Especialistas apontam falhas dos bancos no caso Americanas; Basa é um dos maiores credores
Rombo de R$ 43 bilhões da empresa poderia ter sido descoberto mais cedo se não fosse por erros das instituições financeiras e das auditorias
As falhas envolvendo o rombo de R$ 43 bilhões de dívidas da Americanas poderiam ter sido descobertas mais cedo se não fossem erros dos bancos e das auditorias. A afirmação foi feita por um jurista à Agência Brasil. Além disso, um outro especialista destacou que o tipo de empréstimo firmado entre as instituições financeiras e a varejista gerou uma briga que pode atrapalhar a recuperação judicial da companhia, junto ao risco de os credores perderem os investimentos caso a rede de lojas vá à falência. O Banco da Amazônia (Basa), do Pará, é uma das organizações que mais emprestaram à empresa, com um total de cerca de R$ 103 milhões de dívidas a receber.
Ao Grupo Liberal, o economista e consultor de empresas Nélio Bordalo disse que o problema que pode ser evidenciado a respeito da Americanas é o interesse em “maquiar” os balanços feitos. “E conseguir novas operações de risco de sacado. Por outro lado, os bancos passaram por cima de regras de compliance, de análise de risco, de governança e as empresas de auditoria passaram por cima de regras de auditoria. O interessante é que os bancos, que hoje são credores, também foram causadores do problema, ao permitirem os descontos de títulos sem a análise mais profunda dos balanços apresentados pelas Americanas”, afirmou.
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Provável fraude contábil durou anos, diz especialista
Mestre em direito empresarial e cidadania, o advogado Alcides Wilhelm, com atuação em reestruturação de negócios, fusões e aquisições e Direito Tributário, disse à Agência Brasil que o elevado endividamento da empresa indica que a provável fraude contábil durou anos. “Ou houve má-fé, fraude, por trás, ou incompetência geral, por todos os lados. Os bancos passaram por cima de regras de compliance [cláusulas de responsabilidade], de análise de risco, de governança. As empresas de auditoria passaram por cima de regras de auditoria. Os bancos, que hoje estão extremamente indignados, também foram causadores, ao permitirem os descontos de títulos [das Lojas Americanas] sem a análise adequada”, avalia.
Advogado aponta contradição
Em relação à auditoria, o advogado estranha como nunca houve desconfiança do alto volume de empréstimos com bancos numa empresa que tinha lucros elevados. Ele explicou que “quando se audita uma empresa, é necessário verificar se ela continuará existindo. Mesmo que a companhia tenha apresentado números bonitos, caberia à auditoria perguntar por que a Americanas buscava tanto recurso financeiro se apresentava tanto lucro. É uma contradição”.
Além de ser considerado um caso atípico de recuperação judicial, por envolver suspeitas de fraudes em vez de uma crise comum, a situação atual da Americanas, de acordo com Wilhelm, não foi gerada da noite para o dia e ainda não é possível apontar de onde partiram as ordens para as irregularidades. Segundo ele, a triangulação entre a empresa, os bancos e os fornecedores que recebiam com atraso é um elemento central das dificuldades financeiras das Lojas Americanas, tendo início com o estilo de administração da empresa e de outras que estiveram sob o controle do trio de bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira.
Tipo de contrato de empréstimo é origem de conflito entre bancos e varejista
Também ouvido pela Agência Brasil, o advogado e jurista Renato Scardoa afirmou que as cláusulas do contrato dos credores, que concentram de 65% a 70% dos créditos, com a Americanas estabeleciam o vencimento antecipado em caso de mudanças bruscas na situação financeira da varejista. “Quando as Lojas Americanas divulgaram o fato contábil, os contratos venceram, e os bancos foram todos em cima do que havia ainda de saldo nas contas-corrente da empresa. O grupo tinha números consistentes, mas, em razão das fraudes no balanço, toda a dívida que estava equacionada venceu antecipadamente”, explica.
Principais prejudicados
Nesse caso, os principais prejudicados são os fornecedores e os mais de 100 mil funcionários, diretos ou indiretos, principalmente os de menor porte, que ficaram sem caixa pelos próximos seis meses. “As Lojas Americanas pagavam num fluxo de 180 dias. Essas empresas trabalhavam para receberem daqui a seis meses. E agora esse estoque de seis meses se sujeita a uma recuperação judicial. Os grandes fornecedores pelo menos têm uma estrutura de capital que suporta esse tipo de situação. Existe todo um ecossistema ameaçado”, diz Scardoa.
Estratégia
Apesar da atuação recente dos bancos, Scardoa discorda de que as instituições financeiras estejam contrárias à recuperação judicial. Ele interpreta os pedidos de liminar para bloquear bens das Americanas como uma forma de pressionar o trio de bilionários que controlava a companhia até 2021, Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, a injetar dinheiro na empresa.
“No aspecto econômico, acho difícil que os bancos não busquem uma solução negocial para a recuperação da empresa. Porque, em caso de falência, esses bancos não vão levar nada. Um plano [de recuperação judicial] agressivo é melhor do que se a empresa quebrar. A recusa de um plano não parece ser a melhor alternativa [para os bancos]”, argumenta.
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