Rússia tenta maior influência na Ásia com retirada do Talibã da lista de terroristas

Gustavo Freitas / O Liberal
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A Rússia retirou oficialmente o Talibã da sua lista de organizações terroristas, nessa quinta-feira (17/4), após mais de duas décadas. A decisão foi tomada pelo Supremo Tribunal do país em meio a um movimento de aproximação política e diplomática com o grupo que atualmente exerce o controle do Afeganistão. Embora o governo russo ainda não reconheça formalmente o regime do Talibã, a medida é uma sinalização de mudança de Moscou em relação à Ásia Central.

A relação entre Rússia e Talibã remonta ao período da intervenção soviética no Afeganistão, entre 1979 e 1989. À época, o governo soviético apoiava diretamente o regime comunista afegão, enfrentando grupos de combatentes islâmicos, os mujahedins, que mais tarde dariam origem ao Talibã. Com o fim da ocupação e a ascensão dos talibãs na década de 1990, a Rússia adotou postura de oposição, temendo os efeitos da expansão do fundamentalismo islâmico em países vizinhos de maioria muçulmana.

Em 2003, o Talibã foi oficialmente incluído na lista de organizações terroristas do governo russo, em um contexto de reforço às políticas de segurança após a eclosão de diversos atentados em território russo e de alinhamento pontual com a política antiterrorista dos Estados Unidos. A partir de 2001, com o início da chamada Guerra ao Terror liderada pelos norte-americanos, a Rússia colaborou com Washington, inclusive oferecendo apoio logístico e compartilhamento de informações de inteligência para operações militares no Afeganistão.

Com a retirada das tropas americanas em 2021 e o retorno do Talibã ao poder em Cabul, a Rússia passou a adotar uma abordagem pragmática. Representantes do grupo passaram a frequentar reuniões diplomáticas em solo russo, como fóruns regionais e conferências de segurança. Apesar de manter a classificação oficial até 2025, Moscou já mantinha canais de diálogo abertos com o governo de fato do Afeganistão.

A decisão de excluir o Talibã da lista de organizações proibidas foi viabilizada por mudanças legislativas internas, que permitiram ao Supremo Tribunal reavaliar o status jurídico do grupo. O argumento central foi de que o atual governo afegão tem adotado medidas de cooperação regional no combate a grupos radicais rivais, como o Estado Islâmico Khorasã (ISIS-K), responsável por ataques em diferentes países da região, incluindo a Rússia.

Em 22 de março de 2024, a Rússia enfrentou um dos ataques terroristas mais mortais de sua história recente. O Crocus City Hall, uma casa de espetáculos localizada em Krasnogorsk, nos arredores de Moscou, foi alvo de um atentado que resultou em pelo menos 145 mortos e 551 feridos. O ataque foi reivindicado pelo ISIS-K.

“A Rússia visa construir laços mutuamente benéficos com o Afeganistão em todas as áreas, incluindo o combate às drogas e ao terrorismo”, afirmou o Ministério das Relações Exteriores da Rússia em um comunicado.

Nos últimos anos, o governo russo tem buscado ampliar sua influência na Ásia Central, tradicional zona de interesse estratégico do país. O Talibã, ao controlar o território afegão, tornou-se ator importante no controle das rotas de migração e no enfrentamento ao tráfico de drogas. Moscou enxerga a aproximação como uma forma de fortalecer sua presença em um espaço anteriormente ocupado por forças ocidentais.

A medida também atende a objetivos econômicos e logísticos. Entre os projetos almejados pelos russos, está o plano de usar o Afeganistão como um hub para exportações de gás para a Índia e Paquistão.

“Moscou continuará seu trabalho no desenvolvimento de laços políticos, comerciais e econômicos com Cabul”, disse o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, em outubro do ano passado.

Nenhum país reconheceu completamente a legitimidade do Talibã no poder, mas diversos vizinhos têm adotado postura mais pragmática com o Afeganistão. Assim como os russos, o Cazaquistão e o Quirguistão também retiraram o grupo das suas listas de “organizações terroristas”.

Países como China, Índia, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Catar e Irã estão entre as nações com embaixadas em Cabul, com Pequim se tornando a primeira em 2023 a nomear um embaixador após a volta do Talibã ao poder.

 

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