínio, cobre, eletrônico, óleo usado de cozinha, ferro, alumínio”, disse Socorro.

Ela afirmou que, se não existisse a cooperativa, os trabalhadores estariam na rua catando materiais recicláveis, atuando por conta própria e sem estarem devidamente organizados. “Nós ainda estaríamos aí catando na rua porque já não tem mais lixão (do Aurá). E seria mais difícil”, disse. Ela própria trabalhou no lixão, dos 12 aos 25 anos. Depois, foi para a cooperativa.

image Roselino Ribeiro, 73 anos, um dos trabalhadores das cooperativas: orgulho da atividade (Tarso Sarraf)

Roselino Ribeiro, 73 anos, tem muito orgulho de ser catador, que, segundo ele, é como uma outra profissão qualquer, como, por exemplo, médico e policial. “Queremos ter reconhecimento no nosso trabalho. Ajudamos a cuidar do meio ambiente e geramos renda para nós e nossas famílias”, disse. “Tenho orgulho da minha profissão”, afirmou ele, que também é da diretoria da ACCSB.

Como entrar em contato com as cooperativas

Quem quiser ajudar a Cooperativa dos Trabalhadores de Materiais Recicláveis de Águas Lindas (Coparal) com a entrega de material, pode ligar para: 98084-5193

Para quem quiser ajudar a ACCSB, os contatos são:

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