Comunidades tradicionais são importantes para produção de alimentos e preservação da natureza
Boa parte do que chega à mesa do brasileiro vem desses produtores
No Dia da Amazônia, data criada para celebrar a existência do maior patrimônio natural do planeta, com quase 7 milhões de quilômetros quadrados de extensão, dos quais cerca de 80% são florestas. A data, comemorada neste domingo, 5, demarca também a presença dos povos e comunidades tradicionais da região amazônica, que são formados por comunidades extrativistas, indígenas e quilombolas. Do ponto de vista econômico e cultural, essas comunidades representam modos específicos de compreender e conviver com os recursos naturais.
O pesquisador Daniel Sombra, coordenador do Laboratório de Análise Ambiental e Representação Cartográfica (LARC), do Núcleo de Meio Ambiente (NUMA) e do Grupo de Pesquisa Sociedade e Ambiente das Amazônias (GPSA-Amazônias), da Universidade Federal do Pará (UFPA), afirma que quando se fala em economia, costuma-se pensar de imediato na economia de grande escala, sobretudo no campo da agricultura e do extrativismo. “Há quem pense que é o grande agronegócio quem alimenta a população brasileira. Trata-se de uma impressão equivocada. Quando se consideram alimentos consumidos no país, 70% vêm da agricultura familiar, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). São pequenos agricultores que plantam para abastecer a família e vendem o que sobra da colheita – como mandioca, feijão, arroz, milho, leite, batata”, explica. Para o estudioso, portanto, parte das comunidades tradicionais possui grande relevância para o desenvolvimento e subsistência do Brasil.
De acordo com Daniel Sombra, marcos legais do país, como as Unidades de Conservação de Uso Sustentável (em particular, as Reservas Extrativistas), assim como os Territórios Quilombolas, os Projetos de Assentamento Agroextrativistas (PAE's) e as Terras Indígenas são fundamentais para dar segurança jurídica aos povos que não tinham suas territorialidades asseguradas antes da Constituição de 1988, “e que ajudam na soberania alimentar da população brasileira”. “Essas comunidades são importantes na garantia da produção de alimentos para os mercados locais, base de consumo da população de baixa renda, além de reproduzirem um modo de vida que não exerce grande pressão sobre os recursos naturais”, explica.
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Para a vida da população da Amazônia, segundo o pesquisador, as comunidades tradicionais são fundamentais na disponibilização de alimentos como pescados, frutos tradicionais como o açaí e para produção de mandioca, além de serem importantes também para a efetividades de políticas contra a degradação ambiental. “A manutenção dos ecossistemas e a preservação da biodiversidade é algo que coaduna com a reprodução do modo de vida e com as territorialidades destas comunidades, e, por isso, lhes é tão caro o combate ao desmatamento. Hoje, sabemos que as políticas de proteção dos ambientes, combate ao desmatamento e de preservação sustentável da biodiversidade só são efetivas, quando contam com a efetiva participação das comunidades tradicionais, e quando levam em conta suas necessidades e seus anseios”, destaca.
Quilombola
A comunidade quilombola Deus Ajude, no município de Salvaterra, foi a terceira a ser reconhecida como tal entre as 16 comunidades quilombolas que existem na região. Com cerca de 300 pessoas, distribuídas em 53 famílias, a comunidade tem como principal atividade econômica a agricultura familiar, com a produção de farinha e cultivo de mandioca, abacaxi, açaí, bacaba e tucumã, este voltado para a produção de cosméticos.
A presidente da Associação dos Moradores de Deus Ajude, Alacilda Souza, afirma que o local passa por transformações trazidas pela presença do conhecimento acadêmico, que tem como exemplo o projeto de Cartografia Participativa, coordenado pelo pesquisador Daniel Sombra. “Nós ficamos muito feliz de participar, pois trouxe outro olhar da nossa comunidade, recebemos várias oportunidades com a presença desse conhecimento aqui. E, por acaso, seria outra comunidade que seria pesquisa, mas houve um imprevisto e ficaram por aqui”, relata.
Alacilda, mais conhecida como Cida, além de líder comunitária, é estudante do curso de Tecnologia em Geoprocessamento, no polo de Ananindeua da UFPA. “Assim como temos mais outros estudantes universitários na comunidade hoje; de Enfermagem, Assistência Social e Biologia, e um formado recentemente em Etnodesenvolvimento”, afirma.
Apesar das pressões de proprietários de terra localizados no entorno da comunidade, Alacilda afirma que os moradores possuem consciência de suas origens históricas e a importância da permanência no território. “Nós estudamos para trazer o conhecimento para cá. Já estamos na quarta geração, meu pai lutou muito por nosso reconhecimento e por isso continuamos aqui, lutando”, declara.
As pesquisas de Cartografia Participativa possuem um processo de produção no qual os mapas participativos “registram as territorialidades, os ambientes, os modos de vida e os usos do território, e servem de instrumentos para a luta social e ambiental destas comunidades”, conclui Daniel Sombra.
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