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ANÁLISE: entenda o que muda na política do Irã com a morte do presidente Ebrahim Raisi

Mohammad Mokhber, o primeiro vice-presidente, assume um governo transitório de 50 dias. A constituição iraniana prevê uma organização de novas eleições no país nesse prazo

Gustavo Freitas especial para o O Liberal

No último domingo, 19, um acidente de helicóptero próximo ao Azerbaijão vitimou o presidente do Irã, Ebrahim Raisi, e o ministro das Relações Exteriores, Amir Abdollahian, duas figuras de extrema importância na política interna do país. 

No sistema político iraniano, há uma separação de poderes que inclui a presidência, o judiciário, o parlamento, as forças armadas e o Conselho de Guardiões, e todos estão abaixo do líder supremo, que fica na posição até a sua morte.

image Foto de arquivo do presidente do Irã, Ebrahim Raisi (VAHID SALEMI/ASSOCIATED PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO)

Ebrahim Raisi era um protegido do aiatolá Ali Khamenei, e um dos favoritos a assumir a posição de líder supremo do país no futuro. A sua morte abre espaço para que o filho de Ali Khamenei, Mojtaba Khamenei, se torne um dos principais nomes para a sucessão. 

O nome de Mojtaba enfrenta algumas rejeições na política iraniana. O filho do aiatolá nunca teve nenhum cargo político no país, e a falta de popularidade é um problema em um sistema que precisa da massa popular para se sustentar. 

Além disso, o combate à hereditariedade foi um dos principais motivos que culminaram no fim da monarquia em 1979 e o surgimento da teocracia que vigora até hoje. Inserir o filho na sucessão, poderia ser interpretado como uma ruptura aos ideais da revolução.

O governo de Ebrahim Raisi era marcado por polêmicas. Na política externa, Raisi conseguiu ampliar a influência militar do Irã na região, fortalecendo aliados na Síria e no Iraque, os Houthis no Iêmen e o Hezbollah no Líbano. Além da aproximação cada vez maior à Xi Jinping e Vladimir Putin, que foram marcadas pelo envio de drones para a Rússia na guerra da Ucrânia e exercícios militares frequentes.

No governo de Raisi, o Irã chegou a um inédito acordo de reestabelecimento das relações diplomáticas com a Arábia Saudita, um país de grandes diferenças políticas e religiosas, que ainda atua em lado oposto aos iranianos na sangrenta guerra civil do Iêmen.

Internamente, Ebrahim Raisi nunca foi altamente popular. O então presidente não era um exímio orador e não movia multidões a seu favor, além de carregar a alcunha de ser “o açougueiro de Teerã”, graças às suas políticas de repressão a manifestações contrárias ao governo.

Em 2019, quando estava no comando do judiciário iraniano, foi o responsável por autorizar ações violentas da polícia para acabar com protestos contra o aumento de mais de 50% do combustível. Foram mais de 500 civis mortos, além de diversas prisões de jornalistas, advogados e cidadãos com dupla-nacionalidade.

Durante o governo de Raisi, uma jovem de 22 anos, Mahsha Amini, foi assassinada pela chamada “polícia da moralidade”, provocando protestos de mulheres demandando o fim do rígido código de vestimenta do país. As manifestações foram marcadas por inúmeras prisões, queima de hijabs e acusações do governo iraniano de haver interferência externa para desestabilizar o regime.

Ebrahim Raisi se tornou presidente do Irã em um processo eleitoral contestado porque, embora os cidadãos tenham o direito de ir às urnas, é o Conselho dos Guardiões que aprova os candidatos. Em 2021, nenhum candidato reformista e mais moderado foi aprovado, abrindo caminho para a eleição do protegido de Ali Khamenei.

O Conselho dos Guardiões é a organização mais influente do Irã, sendo composta por 12 pessoas: seis clérigos e seis juristas. Os clérigos são escolhidos pelo aiatolá, e os juristas pelo judiciário, cujo chefe também é designado pelo líder supremo.

A morte de Raisi veio em um momento de mudança de paradigmas no Oriente Médio. Embora o Irã sempre tenha consideral Israel como um inimigo e grande ameaça, os dois países sempre evitaram ataques diretos para não escalar um conflito entre as duas maiores forças militares da região. Neste ano, pela primeira vez o Irã realizou um ataque coordenado de drones e mísseis contra o território israelense, em resposta ao ataque à embaixada iraniana na Síria, elevando as tensões entre os dois lados.

image  (Presidência iraniana / AFP)

SEM MUDANÇAS 

Mohammad Mokhber, o primeiro vice-presidente, assume um governo transitório de 50 dias. A constituição iraniana prevê uma organização de novas eleições no país nesse prazo e, embora a morte do presidente seja impactante, não há sinalização de mudança na filosofia do poder.

O sistema político do Irã permite que a alta cúpula do poder consiga direcionar a condução política do país, portanto, abre espaço para que o novo presidente esteja completamente alinhado aos anseios do aiatolá. Neste momento de turbulências geopolíticas no Oriente Médio, não há espaço para candidatos que não sejam linha dura no poder.

A morte do ministro das Relações Exteriores, Amir Abdollahim, é mais impactante para a manutenção do status quo político do país. Abdollahim era figura-chave da política externa do Irã desde a década de 90, sendo bem avaliado por todas as divisões políticas que permeiam a teocracia iraniana, tornando-o um nome de difícil sucessão na posição em que ocupava.

Abdollahim foi um dos grandes defensores do primeiro ataque do Irã ao território israelense na história, alegando que o uso de mais de 300 drones e mísseis foram “no âmbito da legítima defesa e do direito internacional”. O ex-ministro assumiu o cargo em 2021, causando uma ruptura ao tom mediador usado pelo seu antecessor, Javad Zarif, que havia sido responsável por intermediar rodadas diplomáticas junto aos EUA pelo acordo nuclear de 2015.

Especula-se que a Guarda Revolucionária do Irã(IRGC), responsável pela atuação militar fora do território iraniano, tenha grande influência na escolha do próximo ministro. A IRGC atua com poderes de um estado paralelo, orquestrando a atuação de milícias, principalmente no Iraque, Síria e Líbano, exercendo grande influência na política externa do Irã.

Entre mensagens de apoio ao Irã e celebrações de rivais, a manifestação do ex-vice-presidente dos Estados Unidos, Mike Pence, em sua conta pessoal no X chamou a atenção: “O presidente iraniano, Ebrahim Raisi, está morto e o mundo agora é um lugar mais seguro.

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