MENU

BUSCA

Maduro não dá sinais de que vá permitir eleições limpas na Venezuela

Acordo de Barbados, celebrado entre o governo venezuelano e a oposição, previa que em 2024 a eleição presidencial ocorreria sem interferências

Gustavo Freitas

Neste ano, a Venezuela realizará eleições em data ainda a ser marcada pelo governo de Nicolás Maduro. O presidente venezuelano está no poder desde 2013 e não dá sinais de que permitirá eleições limpas no país, mesmo após acordo assinado no ano passado.


O chamado Acordo de Barbados, celebrado entre o governo venezuelano e a oposição, previa que em 2024 a eleição presidencial ocorreria sem interferências, com a participação da oposição e a presença da comunidade internacional para atestar a lisura do processo.

VEJA MAIS

Venezuela dá 72 horas para Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos suspender trabalhos
Decisão é resposta à 'profunda preocupação' manifestada pelo Alto Comissariado em relação à prisão da ativista venezuelana Rocío San Miguel

Organizações denunciam escalada de repressão na Venezuela após prisão de ativista
Rocío San Miguel, acusada de 'terrorismo' pelo governo venezuelano, continua detida

O acordo veio em um momento em que países ocidentais davam sinais de retomada nas negociações com o regime de Maduro. Em novembro do ano passado, os Estados Unidos aliviaram as sanções sobre o petróleo venezuelano em um acordo de seis meses, vigente até abril de 2024.

Desde a invasão russa ao território ucraniano em fevereiro de 2022, os países europeus e os Estados Unidos fecharam as portas para a Rússia, isolando o país com sanções e perdendo um grande parceiro no mercado de petróleo. Para suprir a demanda, a saída foi ensaiar uma reaproximação com a Venezuela.

Em 2023, o governo de Joe Biden enviou vários representantes até Caracas para negociar uma reabertura dos diálogos entre os dois países, e o regime de Nicolás Maduro acenou positivamente com a soltura de diversos presos políticos americanos. O aceno foi bem-visto e respondido com a soltura de Venezuelanos ligados ao governo e um acordo que aliviou sanções e permitiu a Venezuela voltar a negociar petróleo com o mundo.

A aproximação se aprofundou com a declaração pública de Maduro, elogiando o governo americano em novembro do ano passado: “Vamos começar um novo tempo, uma nova era de relações de respeito e colaboração no mais alto nível entre os Estados Unidos e a Venezuela. Estamos preparados, estamos prontos, queremos isso”, disse o mandatário durante uma reunião do Conselho Nacional de Economia.

Perseguição a opositores

O acordo firmado com a oposição, entretanto, não demorou a ruir. Em janeiro deste ano, a corte suprema da Venezuela, guiada por Nicolás Maduro, decidiu pela inelegibilidade de Maria Corina Machado, a principal líder da oposição venezuelana.

Corina Machado venceu as prévias eleitorais da oposição com larga vantagem, demonstrando unidade entre os partidos contrários ao regime de Maduro e desponta como principal rival do atual governo nas eleições. A decisão da corte suprema a afasta de qualquer cargo público pelos próximos 15 anos.

O veto à candidatura de Maria Corina Machado irritou os Estados Unidos, que alega descumprimento do Acordo de Barbados e ameaça endurecer outra vez as sanções, caso a decisão não seja revertida. Maduro, até o momento, não deu sinais de que irá retroceder.

Além da perseguição à oposição, o governo lançou o programa Fúria Bolivariana, que investiga e prende adversários e civis insatisfeitos com o regime, sob alegação de estarem planejando um atentado contra o presidente venezuelano e seu governo.

O caso mais recente foi o de Rocío San Miguel, ativista militar que denuncia a violação de Direitos Humanos e foi presa na última semana ao tentar deixar o país. Rocío ficou mais de 100 horas incomunicável, até reaparecer detida na prisão de El Helicoide. Além dela, diversos familiares também foram presos e depois liberados, sob a condição de não saírem do país.

A prisão de críticos e o isolamento da sociedade tem sido comum no governo de Nicolás Maduro, deixando civis presos por meses e, às vezes, anos. Nos últimos dias, essas prisões se tornaram ainda mais frequentes, graças ao programa de controle social comandado pelas forças venezuelanas.

Uma vez presos, muitos civis relatam que são torturados e forçados a gravar vídeos em que admitem crimes que não cometeram. Segundo O GLOBO, desde 2014 o regime de Nicolás Maduro já prendeu mais de 15 mil pessoas, muitas sob suspeita de desaparecimento forçado.

O alto comissariado de Direitos Humanos da ONU emitiu uma mensagem sobre as frequentes prisões e desaparecimento de civis no país: “Acompanhamos com grande preocupação a prisão da defensora dos direitos humanos Rocío San Miguel na Venezuela. Seu paradeiro permanece desconhecido, o que constituiria um desaparecimento forçado. Apelamos à sua libertação imediata e ao respeito pelo seu direito à defesa.”

Esta declaração foi amplamente rejeitada por Maduro, que suspendeu as atividades da missão das Nações Unidas e deu 72h para que deixassem o país.

Curiosamente, a Venezuela vai na contramão de outros países que são acusados de violarem os direitos humanos em seu território. Países como a Rússia e o Irã, constantemente alvo de acusações, insistem em manter relações e buscam se penetrar nos trabalhos dessas missões como forma de controlar os danos públicos.

O aumento da repressão vem sendo amplamente criticado por vizinhos. Em nota conjunta, os governos da Argentina, Costa Rica, Equador, Paraguai e Uruguai criticaram fervorosamente as prisões ilegais que vêm ocorrendo no país.

Embora não tenha assinado a nota, o presidente de esquerda do Chile, Gabriel Boric, já teceu reiteradas críticas ao governo de Maduro, denunciando frequentes violações de direitos fundamentais. Em maio do ano passado, Boric rebateu uma fala de Lula, que chegou a dizer que o que acontece na Venezuela é questão de narrativa. “Temos discordâncias com o que Lula disse ontem. Não é uma questão de narrativa. É uma coisa real e séria. Exige uma posição firme e clara de que direitos humanos devem ser respeitados sempre”, disse Boric.

Crise econômica e social

Na selva do Darién, localizada entre a Colômbia e o Panamá, fica uma das principais rotas para os imigrantes que buscam chegar aos Estados Unidos. Em janeiro de 2024, mais de 36 mil pessoas cruzaram a perigosa selva, sendo quase 22 mil pessoas vindo da Venezuela.

Graças ao alívio das sanções, a Venezuela não ocupa mais a posição de maior inflação da América Latina, hoje ocupada pela Argentina. Os últimos registros mostram a Venezuela com pouco menos de 190% de inflação, um resultado bem superior a 2023, quando estava em 234%.

Analistas econômicos acreditam que a relativa melhora na economia deve fazer o governo investir mais em custos sociais, visando a melhora da popularidade do governo em ano eleitoral.

Uma pesquisa realizada em 2021 pela Universidade Católica Andrés Bello, mostra que 94,5% da população venezuelana vive na pobreza, com menos de R$ 35 por dia. A melhora repentina na economia deve melhorar os números do país em 2024, mas ainda muito distante de afastar o alto índice de extrema pobreza que assola a Venezuela.

Mundo